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13/03/2003
-
07h45
ANTONIO ARRUDA
da Folha de S.Paulo
"Aqui não temos problema com drogas. Não precisamos de nenhum projeto de prevenção e tratamento." Essa é a frase ouvida com bastante frequência pelos profissionais envolvidos na implementação de programas de prevenção e combate ao uso de drogas em empresas. Se o assunto é tabu em qualquer lugar, no ambiente de trabalho então ele adquire proporções quase demoníacas. "O consumo de drogas é presente, vem aumentando na sociedade como um todo, e as empresas não estão fora disso", diz o psiquiatra Arthur Guerra, presidente do Conselho do Grupo de Estudos de Álcool e Droga da Faculdade de Medicina da USP. Mas essa realidade é difícil de ser identificada porque, no trabalho, os efeitos das drogas, que envolvem queda na produtividade, absenteísmo e falta de motivação, muitas vezes passam despercebidos. "Aparentemente, aos olhos dos colegas e dos superiores, os usuários estão com a situação sob controle", diz Guerra.
A primeira e única pesquisa sobre drogas feita no Brasil, de 2001, em que o Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), da Unifesp, entrevistou 8.589 pessoas de 107 cidades do país, registrou a dependência de álcool em 11,2% dos entrevistados. Essa também é a droga que mais problemas causa dentro das empresas, seguida pelo tabaco, pela maconha e pela cocaína, diz Guerra.
"O grande problema é a empresa não aceitar que o consumo de drogas existe em qualquer setor social e que o ambiente de trabalho não está imune", reclama a assistente social e especialista no assunto Leda Ribeiro, que coordena o programa cujo know-how está sendo exportado pelo Brasil para Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai.
Trata-se do Programa de Prevenção ao Uso de Drogas no Trabalho e na Família do Sesi-RS, desenvolvido em parceria com o Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime (Unodc). A idéia original veio da Noruega, em 96, e foi adaptada à realidade brasileira. Seu maior mérito, segundo Giovanni Quaglia, do Unodc, é que o funcionário se transforma no principal agente modificador da relação da empresa com as drogas.
Antes mesmo do médico, do assistente social e do psicólogo, é ele quem vai, uma vez orientado por essa equipe multidisciplinar, identificar e "educar" quem está envolvido com drogas.
O programa prevê ainda apoio psicológico dentro ou fora da empresa, o qual pode ser estendido para a família, garantia de que não haverá demissão do funcionário e, além disso, ninguém é forçado a aderir ao programa.
A dependência -independentemente da droga- não elege cargo ou função. "De diretores a auxiliares, todos podem ter problemas", diz o psiquiatra Ronaldo Laranjeiras, coordenador da Unidade de Álcool e Drogas do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes), da Unifesp. Mas quem exerce cargos gerenciais, portanto desempenha papel de líder, tende a se esconder mais, a ficar distante dos programas oferecidos.
"Há o medo de que a equipe comece a desrespeitá-lo", diz Edméia de Oliveira, psicóloga da Infraero, uma das empresas que enfrentou casos de dependência química entre gerentes.
Na Avon, o gerente de produção Nilson Wendland atua como um dos agentes modificadores. Passou por um treinamento para identificar precocemente casos de dependência química. Assim, ele observa, entre outros fatores, o rendimento dos funcionários, o índice de faltas, seu comportamento e suas reações emocionais, por exemplo. "Se notamos algum problema, perguntamos, de forma sutil, como está o dia-a-dia dele no trabalho, se há algo que possamos fazer", diz Wendland.
Isso reflete uma mudança significativa de abordagem. Há dez anos, o assistencialismo e o tom acusatório imperavam. Hoje, falar de drogas em empresas é mais fácil, no caso das que incluem o assunto nos seus programas de qualidade de vida, explica o psiquiatra João Carlos Dias, coordenador do Departamento de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria.
"Dentro desse conceito moderno, o funcionário assume a responsabilidade sobre si. E os temas álcool, tabaco e drogas ilícitas entram no rol dos problemas de saúde, dividindo espaço com programas de combate ao estresse e de prevenção ao câncer de mama, por exemplo", diz o médico.
Para Arthur Guerra, é evidente o progresso das empresas. "Não podemos negar que há a dificuldade em aceitar o problema. Mas hoje temos exemplos que provam que a interferência da empresa é indispensável; e não se trata de benemerência, mas de pensar na relação custo-benefício: sai mais barato orientar e tratar o funcionário do que demiti-lo."
