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16/10/2001 - 03h25

"Violência faz parte da rotina de crianças no Oriente", diz diretor

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LÚCIA VALENTIM RODRIGUES
da Folha de S.Paulo

Leia a continuação da entrevista com o diretor B.Z. Goldberg, do documentário "Promessas", sobre a vida de sete crianças palestinas e árabes em Jerusalém.

Folha - Não acredita que as crianças sejam vítimas da situação?
Goldberg -
Não consigo. Elas são produtos da situação, mas também protagonistas nela. Afinal, se todos são vítimas, quem está criando a situação? Descobrimos que há outra realidade muito mais interessante e complexa do que a que é apresentada nos noticiários. Não é preto e branco, não tem uma resposta fácil. Deixamos essa complexidade vir à tona.

Folha - O sr. acha que elas entendem o conflito todo?
Goldberg -
Acho que nem eu mesmo consigo entender a coisa toda [risos". E eu achava que entendia. Quando começamos a filmar, descobrimos o quanto não entendíamos. É esse o problema: ninguém entende tudo, cada um tem um pequeno pedaço do bolo.

Folha - O que quiseram mostrar?
Goldberg -
São duas coisas: essas crianças têm algo a dizer e ninguém está perguntando. Quisemos mostrar o que o futuro nos reserva. Outra coisa foi fazer as pessoas pensarem sobre a situação na região. A idéia não era trazer paz. Como diretores, sabemos fazer filmes. Se fôssemos políticos, talvez soubéssemos fazer paz.

Folha - O sr. acha que o documentário mudou alguma coisa?
Goldberg -
Não vejo o filme como uma ferramenta para a mudança social necessariamente. Sei que mudei a vida dessas crianças, mas não foi algo intencional.

Folha - No filme, um dos garotos diz: "Todo mundo pode contar a história de um amigo que foi morto por extremistas". O sr. também tem uma história assim?
Goldberg -
Conheço muita gente que foi assassinada ou ferida em ataques terroristas. Um amigo meu foi morto quando eu tinha 14 anos. É de alguma maneira parte da realidade de crescer em Israel.

Folha - Como vê o conflito hoje?
Goldberg -
Ainda mais difícil. O filme não seria possível hoje. As pessoas não estão mais abertas a falar. Além disso, o otimismo sobre a possibilidade de paz que existia enquanto fazíamos o filme não está mais lá. Especialmente no lado palestino. Há muito pessimismo e medo de que não possa haver paz num futuro próximo.

Folha - Hoje no Oriente Médio há um consenso de que a realidade atual não pode ser mudada?
Goldberg -
Nada no Oriente Médio vai ser uma unanimidade. Há muitas opiniões, mas há um sentimento de que vai ser difícil e de que vai levar bastante tempo.

Folha - O que o sr. acha da cobertura dos jornais sobre o conflito?
Goldberg -
A mídia deveria perceber a escuridão que permeia o conflito. O que mais gosto no filme é que, embora haja dificuldades, lança uma luz sobre o assunto. É preciso perder o maniqueísmo de bem contra o mal. Após os atentados nos EUA, o mundo está procurando o vilão da história e poucos estão interessados em entender o que está acontecendo.

Folha - Mas o vilão existe?
Goldberg -
Não, aí é que está o problema. Os EUA caíram nessa caça a Bin Laden, mas a situação é mais complexa. Não podemos "destruir o mal" para voltar às nossas confortáveis vidas. Em qualquer lugar do mundo coisas malucas e violentas acontecem o tempo todo. Não preciso dizer isso para você. O Brasil é um exemplo de milhares de pessoas em dificuldades. Nos EUA, as pessoas não sabem nada sobre isso, só levam suas vidinhas atrás de seus muros e grades. Os norte-americanos têm de se unir ao mundo.

Folha - O sr. acha que há um jeito de mudar esse pensamento?
Goldberg -
Não faço a menor idéia. Sou um cineasta, não um filósofo [risos].

Folha - O filme é otimista?
Goldberg -
Com certeza há otimismo no filme, mas é mais realista. Mostra esperança e uma possibilidade, mas também que não será fácil. Mostra o encontro das crianças e, ao mesmo tempo, mostra que isso não é suficiente.
 

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