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24/02/2001 - 05h00

Livro de Erica Jong traz interrogação ao Brasil

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CASSIANO ELEK MACHADO, da Folha de S.Paulo

A interrogação é grande, bem grande. O que querem as mulheres? A dona da pergunta já foi a proprietária de algumas das melhores respostas.
Quando lançou "Medo de Voar", em 1973, a escritora nova-iorquina Erica Jong fez um pequeno terremoto naquilo que homens e mulheres conheciam sobre homens e mulheres.

Nascia a personagem Isadora Wing, que dava asas à mulher que se bastava, dominava seus medos, que ganhava o direito de procurar o "sexo sem zíper" (o intraduzível "zipless fuck"), aquele em que "zíperes caem feito pétalas de rosas" (e em que nem sempre se sabe o nome do dono do zíper alheio).

Quase 30 revoluções da Terra em torno do Sol mais tarde, Jong já vendeu mais de 30 milhões de exemplares, já publicou uma dezena de outros livros e já perdeu o medo de voar (chegou até a casar com um piloto de avião). A pergunta, porém, continua de pé. E chegou à capa de um livro.

Em "O Que as Mulheres Querem?" (editora Record), que está chegando esta semana às livrarias brasileiras, Jong reúne 24 artigos nos quais debate alguns dos assuntos que cabem dentro da grande interrogação.

Preconceitos, maternidade, feminismo, pornografia, mercado de trabalho, Madonna, Lady Di e Hillary Clinton entram no liquidificador bem-humorado da escritora. Na semana passada, Erica Jong, 59, falou com a Folha sobre algumas de suas interrogações. Leia trechos do interrogatório.

Folha - O que as mulheres querem?
Erica Jong -
Não é difícil responder. É muito simples o que elas querem e estranho que até hoje eu e você tenhamos que ficar nos perguntando isso. Mulheres querem o mesmo que os homens. Uma família, amor, um trabalho significativo. Elas querem vidas completas. O complicado é que boa parte delas não sabe disso.

Folha - Os homens sabem o que as mulheres querem?
Jong -
A maioria não e eles mistificam muito a questão. Se pensassem um pouco, descobririam que o que homens e mulheres querem não é muito diferente.

Folha - Em artigo recente, publicado na revista "Talk", a sra. escreveu que em todo lugar que vai tem ouvido mulheres dizendo que o que gostariam mesmo era de poder ficar mais em casa, ter mais tempo para cuidar das crianças. A sra. acredita que esse seja o sentimento predominante das mulheres?
Jong -
Acho que não se pode escolher entre pão e rosas. Todas as vidas precisam dos dois, do equilíbrio de ambos. Todos conhecem pessoas que só trabalham. Elas não são felizes. Só amor também não resolve. A dificuldade maior das mulheres ainda é balancear a maternidade com um trabalho de qualidade. O problema é o mesmo desde os tempos da Revolução Industrial, quando trabalho e casa foram divididos.

Folha - O problema será infinito?
Jong -
Creio que não. É que a sociedade não facilita as coisas. Seria muito mais fácil se todos pudessem levar seus filhos para o lugar em que fossem trabalhar, se houvesse um espaço de qualidade para deixar as crianças. Algumas companhias já perceberam isso. Outras estão deixando os funcionários trabalharem em casa, ligados pelo computador. E assim toda a idéia de trabalho vai se modificando. Em parte por conta do movimento das mulheres, pelas suas reclamações de que a vida estava impossível.

Pouco a pouco a sociedade vai aprendendo. Nesse meio tempo, porém, a situação da mulher é bem desconfortável. Muitas das que têm maridos com dinheiro suficiente para elas não terem de trabalhar mandam o trabalho para o inferno, pois ficam cansadas de estarem sempre cansadas.

Folha - E como as recentes oscilações econômicas dos Estados Unidos influenciam esse quadro?
Jong -
Quando tivemos o boom, muitos homens ganharam bastante dinheiro e suas mulheres voltaram a cuidar de três ou quatro filhos, como nas gerações de minha mãe. Agora, com a recessão, provavelmente elas vão ter de trabalhar de novo fora de casa.

Folha - O feminismo morreu?
Jong -
Não. O que houve é que muitas questões do feminismo passaram a ser parte da sociedade. O feminismo é hoje uma realidade. As jovens ainda têm reivindicações sobre coisas que eram requisitadas pelo feminismo. Mas elas nem ao menos sabem o que foi o feminismo, não sabem que suas mães e avós lutaram para que essas coisas ficassem reais. E muitas ficaram. E aí está o sucesso do feminismo: virar parte normal da vida social.

Ainda há muito pelo que brigar. São discussões que são parte do cotidiano, que não são vistas como radicais. Isso é o sucesso total do feminismo.

Folha - Quais as principais diferenças entre a situação da mulher em 1971, quando a sra. lançou seu primeiro livro, e 30 anos depois?
Jong -
Creio que as diferenças são gigantescas, tanto para mim como para todas as mulheres.

Hoje muitas coisas que eram consideradas radicais são consideradas partes normais da sociedade. A reivindicação pelo pagamento igual para homens e mulheres. A reivindicação para que os homens se envolvam mais na criação dos filhos. É até um orgulho para homens mais jovens poder cuidar do filho, levá-lo ao médico quando ele estiver doente, passear com ele. Acho que os homens não se assustam mais com mulheres poderosas. Figuras como Madonna mudaram a imagem que se faz delas.

Folha - E quem são as jovens escritoras que mudam hoje a imagem que se faz da mulher, como "Medo de Voar" mudou nos anos 70?
Jong -
Não sei. Quando escrevi o primeiro romance, houve um impacto enorme. Talvez tenha sido por questões erradas. Mas também naquela época, na metade da década de 70, era possível fazer livros que causassem ebulições na sociedade. Hoje, muito poucas obras conseguem o mesmo.

O poder de convencer pelas letras declinou. O hábito de ler está muito decadente porque todos estão sempre desesperadamente ocupados. Eu me pergunto: será que alguém realmente lê, hoje?

A palavra ainda é importante. Mas a palavra falada é muito superior hoje à palavra impressa.

Folha - Qual dos artigos de seu livro causou mais polêmica nos EUA?
Jong -
Creio que o que fiz sobre o pênis do presidente Clinton, em que trato da discussão pública sobre a vida sexual do presidente, e o que escrevi sobre o Viagra, acredito que o primeiro publicado no mundo todo.

Folha - Qual o balanço que a sra. faz do episódio Monica Lewinsky?
Jong -
Dele só podemos concluir que as pessoas adoram fofocas e que o presidente foi muito burro, lidou muito mal com o caso. Acho que o episódio mostra um aspecto autodestrutivo de Clinton. Ele sabia que ela não manteria a boca fechada. Ela é jovem e neurótica. Se o presidente queria ter um caso amoroso, deveria ter escolhido alguém mais madura e esperta.

Folha - Como Hillary?
Jong -
Ela sim é fantástica. Não tivemos uma primeira-dama fazendo política, como ela, desde Elleanor Roosevelt, a primeira a falar sobre direitos das mulheres.
 

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