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08/02/2003 - 09h13

Na era das cotas, negro é o 1º em medicina na Uerj

ANTÔNIO GOIS
SABRINA PETRY
da Folha de S.Paulo, no Rio

Um estudante de 25 anos, que se autodeclarou negro e concluiu os ensinos fundamental e médio em escolas públicas da zona oeste do Rio, conseguiu o primeiro lugar em medicina e a terceira posição no ranking geral do vestibular da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), o primeiro com reserva de vagas para estudantes negros e pardos ou que estudaram em colégios públicos.

Daniel Araújo Fernandes, morador de Bangu (zona oeste do Rio), inscreveu-se no vestibular pelo sistema de cotas, mas o considera uma "muleta". No seu caso, as cotas não foram determinantes para que conseguisse entrar na universidade. Sua pontuação foi de 98,25, sobre um total de 100, apenas um ponto abaixo do primeiro lugar geral.

"Eu me inscrevi pelas cotas para ter uma certa tranquilidade. Sabia que passaria por causa do meu preparo e dedicação. Mas não acredito que as cotas sejam capazes de resolver o problema."

Na sua opinião, o sistema é "um paliativo", que pode até ajudar muitas pessoas de imediato, mas não resolverá a questão da inserção do negro na sociedade. "O que precisa acontecer mesmo é a recuperação da escola pública. Sem isso, não haverá sistema de cotas que resolva", completa.

Este foi o quarto vestibular de Fernandes. Na sua avaliação, a conquista só foi possível porque ele fez um curso preparatório durante todo o ano passado. O cursinho, feito com bolsa, é um dos mais conceituados do Rio.

"Se dependesse só do que aprendi na escola pública, não teria a menor chance, assim como não tive nos outros anos. O aluno de colégio público não tem como concorrer com os que estudaram em colégios particulares."

Filho de pais aposentados pelo Estado _a mãe, professora de ensino fundamental, e o pai, inspetor de um colégio público_ e que não têm diploma de curso superior, ele sabe que terá dificuldades para terminar a faculdade.

Como os irmãos _a mais velha, de 30 anos, formada em pedagogia, e o irmão, que cursa matemática na Uerj_, ele teve que trabalhar assim que concluiu o ensino médio, apesar do incentivo dos pais para que fizesse uma faculdade. Fernandes entrou para o Exército e começou a juntar dinheiro para ajudar a família e também para fazer uma poupança que seria usada nos anos em que estivesse tendo aulas na faculdade e não pudesse trabalhar.

Mesmo sendo o curso de medicina integral, ele sabe que precisará trabalhar para custear seus gastos, uma vez que os pais não têm dinheiro para bancá-los. Dará aulas de mergulho nos finais de semana e trabalhará como auxiliar de enfermagem _ocupação adquirida no Exército_ em regime de plantão em alguns hospitais.

Depois de saber do resultado, Fernandes foi à praia da Barra da Tijuca comemorar com uma amiga a classificação.

Contrastes

O primeiro lugar geral no vestibular na Uerj, Renato Turita Paes Leme, 18, tem um perfil bastante diferente. Morador de Botafogo, bairro da zona sul da cidade, ele estudou a vida inteira numa escola particular bastante conceituada, também da zona sul.

Paes Leme nem precisou fazer um cursinho para o vestibular. Nesta sua primeira tentativa, para a faculdade de matemática, conseguiu um total de 99,25 pontos. Paes Leme não seguiu a carreira dos pais, ambos médicos, e nunca precisou trabalhar.
 

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