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"Aqui não temos problema com drogas. Não precisamos de nenhum projeto de prevenção e tratamento." Essa é a frase ouvida com bastante frequência pelos profissionais envolvidos na implementação de programas de prevenção e combate ao uso de drogas em empresas. Se o assunto é tabu em qualquer lugar, no ambiente de trabalho então ele adquire proporções quase demoníacas. "O consumo de drogas é presente, vem aumentando na sociedade como um todo, e as empresas não estão fora disso", diz o psiquiatra Arthur Guerra, presidente do Conselho do Grupo de Estudos de Álcool e Droga da Faculdade de Medicina da USP. Mas essa realidade é difícil de ser identificada porque, no trabalho, os efeitos das drogas, que envolvem queda na produtividade, absenteísmo e falta de motivação, muitas vezes passam despercebidos. "Aparentemente, aos olhos dos colegas e dos superiores, os usuários estão com a situação sob controle", diz Guerra.
A primeira e única pesquisa sobre drogas feita no Brasil, de 2001, em que o Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), da Unifesp, entrevistou 8.589 pessoas de 107 cidades do país, registrou a dependência de álcool em 11,2% dos entrevistados. Essa também é a droga que mais problemas causa dentro das empresas, seguida pelo tabaco, pela maconha e pela cocaína, diz Guerra.
"O grande problema é a empresa não aceitar que o consumo de drogas existe em qualquer setor social e que o ambiente de trabalho não está imune", reclama a assistente social e especialista no assunto Leda Ribeiro, que coordena o programa cujo know-how está sendo exportado pelo Brasil para Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai.
Trata-se do Programa de Prevenção ao Uso de Drogas no Trabalho e na Família do Sesi-RS, desenvolvido em parceria com o Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime (Unodc). A idéia original veio da Noruega, em 96, e foi adaptada à realidade brasileira. Seu maior mérito, segundo Giovanni Quaglia, do Unodc, é que o funcionário se transforma no principal agente modificador da relação da empresa com as drogas.
Antes mesmo do médico, do assistente social e do psicólogo, é ele quem vai, uma vez orientado por essa equipe multidisciplinar, identificar e "educar" quem está envolvido com drogas.
O programa prevê ainda apoio psicológico dentro ou fora da empresa, o qual pode ser estendido para a família, garantia de que não haverá demissão do funcionário e, além disso, ninguém é forçado a aderir ao programa.
A dependência -independentemente da droga- não elege cargo ou função. "De diretores a auxiliares, todos podem ter problemas", diz o psiquiatra Ronaldo Laranjeiras, coordenador da Unidade de Álcool e Drogas do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes), da Unifesp. Mas quem exerce cargos gerenciais, portanto desempenha papel de líder, tende a se esconder mais, a ficar distante dos programas oferecidos.
"Há o medo de que a equipe comece a desrespeitá-lo", diz Edméia de Oliveira, psicóloga da Infraero, uma das empresas que enfrentou casos de dependência química entre gerentes.
Na Avon, o gerente de produção Nilson Wendland atua como um dos agentes modificadores. Passou por um treinamento para identificar precocemente casos de dependência química. Assim, ele observa, entre outros fatores, o rendimento dos funcionários, o índice de faltas, seu comportamento e suas reações emocionais, por exemplo. "Se notamos algum problema, perguntamos, de forma sutil, como está o dia-a-dia dele no trabalho, se há algo que possamos fazer", diz Wendland.
Isso reflete uma mudança significativa de abordagem. Há dez anos, o assistencialismo e o tom acusatório imperavam. Hoje, falar de drogas em empresas é mais fácil, no caso das que incluem o assunto nos seus programas de qualidade de vida, explica o psiquiatra João Carlos Dias, coordenador do Departamento de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria.
"Dentro desse conceito moderno, o funcionário assume a responsabilidade sobre si. E os temas álcool, tabaco e drogas ilícitas entram no rol dos problemas de saúde, dividindo espaço com programas de combate ao estresse e de prevenção ao câncer de mama, por exemplo", diz o médico.
Para Arthur Guerra, é evidente o progresso das empresas. "Não podemos negar que há a dificuldade em aceitar o problema. Mas hoje temos exemplos que provam que a interferência da empresa é indispensável; e não se trata de benemerência, mas de pensar na relação custo-benefício: sai mais barato orientar e tratar o funcionário do que demiti-lo."
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