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03/06/2002 - 12h09

Educadores destacam importância de atividades fora da escola

DÉBORA YURI
da Revista da Folha

Quem tem filho em idade escolar sabe que a última moda nos colégios é substituir o trio "livro, lousa e sala de aula" por combinações mais atraentes.

Parques de diversão, viagens para realizar estudos do meio e espetáculos culturais estão entre as principais ferramentas dessa tendência de tirar os alunos da classe para ensinar lições de física, literatura ou geografia, por exemplo.

"A educação vive hoje uma busca pelo aprendizado que passa pelos sentidos. O melhor é quando o aluno aprende uma lição sentindo, vivendo", observa Cleide Ruy, 52, coordenadora de curso e de projetos do colégio Magno, em que os alunos da 8ª série desenvolvem como trabalho de conclusão de ensino fundamental um estudo "in loco". Neste ano o tema é ecoturismo, e a região escolhida foi a estação da Juréia, na Serra do Mar.

"É uma região linda, mas muito pobre. Os alunos se dividiram em grupos para estudar a vida do povo local, que vive basicamente da plantação de banana e da pesca", explica Cleide. Seis viagens para a Juréia estão programadas para 2002. Os grupos devem coletar dados, interagir com a população caiçara e propor idéias para melhorar sua qualidade de vida.

"Estou gostando de participar porque é um jeito divertido de ajudar as pessoas e ainda aprender com elas", dizia Julia Soares Henriques, 14, cortando batatas para fazer um jantar comunitário com um grupo de caiçaras em Guaraú, no hotel em que os estudantes ficaram hospedados durante a primeira viagem da turma, em maio.

Depois de comer, ela se sentou com os colegas para assistir a uma roda de viola típica da região. "Acho um privilégio conviver com pessoas diferentes e ficar perto da natureza", discursava André Saddi Rosa, 13, atento aos violeiros e aos casais que dançavam a "passadinha" (dança local). Nada mal para adolescentes para quem discussão séria é futebol ou o garoto mais bonito do colégio.

Mas se hoje em dia pega até mal uma escola de porte não oferecer um bom leque de atividades fora da classe, o educador José Carlos Teixeira Moreira, 57, professor da FGV-SP e diretor do Tempo & Espaço, um ateliê de tecnologia para crianças de 4 a 14 anos que estimula a livre descoberta e a criação, alerta para o que chama de escolas "oportunistas".

"São aquelas que não pensam em aumentar o leque de experiências da criança, e sim em retorno financeiro", define ele, lembrando que a educação no país virou um "meganegócio" na última década. "Isso atraiu para o ramo muitos investidores, e não educadores."

Ele explica que esse novo perfil de colégio ganhou espaço há alguns anos, quando as aulas de inglês, balé e judô começaram a competir com os colégios pelo tempo e atenção dos alunos. "Muitas escolas passaram a oferecer essas atividades apenas para tê-los por mais tempo e cobrar mais por isso, dando a desculpa da facilidade logística", afirma.

Como um pai pode identificar um passeio caça-níquel? Moreira acredita que ele precisa "ter a dimensão do educador". "O eixo da boa aprendizagem é o prazer. O ideal é o pai prestar atenção no filho, escutar o que ele diz quando volta da rua, observar se ele incorpora esses ensinamentos em seu dia-a-dia."

Renoir e montanha-russa Em geral, as escolas particulares cobram por cada atividade fora do colégio -são gastos com transporte e, se for necessário, com ingressos e lanche. Em casos de viagem para fora da cidade, também são incluídas na lista de despesas hospedagem e refeições, além de hora extra para os funcionários.

"Os pais e os próprios alunos de hoje valorizam muito o esforço de instituir uma educação experimental, e ninguém pode discutir o valor de levar crianças para ver a exposição de Renoir ou a Bienal.

A escola que tem um bom programa nesse sentido sai ganhando", diz o psicólogo e consultor em educação José Ernesto Bologna, 54. Por outro lado, nem sempre vale a pena seguir à risca essa tendência. O colégio Visconde de Porto Seguro, por exemplo, acabou com as saídas que exigiam pernoite dos estudantes.

"Saía caro para nós e para os pais. Se no começo quase 100% dos alunos participavam das viagens, com o tempo essa adesão caiu para 40%", justifica Sonia Bittencourt, coordenadora do centro pedagógico do colégio.

"O processo educativo tem que ser renovado porque não atrai o aluno. Jovem é inquieto e precisa ser seduzido pelo aprendizado", defende o secretário estadual da Educação, Gabriel Chalita, 33, que assumiu o cargo em abril colocando a "educação com aprendizagem significativa" como uma de suas três prioridades, ao lado da segurança nas escolas e da valorização do professor.

Na última terça-feira, ele participou de um evento de capacitação de 1.100 professores da rede pública no Hopi Hari (Vinhedo, 79 km de São Paulo). O parque de diversões lançou no mês passado um projeto educacional com base no princípio do "edutainment" -educação com entretenimento, em inglês. É o popular "aprender brincando".

Em parceria com a Secretaria Estadual de Educação, a Unesco e a ONG Aprendiz, dirigida por Gilberto Dimenstein, colunista da Folha, o projeto vai doar 220 mil ingressos por ano para a rede pública de ensino, capacitar professores com recursos lúdicos e elaborar atividades de recreação relacionados às matérias escolares.

Elas serão desenvolvidas em oficinas ou nos próprios brinquedos. Também serão feitas parcerias com museus, para o aprendizado de história e geografia. O Memorial do Imigrante já tem parte de seu acervo dentro das instalações do parque.

"Aprender física na montanha-russa é mais significativo e gostoso para o jovem do que quando ele decora fórmulas preso numa sala de aula", completa Chalita, citando atividades já em funcionamento no Hopi Hari. "A idéia é trabalhar com um tema específico a cada três meses", conta Dimenstein. "Em agosto, teremos uma semana de terror, para as crianças aprenderem conceitos de biologia e química."

No Porto Seguro, alunos do 3o ano já visitaram o Hopi Hari para aprender noções de física. A coordenadora do colégio, Sonia Bittencourt, pondera a respeito das excursões. "É preciso elaborar um 'antes e depois' para evitar o simples passatempo que não reverte em benefício para o aluno", acredita. "Não adianta só levar ao zoológico e voltar."

O educador José Carlos Teixeira Moreira critica os métodos adotados no ensino regular, que chama de "boring job" (algo como "obrigação chata"). "Dentro do espaço da escola é impossível traduzir todos os ambientes do mundo, por isso é fundamental levar os garotos para fora", afirma. Para Cleide Ruy, do Magno, o caminho é a aprendizagem significativa. "Aquela que entra e atrai pelo afetivo, pela convivência, fica para o resto da vida."

José Ernesto Bologna também defende um novo modelo de ensino. "É um crime deixar essas crianças amarradas em carteiras. Não é à toa que boa parte dos meninos que vão bem na escola se dão mal na vida. Porque a vida é experiência e instrumento, não apenas conceito", diz.

A rede estadual, que conta com 6 milhões de alunos, também está aderindo a essa tendência. Neste ano, 200 mil estudantes do ensino médio já visitaram a Bienal de Arte, e 260 mil foram ao teatro.

"A diferença é que, para esses jovens, ter oportunidades culturais é vital, enquanto para muitos meninos de classe média alta é banal", diz a coordenadora de ensino médio da Secretaria Estadual de Educação, Gisleine Trigo, 52. "O melhor para o educador é ver como o aluno muda, como ele passa a discutir os assuntos que vivenciou nesses passeios e como isso começa a modificar e fazer parte de seu cotidiano", completa.

 

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