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10/11/2001
-
05h40
CYNARA MENEZES
da Folha de S.Paulo
Intelectual francês casa-se com brasileira e vem para a São Paulo pós-Semana de Arte Moderna. Viaja por algumas cidades, conhece o candomblé, milita no Partido Comunista. É preso, tem um manuscrito apreendido e é expulso do país.
A curta (entre 1929 e 1931) mas movimentada temporada do poeta francês Benjamin Péret (1899-1959), um dos mentores do surrealismo, no Brasil tinha tudo para se resumir a isso: notas rápidas em obras variadas, que tratam basicamente de sua expulsão.
Isso se não tivesse despertado a curiosidade de alguns pesquisadores, a ponto de virar objeto de tese no departamento de teoria literária da Unicamp. "Poeta, Isto É, Revolucionário; Itinerários de Benjamin Péret no Brasil", de Maria Rita Palmeira, recria a trajetória do surrealista entre nós.
Recém-casado com a cantora brasileira Elsie Houston, cunhada do crítico de arte Mario Pedrosa, Péret desembarca no Brasil em fevereiro de 1929, precedido de uma carta de Heitor Villa-Lobos que recomendava aos jornalistas locais recebê-lo "com as bombas e foguetes da praxe brasileira".
Aqui, faz contato com o grupo modernista, encontrando-se em várias ocasiões com Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Pagu e Anita Malfatti. O movimento antropofágico, defendido por Oswald um ano antes, foi um dos poucos a se aproximar do surrealismo, pouco conhecido entre a intelectualidade brasileira.
"Ao contrário do futurismo e do cubismo, o surrealismo foi a vanguarda que menos se difundiu por aqui", diz a pesquisadora. "Poucas figuras, como Flávio de Carvalho, incorporaram o movimento. Péret não chega a criar um grupo, mas a fazer laços, sobretudo com Pedrosa."
Enquanto na França da época os surrealistas viviam a fase do escândalo, indo às raias da agressão física (conta-se que Salvador Dalí chega a dar um tapa na cara de uma velha mecenas durante um jantar) com o apoio dos intelectuais, aqui as atitudes de Péret causam uma certa repulsa, mesmo entre os vanguardistas.
"Dizer que ele era antipático é um exagero, mas sem dúvida não fazia concessões", diz Palmeira. Em "não fazer concessões" está, por exemplo, a manutenção de seu "hábito" de cuspir ou de dirigir ofensas aos sacerdotes com quem cruzava na rua.
O jornalista Claudio Abramo conta, em artigo publicado na Folha em 1985, que "na primeira vez que veio a Brasil, (Péret) sentava-se no bonde ao lado de um padre; subitamente levantava-se aos gritos, fazendo gestos, apontando para o homem de Deus, como a indicar que o religioso, apavorado, lhe tivesse feito propostas imorais".
Manuel Bandeira foi um dos que se chocaram com o "realismo sacrílego" de Péret, chegando a cortar relações com o casal. Carlos Drummond de Andrade também teria se recusado a entrar para o grupo justamente por
causa da presença do francês.
Ao mesmo tempo que conseguia a façanha de deixar perplexos os próprios modernistas, Péret, envolvido na criação da Liga Comunista, começava a desagradar outra parcela: o governo.
Tinha um filho brasileiro com Elsie, Geyser, e escrevia "O Almirante Negro", baseado na revolta da Chibata (1910), quando foi preso, em 1931, e em seguida deportado. Só voltaria ao país 25 anos depois, em 1955, por alguns meses -mas, aos 56 anos, os escândalos já não o animavam tanto.
Pesquisa desvenda poeta que chocou Brasil
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da Folha de S.Paulo
Intelectual francês casa-se com brasileira e vem para a São Paulo pós-Semana de Arte Moderna. Viaja por algumas cidades, conhece o candomblé, milita no Partido Comunista. É preso, tem um manuscrito apreendido e é expulso do país.
A curta (entre 1929 e 1931) mas movimentada temporada do poeta francês Benjamin Péret (1899-1959), um dos mentores do surrealismo, no Brasil tinha tudo para se resumir a isso: notas rápidas em obras variadas, que tratam basicamente de sua expulsão.
Isso se não tivesse despertado a curiosidade de alguns pesquisadores, a ponto de virar objeto de tese no departamento de teoria literária da Unicamp. "Poeta, Isto É, Revolucionário; Itinerários de Benjamin Péret no Brasil", de Maria Rita Palmeira, recria a trajetória do surrealista entre nós.
Recém-casado com a cantora brasileira Elsie Houston, cunhada do crítico de arte Mario Pedrosa, Péret desembarca no Brasil em fevereiro de 1929, precedido de uma carta de Heitor Villa-Lobos que recomendava aos jornalistas locais recebê-lo "com as bombas e foguetes da praxe brasileira".
Aqui, faz contato com o grupo modernista, encontrando-se em várias ocasiões com Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Pagu e Anita Malfatti. O movimento antropofágico, defendido por Oswald um ano antes, foi um dos poucos a se aproximar do surrealismo, pouco conhecido entre a intelectualidade brasileira.
"Ao contrário do futurismo e do cubismo, o surrealismo foi a vanguarda que menos se difundiu por aqui", diz a pesquisadora. "Poucas figuras, como Flávio de Carvalho, incorporaram o movimento. Péret não chega a criar um grupo, mas a fazer laços, sobretudo com Pedrosa."
Enquanto na França da época os surrealistas viviam a fase do escândalo, indo às raias da agressão física (conta-se que Salvador Dalí chega a dar um tapa na cara de uma velha mecenas durante um jantar) com o apoio dos intelectuais, aqui as atitudes de Péret causam uma certa repulsa, mesmo entre os vanguardistas.
"Dizer que ele era antipático é um exagero, mas sem dúvida não fazia concessões", diz Palmeira. Em "não fazer concessões" está, por exemplo, a manutenção de seu "hábito" de cuspir ou de dirigir ofensas aos sacerdotes com quem cruzava na rua.
O jornalista Claudio Abramo conta, em artigo publicado na Folha em 1985, que "na primeira vez que veio a Brasil, (Péret) sentava-se no bonde ao lado de um padre; subitamente levantava-se aos gritos, fazendo gestos, apontando para o homem de Deus, como a indicar que o religioso, apavorado, lhe tivesse feito propostas imorais".
Manuel Bandeira foi um dos que se chocaram com o "realismo sacrílego" de Péret, chegando a cortar relações com o casal. Carlos Drummond de Andrade também teria se recusado a entrar para o grupo justamente por
causa da presença do francês.
Ao mesmo tempo que conseguia a façanha de deixar perplexos os próprios modernistas, Péret, envolvido na criação da Liga Comunista, começava a desagradar outra parcela: o governo.
Tinha um filho brasileiro com Elsie, Geyser, e escrevia "O Almirante Negro", baseado na revolta da Chibata (1910), quando foi preso, em 1931, e em seguida deportado. Só voltaria ao país 25 anos depois, em 1955, por alguns meses -mas, aos 56 anos, os escândalos já não o animavam tanto.
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