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09/04/2001 - 10h14

Evento em São Paulo lembrou a arte do polonês Tadeusz Kantor

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WAGNER CINTRA, especial para a Folha

Vanguarda permanente, sem dúvida esse é o termo que melhor define a arte de Tadeusz Kantor, que nasceu em Wielopole, uma pequena vila polonesa, em 6 de abril de 1915.

A trajetória do artista polonês foi lembrada em São Paulo, no Sesc Belenzinho, por meio de peça, exposição, vídeo e mesa-redonda, todos integrados ao projeto "Um Réquiem para Tadeusz Kantor", que terminou ontem.

Em 1934, ele ingressa na Escola de Belas-Artes de Cracóvia, na qual estuda pintura e inicia o aprendizado de cenografia com um dos principais profissionais do teatro polonês do século 20, Karol Frycz, discípulo do inglês Gordon Craig (1871-1966).

Aquilo que podemos chamar de a grande obra de Tadeusz Kantor tem início no Teatro Independente de Cracóvia, em 1939, durante a ocupação nazista. Aos 24 anos, em meio ao inferno humano, teve a coragem de tentar atividade destacada da realidade ambiente, encenando os chamados espetáculos clandestinos, com grupo de amigos, nas casas de particulares.

Após a guerra, trabalha como cenógrafo em teatros da Polônia. Inspirado pela arte de vanguarda dos anos 20, com influência da Bauhaus e do construtivismo, desenvolve cenografia que valoriza fundamentalmente o espaço.

Isso ocorre ao mesmo tempo em que fica fascinado pelo surrealismo, apesar de não se tornar adepto do movimento. Descobre um universo enigmático, em que a imaginação pura reside ao lado dos objetos e da realidade cotidiana. Durante longo tempo, a cenografia foi a principal atividade de Kantor, até a fundação, em 1955, com um grupo de pintores da Cracóvia, do Teatro Cricot 2, referência a um local de encontro, espécie de café literário frequentado por pintores nos anos 30.

A encenação de "Wariat i Zaconnica" (O Louco e a Freira, 1963), de Witkiewicz, marca um rompimento total do texto da peça com a ação cênica.
Normalmente se diz que, na arte, o objeto possui classificação inferior aquele valor atribuído ao homem. No teatro de Kantor, os atores são igualmente tratados como objetos, assim como os demais elementos da cena. O texto dramático, por exemplo, também assume um papel de objeto.

Em 1973, o Cricot 2 encena o espetáculo "Mignon et les Guenos". O espetáculo é feito sobre o esboço da peça de Witkiewicz. Esse trabalho caracteriza-se pela constante presença de Kantor em cena, uma "assinatura" que conservaria até o final da vida.

Ele passeava pelo palco. Seu rosto permanecia impassivo. Agia como se estivesse compondo as situações. Sua presença física tem por objetivo suprimir a ilusão, que poderia fazer com que o espetáculo viesse a degenerar pelos caminhos do teatro "convencional".

É difícil chegar ao ponto fundamental dessa questão. Ao mesmo tempo em que constitui um jogo de intelecto inquietante, é também muito alegre e divertido.

Com "A Classe Morta" (1975), Kantor chega ao apogeu da sua produção, que encanta pela composição plástica, pelo uso singular da palavra e do som. Uma reflexão profunda sobre a vida e a morte. A forma do espetáculo está expressa no "Manifesto do Teatro da Morte", que define o sentido de toda a sua obra, sobretudo a utilização de manequins em cena.

Kantor disse que, na arte, a vida só pode ser expressa ao lado da ausência de vida. Dessa maneira, o manequim deve ser um modelo que encarna e transmite um profundo sentimento da morte e da condição dos mortos. Um modelo para o ator vivo.

Foi um artista independente que conservou plenamente seu direito de viver e conceber o mundo à sua maneira. Não é sem querer que "Wielopole Wielopole" (1980) é uma espécie de peça autobiográfica. Assim como "Que Morram os Artistas!" (1985) traz para a cena recordações do passado de Kantor. "Wielopole Wielopole" condensa toda a sua experiência como homem de teatro. A peça cria como que um perfil anatômico da cultura polonesa e dos mitos que a alimentam.

Tadeusz Kantor ultrapassou as fronteiras da Polônia. Sua obra é sempre autêntica, rigorosa. Foi um dos (senão o mais) revolucionários homens de teatro que o século 20 produziu. Morreu a 8 de dezembro de 1990, deixando um grande vazio e muitos enigmas a serem decifrados. Seu teatro é o puro teatro de emoções: surpreendente e inigualável.
 

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