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05/09/2005 - 10h58

Recém-alfabetizados escrevem sua história

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DANIELA TÓFOLI
da Folha de S.Paulo

A mão já está trêmula e a memória falha de vez em quando. Mas Joaquim se concentra, segura o lápis com força e escreve seu nome completo. Aos 81 anos, é a primeira vez que vê a própria letra.

Joaquim Reginaldo, ex-lavrador, ex-caminhoneiro, ex-pedreiro, 14 filhos, nove netos e quatro bisnetos, mora no distrito de Antônio Pereira, a 30 quilômetros de Ouro Preto (MG). Desde março, começou a freqüentar o curso que a entidade Alfabetização Solidária (Alfasol) abriu na região e só faltou uma vez. É sempre o primeiro a chegar para as aulas da professora Laurimar dos Passos, 24.

Mais do que assinar o nome, o mineiro aprendeu a se expressar por meio da palavra escrita e se tornou o participante mais velho do oitavo concurso de redação da Alfasol, que hoje fará a premiação dos melhores textos no Tom Brasil Nações Unidas, em São Paulo. Em nove anos, 5 milhões de adultos aprenderam a ler e a escrever por meio de projetos da entidade. Neste ano, são 510 mil inscritos em 1.050 municípios e que têm aulas com 16 mil professores. Segundo o Censo 2000, havia 16 milhões de brasileiros analfabetos.

Joaquim não ficou entre os primeiros colocados, mas sabe que escrever uma redação já é uma grande vitória. "Meus filhos todos se formaram, mas eu nunca tive oportunidade de ir para a escola. No começo do ano, estava sem fazer nada e resolvi estudar. Nunca é tarde. A cabeça está fraca, mas consegui aprender."

Em sua redação, Joaquim conta que Antônio Pereira tem muitas pedras preciosas, uma igreja incendiada e algumas prostitutas. O concurso deste ano teve como tema "A comunidade onde moro" e recebeu 614 redações de alfabetizandos e 184 de alfabetizadores de todo o país. Há dois anos, os professores ganharam uma categoria própria. O júri foi composto por educadores e empresários. A comunidade participou votando pela internet no texto preferido.

A grande vencedora do júri oficial foi Izabel Santos da Conceição, 49, moradora de Santo Amaro das Brotas (SE). A cidade, segundo a última frase do seu texto, é pequena no tamanho, mas grande na solidariedade. "Aqui todo mundo se ajuda muito, todos os vizinhos são amigos, como se fossem da mesma família."

Quando era menina, Izabel parou de ir à escola ainda nos primeiros anos porque teve de ajudar a mãe a lavar roupa e sustentar a casa. Cresceu, casou, teve cinco filhos, ficou viúva e continuou sem estudar.

No começo do ano, as professoras da Alfasol foram até sua casa oferecer o curso e ela aceitou. "Eu não sabia nem escrever meu nome. Quando não podia ir até a escola, a professora vinha na minha casa e dava aula particular para eu não perder nenhuma letra. Nem acreditei quando ela me contou que eu era a ganhadora do concurso." Na sexta-feira, Izabel também não acreditava que viajaria de avião para receber o prêmio em São Paulo. Na festa de hoje à noite, terá outra grande surpresa: os três textos vencedores serão lidos pelas atrizes Regina Duarte, Marisa Orth e Nívea Maria.

Ana Marques Jardim, 71, de Itaobim (MG), segunda colocada no concurso, não conseguia parar de chorar ao saber do resultado e da viagem. "Quando era criança, meu pai não me deixava ir para a escola. Agora parece que estou em um sonho." Ana conta que estuda bastante em casa para acompanhar sua turma. "Na minha idade, a gente se esquece rápido das coisas, mas devagar dá para aprender. É só ter vontade."

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