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18/11/2001 - 10h37

"Casa dos Artistas": Cobaias em nome da fama

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MARCELO MIGLIACCIO
da Folha de S.Paulo

Se daqui a três semanas você encontrasse a atriz-modelo Núbia Ólive numa fila de banco faria confidências a ela? Compraria um carro usado do Alexandre Frota? Convidaria Marco Mastronelli para almoçar? Depois de acompanhar o angustiante cotidiano na "Casa dos Artistas", não é difícil responder a essas perguntas.

Personagens de uma novela real, cuja audiência emparelhou com a da trama fictícia de "O Clone", da TV Globo, os integrantes do programa do SBT provavelmente ainda não se deram conta de que, ao saírem da mansão, terão se revelado e exposto de uma forma irreversível perante a opinião pública.

"As expressões da pluralidade humana afloram nesses momentos", analisa a psicóloga Henriete Morato. "O comportamento tem sempre dois registros, o consciente e o inconsciente, e este último se projeta nesse tipo de relação grupal. É a condição humana: os mais educados demoram mais para perder a classe, mas também perdem", afirma a educadora e também psicóloga Rosa Maria Melloni.

Para ela, a capacidade de suportar uma situação de confinamento grupal forçado é variável e a agressão física, previsível. "Se durar muito, eles vão sair no tapa", acredita Rosa Maria, que lembra as experiências com camundongos em laboratórios. Agrupados num espaço restrito, eles se devoram. "Como experimento de psicologia, seria interessante, mas não como uma brincadeira de TV. Acho humilhante para todos que estão participando", diz.

O professor de História da Cultura da USP Marco Antônio Guerra concorda. "Com o passar dos dias, as máscaras vão caindo, eles vão regredindo ao estágio animal, com reações cada vez mais primárias", afirma.

Essa tese pode explicar, por exemplo, a insegurança dos participantes da "Casa", que já não confiam em mais ninguém, nem naqueles com quem, no início, identificaram alguma afinidade. O "pacto" de Núbia com Frota, algo como a aliança Hitler-Stalin, é emblemático: os dois combinaram que se ajudariam, mas, na verdade, um não acredita em nada do que o outro diz. Ambos estão se sabotando pelas costas.

Guerra credita a grande audiência ao fato de o público gostar de entrar na intimidade de gente conhecida. "Essas revistas que exploram as desgraças dos artistas estão no mesmo plano", diz.

Henriete Morato acha que o voyeurismo alivia o telespectador da prisão de seu cotidiano. "A linha entre o público e o privado está muito esgarçada hoje em dia. Os participantes, em geral, são pessoas humildes que se prestam a tudo por mais um minuto de fama, pela chance de sair do anonimato da existência", afirma a psicóloga.

Ela se diz bastante incomodada ao assistir ao "reality show" do SBT. "É como ver uma luta livre ou uma briga de galo, um espetáculo de sofrimento que permite ao espectador não pensar no espetáculo do cotidiano, do qual ele é personagem real."

Outra psicóloga, Ana Cristina Limongi França, diz que, ao olhar pelo buraco da fechadura da "Casa dos Artistas", o público "sente um prazer invertido" ao ver pessoas em situações em que ele, público, não gostaria de estar. "Se nos filmes pornográficos se pode sentir prazer vendo o prazer dos atores em cena, no caso desse programa existe o deleite com o sofrimento alheio."

Marco Antônio Guerra, no entanto, vê uma diferença entre "Casa dos Artistas" e o "No Limite", da Globo. "Acho o programa do SBT, pelo menos, mais honesto do que o "No Limite", que também é mundo cão só que disfarçado pelas belas paisagens e pela suposta competição. "Casa dos Artistas" é horrível e não tenta disfarçar isso."


 

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