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22/05/2001 - 04h29

Bienal: "Vinda de espanhóis será um desastre", ironiza escritor

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CYNARA MENEZES
da Folha de S.Paulo, no Rio

O escritor espanhol Manuel Vázquez Montalbán não disfarça a ironia quando é informado de que empresas espanholas estão interessadas em comprar editoras brasileiras. "Que barbaridade. Então vocês já sabem o que vai acontecer: um desastre. Porque quando compraram as telefônicas não foram muito bem, não é?"

O que incomoda Montalbán, 61, o criador do detetive Pepe Carvalho, cujas aventuras foram publicadas pela Companhia das Letras (a última foi "O Quinteto de Buenos Aires") e que veio ao Brasil como convidado para a Bienal do Livro do Rio, é que a venda aos espanhóis resulte em um monopólio do mundo editorial.

"A Bertelsmann (editora alemã) está comprando as editoras espanholas. Talvez os espanhóis comprem num dia e os alemães comprem no outro todas as editoras do mundo. Tudo que seja concentrar poder cultural é negativo".

Montalbán opina que as editoras de seu país melhoraram, sobretudo depois do aparecimento da superagente literária Carmen Balcells, que representa nove entre dez escritores hispano-americanos famosos. "Costumo dizer que ela é como James Bond, tem licença para matar. Os editores a odeiam muito, mas para o escritor tem sido muito positiva. Depois dela, você resgata seus direitos a cada cinco anos".

O escritor, nascido na Catalunha, também se mostra preocupado com o separatismo na Espanha, principalmente com o terrorismo praticado pelos bascos do ETA. Ele se diz consciente de que são as notícias sobre o terrorismo as que mais chegam a outros países sobre o seu atualmente, mas aí começa a revelar a verve sarcástica escondida sob a face séria.

"Seria muito pior se chegassem fotografias de (José María) Aznar", dispara sobre o premiê espanhol, pelo qual não nutre a menor simpatia. "Ele é insuportável. É um clone malfeito, uma má imitação de Chaplin".

O sarcasmo volta a aparecer quando responde a uma pergunta sobre o amor e o ódio que parece nutrir pelos argentinos, enfocados no "Quinteto de Buenos Aires". "Amor, por quê?", pergunta, para em seguida relativizar a suposta "prepotência" dos portenhos. "Talvez detrás disso se esconda algo, e eles apliquem a estratégia de que a melhor defesa é o ataque".

Sobre o Brasil, fala que as notícias que chegavam à Espanha antes, sobre "coronéis e generais", ou sobre o Esquadrão da Morte, foram felizmente substituídas pelas novidades musicais. Ou pelos lançamentos de Paulo Coelho. "É quase uma invasão, um desembarque na Normandia. Mas deixemos isso em um terreno neutro", contemporiza. Admite, porém, a supremacia do sucesso de público diante do de crítica, que "cada vez conta menos".

O fato de a Espanha ter sido o país homenageado na Bienal, e daí sua vinda, tampouco o deixa desconfortável na hora de afirmar que não gosta de feiras de livros. "Uma vez fui à Feira de Frankfurt e me dei conta de que no mundo deve haver 20 milhões de escritores. Você se dá conta que é uma casualidade que alguém o leia. As feiras são deprimentes. Sempre há alguém mais famoso, que vende mais livros do que você".

Nada escapa ao humor do catalão, que, como seu Pepe Carvalho, é um gourmet. Com o "concorrente" de Carvalho Nero Wolfe, a obesa criação, também gourmet, de Rex Stout, é implacável: "Eu não confio nas receitas dele".

Outro mito na mira de Montalbán é seu conterrâneo Salvador Dalí. "Até os anos 40 era um pintor esplêndido. A partir daí era alguém em que não se podia confiar no que estava fazendo nem no que estava dizendo. Não acho que era genial. Mas transformou-se em imitador de si mesmo".

E se nem o "divino" Dalí se safou, por que Deus, Ele mesmo, iria? "Não creio em Deus, sempre me pareceu uma coisa estranhíssima. Primeiro que me parece uma enganação que este senhor em seis dias tenha criado o mundo. E que tenha se concedido, ademais, um dia para descansar, me parece um luxo injustificado".

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