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26/08/2001 - 22h28

Opinião: O Enem e a área da circunferência

RAFAEL GARCIA
da Folha Online

Qual é a fórmula da área da circunferência? Oito anos depois de terminar o ensino médio e trabalhando como jornalista, jamais imaginei que me encontraria em uma ocasião onde isso ia fazer falta.

Mas a profissão às vezes coloca a gente em situações inusitadas. Para falar sobre o Enem, tentei vivenciar a experiência dos estudantes. No fim desta tarde de domingo, lá estava eu, esperando ansioso o gabarito para saber qual era minha nota.

Provavelmente os milhares de vestibulandos que fizeram a prova neste domingo não sentiram o mesmo que eu. Consegui até me divertir fazendo o exame.

Aliás, também achei o Enem uma provinha bem honesta. Exigiu raciocínio lógico, leitura atenta e afinidade com questões sociais atuais. Na verdade, com exceção da malfadada área da circunferência, não precisei usar nada mais sofisticado do que uma regra de três para resolver outras questões.

Do alto dos meus 26 anos (e meio), morrendo de medo de fazer feio no meio da multidão de adolescentes de bermudão, acho que pelo menos consegui não dar vexame.

Mas senti que a prova poderia ter cobrado um pouco mais de conhecimento, sem sofrer perdas no que se refere à tal "avaliação de capacidades". Essa é a reclamação que os alunos de colégios particulares e cursinhos fazem: "Aprendi tantas fórmulas e li tantos livros para não precisar de nada no Enem!"

Confesso que também achei um pouco estranho ter familiaridade com uma prova de ensino médio tanto tempo depois de ter completado aquele que era o antigo colegial.

Por conta dessas e outras é que falta um pouco para o Enem poder substituir os grandes vestibulares. E essa é uma pretensão real do MEC, que pressiona para que o Enem seja a primeira fase da Fuvest e de outros funis de gente.

Não acho exagero dizer, por exemplo, que um aluno tem de saber muito mais do que a fórmula da área da circunferência para se considerar apto a iniciar um curso de engenharia. Isso pode ser avaliado na segunda fase do vestibular, mas certamente é necessária uma pré-seleção, que hoje é feita com mais precisão pela própria primeira fase da Fuvest, onde a nota do Enem vale 20%.

De qualquer forma, independentemente de ser preciso ou não, o Enem tem um potencial interessante: o de colocar mais alunos de escola pública na universidade pública.

Digo que é um potencial porque isso ainda não aconteceu, ou aconteceu de forma muito tímida.

Da forma como está sendo aproveitado hoje, o Enem muda muito pouco a história do vestibular da Fuvest. Um estudo da própria USP mostra que só 1,5% dos candidatos são ajudados pelo Enem, e desses, um pouco mais da metade veio de escola pública.

Se a Fuvest fosse totalmente substituída pelo Enem, o número de alunos da USP que fizeram o ensino médio em escola pública poderia saltar de 22% para 27% (a porcentagem também fica menor se levados em conta só os cursos mais concorridos).

Ainda assim, uma diferença de cinco pontos percentuais não resolveria o problema da exclusão educacional, e só restaria recorrer às polêmicas cotas de vagas ou à solução mais óbvia e justa, apesar de díficil: melhorar o ensino médio público.

Muitos pedagogos podem não concordar, mas os alunos do ensino médio público precisam, sim, acumular mais conhecimento do que estão conseguindo até agora. E isso não é necessariamente referência à fórmula da área da circunferência, mas à leitura de clássicos da literatura brasileira, por exemplo, e o inglês.

Se os alunos de escola pública tiverem isso na bagagem, o Enem poderá fazer muito mais por eles no vestibular.

Saiba mais sobre o Enem
 

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