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15/11/2001 - 09h07

Talento é diferencial que nasce com a pessoa

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PRISCILA SÉRVULO
free-lance para a Folha

Ter talento é mais do que possuir uma aptidão ou uma habilidade. Talento é um dom que nasce com a pessoa, garante prazer e tranquilidade na realização das tarefas, além de excelência nos resultados. É um diferencial da pessoa. E a melhor notícia é que todo mundo possui o seu. A questão é como identificá-lo -os vestibulandos, em geral angustiados e indecisos, que o digam.

Qualquer pessoa percebe quando lê um texto, ouve uma música ou se depara com qualquer tipo de trabalho de alguém talentoso. Outros poderiam realizar a mesma função com técnica e eficiência, mas o talento torna o resultado único.

"Uma pessoa talentosa é aquela que surpreende, que raciocina pelo inverso e tem fascínio pelo lado escondido do óbvio", afirma o publicitário Washington Olivetto, da agência W/Brasil, para quem o talento é detectado logo à primeira vista.

Gostar de uma atividade pode ser um dos requisitos, mas não é o único. Pode-se gostar muito de cantar e não ter afinação, por exemplo. Ou gostar de dançar, mas não ter ritmo. Para caracterizar um talento, há duas exigências. "Os outros devem percebê-lo, e ele tem de ser difícil de imitar", diz o headhunter Simon Franco, profissional especializado em procurar e identificar talentos.

Por isso essa característica é tão valorizada pelas empresas no processo de seleção de profissionais, por exemplo. Segundo Renato Guimarães Ferreira, professor de recursos humanos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), as contratações ocorrem cada vez mais por talento e atitude do que por conhecimento técnico. "Habilidades podem ser treinadas com a transmissão de conhecimento; talentos não, eles têm a ver com as aptidões naturais do indivíduo", afirma Ferreira.

O talento é inato. Segundo definição do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), "é a superioridade do poder cognoscitivo (que tem a faculdade de conhecer), que não provém do ensino, mas da aptidão natural do sujeito". E essa superioridade manifesta-se já na infância. A história de um psicoterapeuta, que pede para não ter seu nome identificado, ilustra bem essa afirmação. Ele conta que, após cursar cinco anos de engenharia, decidiu dar uma guinada na carreira. Depois de alguns anos bem-sucedidos na profissão, deu-se conta do que a família sempre contava a ele: que o maior prazer que tinha quando criança era ouvir histórias. Ele mostrava um prazer muito superior ao das crianças em geral. "Descobri que era um ouvidor de histórias. Ou seja, a profissão já tinha sua semente na infância", diz ele, garantindo que "aquela que um dia vai se tornar a atividade futura já está presente nas atividades infantis". Nesse caso, os pais dos jovens indecisos em relação à escolha da carreira podem ajudar munindo-os de informações sobre os interesses do filho durante a infância.

Desde a adolescência, o juiz do trabalho Roberto Vieira de Almeida Rezende, 32, gostava muito de ler e de escrever. Afirma também que era um conciliador. Queria estudar letras, mas acabou prestando direito, aos 17 anos. Começou o curso, mas desistiu antes de terminar o primeiro ano.

Prestou então novo vestibular, dessa vez para letras, mas abandonou as aulas meses depois. No ano seguinte, iniciou odontologia. Aos 20 anos, voltou para o curso de direito. "Só então percebi que minhas habilidades e características eram mais adequadas à carreira jurídica", diz Rezende.
Os resultados comprovaram o talento. Aos 26 anos, Rezende foi aprovado no primeiro concurso que fez para magistratura. Juiz há quase seis anos, concluiu mestrado na Universidade de São Paulo, onde agora cursa doutorado.

O uso adequado dos próprios talentos abre portas e rende bons frutos. "A partir do momento em que a pessoa conhece seus talentos, sabe o que pode oferecer e aumenta sua capacidade de influenciar a própria trajetória", diz o professor Ferreira.

A importância de saber tirar proveito do próprio talento é destacada até na Bíblia. Segundo o Evangelho de Mateus 25, 14-30, Cristo distribuiu talentos -como as moedas eram chamadas- entre três pessoas. Duas delas aplicaram as moedas e tiveram o dinheiro multiplicado. A terceira, com medo de perder o único talento que havia ganho, preferiu guardá-lo. Sua atitude foi duramente criticada. Ela deveria ter utilizado seu talento.

Conviver com vários talentos pode ser tão angustiante quanto não conhecê-los. Nesse caso, o importante é saber priorizar, diz o neuropsicólogo Cláudio Guimarães dos Santos, ele próprio um exemplo de quem concilia múltiplos talentos. Desde adolescente, gostava de medicina e artes.

Guimarães cursou medicina na USP, fez mestrado em artes plásticas na Escola de Comunicações e Artes, na mesma universidade, e doutorado em linguística, na Universidade de Toulouse, na França. "Nunca tratei nada como hobby. Acho horrível essa idéia de a pessoa fazer o que não gosta diariamente e o que dá prazer no final de semana", diz.

Atualmente, como coordenador da clínica Unidade de Reabilitação Neuropsicológica, Guimarães afirma que sua formação tão ampla é fundamental para trabalhar com a inteligência humana. "Se vou tratar alguém que sofreu uma lesão cerebral e é músico, o tipo de abordagem será diferente da utilizada com um engenheiro", diz. "A individualização do tratamento para lidar com pessoas com dificuldades de linguagem, de memória, de raciocínio e de percepção é fundamental. Quanto mais abrangente for minha formação, mais vou conseguir entrar no mundo dessa pessoa", afirma.

Moral da história: tão importante quanto conhecer os próprios talentos é empregá-los nos contextos adequados. E mais: dedicar-se aos seus talentos para que sejam desenvolvidos, como faz o neuro-psicólogo. "O importante é perceber que sabe fazer as coisas. E essa confiança só se adquire se você tiver desenvolvido interesse genuíno por aquilo que faz", acredita o neuropsicólogo Cláudio Guimarães.

Talento com sucesso

Já quando o objetivo é alcançar sucesso no que se faz, o caminho é ainda mais complexo. "O imponderável é a única certeza quando se fala em sucesso popular. Ter talento é pouco, é preciso mais. É preciso ter sorte, carisma, mistérios", diz o jornalista e crítico musical Nelson Motta, um descobridor e lançador de talentos da música popular.

Mas, se você acha que seu problema é não ter reconhecido e valorizado seu talento, o headhunter Simon Franco diz que, de duas uma: ou você está insistindo, esforçando-se em algo, mas sem talento para tal, ou então não está sabendo evidenciá-lo. "Além da técnica, é preciso um pouco de pirotécnica. O marketing pessoal é tão importante quanto o de qualquer produto", afirma.

Leia mais:

  • Saiba como funciona o talento

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