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09/09/2001 - 07h33

"Branco" pode indicar distúrbio de memória

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CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo

Terça-feira, 28 de agosto, Teatro Municipal de São Paulo lotado. O maestro Mário Valério Zaccaro rege a ópera "La Traviata" e dá a deixa para o barítono coreano Jang Ho Joo, 43, iniciar a ária "Di Provenza", curta canção cantada por um solista. Por alguns segundos, Joo se esquece do texto.

"E agora, o que vou fazer?", pensou o barítono, diante de uma platéia de 1.530 pessoas. Ele diz ter se confundido porque a ária repete várias vezes o mesmo texto, trocando a ordem. "O que veio na minha cabeça foi um trecho anterior, e eu não podia repeti-lo."

Joo, que não tem problemas de memória, afirma que é a primeira vez que teve um "branco" em mais de 20 anos de carreira.

Normalmente, esquecimentos momentâneos, como o que teve Joo, passam quase que despercebidos, ou são levados na brincadeira, tanto pelo esquecido quanto por seus interlocutores.

Mas quando esses "brancos" devem ser levados a sério? Quando o esquecimento for frequente, e começar a trazer prejuízos à vida pessoal ou profissional, diz a psiquiatra Daniela Kurcgant, do Hospital das Clínicas de SP.

Segundo ela, vários fatores no nosso dia-a-dia, como falta de sono, estresse e ansiedade, podem provocar distúrbios de memória passageiros. O importante é ficar atento para o problema, e procurar ajuda médica caso ele persista.

Nos Estados Unidos, estatísticas mostram que 20% da população entre 20 e 40 anos tem algum problema com a memória. No Brasil, não há estudos abrangentes sobre esse tema.

Pesquisa desenvolvida por um grupo multidisciplinar e coordenada pela fonoaudióloga clínica Ana Maria Alvarez, da USP, relaciona os distúrbios de memória com os processos de audição e atenção. Ou seja, muitas vezes, as pessoas ouvem, mas não são capazes de entender o que foi dito.

No estudo, que envolveu fonoaudiólogos, neurologistas, neuropsicólogos e psiquiatras, foram analisadas 70 pessoas de diferentes níveis culturais e sociais e com idades entre 19 e 76 anos. Aparentemente, elas não tinham queixas no desempenho social e profissional.

Após seis meses de acompanhamento, 40% demonstraram nível rebaixado de memória verbal, mesmo ouvindo bem e com o nível de atenção parecendo razoável. Propositadamente, os entrevistados não foram separados por grupos de idade. Não deu outra: os mais idosos tiveram o mesmo nível de memória que os jovens.

Segundo Alvarez, isso demonstra que os jovens, habituados à linguagem visual, com informações simultâneas e de consumo rápido, muitas vezes, não processam o que ouvem.
A não-compreensão da linguagem escrita, segundo Alvarez, é uma das principais consequências das dificuldades de compreender o que se ouve.

A pessoa que é motivada a ler troca constantemente símbolos visuais por representações linguísticas e, ouvindo a si próprio, cria imagens mentais, desenvolvendo seu poder de atenção, afirma a fonoaudióloga.
Por outro lado, diz ela, os idosos devem desassociar a perda de memória da idade.

Um cérebro sadio, sob constante desafio e contínua aprendizagem, constrói múltiplas conexões neurais (muitas vias que se interligam), e essas conexões são a melhor defesa contras as doenças degenerativas que aparecem na velhice.

Ajuda médica

A estudante Renata Cintra, 22, descobriu que precisava procurar um médico para resolver seus "brancos" de memória há três anos, no cursinho pré-vestibular. "Eu não conseguia decorar nada, nem as fórmulas mais fáceis."

Ela afirma que, primeiro, procurou um psiquiatra e, em seguida, começou tratamento com uma fonoaudióloga. Um dos exercícios que fazia era ouvir várias informações ao mesmo tempo, sem desviar a atenção.

Além de conseguir passar no vestibular de economia na PUC-SP, Renata diz que se tornou mais organizada. "Parece que meu cérebro foi reprogramado."

A mudança para um emprego mais exigente motivou o gerente de negócios Alexandre Jordão, 27, a buscar ajuda médica para melhorar sua concentração e memória.

"Comecei a desenvolver vários projetos ao mesmo tempo e precisava me organizar." Ele afirma que atingiu seus objetivos.

 

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