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22/12/2001
-
08h41
FRANCESCA ANGIOLILLO
da Folha de S.Paulo
Uma dor que não se conclui e é transmutada em um comportamento que, aos olhos dos outros, parece loucura.
Esse é o pressuposto de "Sob a Areia", filme do francês François Ozon, 34, em cartaz no Rio desde a semana passada e que chegou ontem a São Paulo.
Jean (Bruno Cremer) e Marie (Charlotte Rampling), um casal de meia-idade, vive uma relação em que a paixão deu lugar à cumplicidade: entendem-se mesmo sem falar, como nos conta o princípio quase silencioso do filme.
É verão, e os dois trocam Paris pelo mar. Um dia, Marie dorme na areia e, quando se dá conta, Jean desapareceu. Fugiu? Suicidou-se? A dúvida se instala nela e no espectador, sem se solucionar.
Em "Gotas d'Água sobre Pedras Escaldantes" (99), Ozon partira de uma peça de Rainer Werner Fassbinder (1945-82), cujo tema eram as dificuldades da vida conjugal. Embora mais contido, em "Sob a Areia" Ozon volta a falar das impossibilidades do amor.
"Fassbinder dizia que o amor não existe, só as esperanças de amor", lembra Ozon, em entrevista à Folha. ""Sob a Areia" fala de amor, mas de uma ligação quase obsessiva. Marie não vê que seu marido realmente desapareceu. É um filme sobre a obsessão, não sobre o amor cotidiano."
O diretor admite a referência a "A Aventura" (1959). No filme de Michelangelo Antonioni, parte de sua trilogia do distanciamento (somem-se "A Noite", de 60, e "O Eclipse", de 61), é a mulher que some, em uma viagem marítima.
Ozon cita também um elo com "Um Corpo que Cai", filme de 58 de Alfred Hitchcock (1899-1980) em que o luto tampouco se concretiza, pois não se vê o morto.
De fato, voltando à vida citadina, Marie não se desvencilha de Jean: vive como se ele ainda estivesse lá, mesmo quando ensaia uma ligação com outro homem. Em uma cena, "Septembre", canção de Barbara, dá a dica:
"Beau temps pour un chagrin que ce temps couleur d'ombre./Je reste sur le quai, mon amour. A bientôt/(...)/Car tu me reviendras, mon amour, à demain" (Belo tempo para um pesar que o tempo tinge de sombra/Eu fico no cais, meu amor. Até breve/(...)/ Pois você voltará para mim, meu amor/Até amanhã).
Em seu modo de filmar Charlotte Rampling e sua beleza carregada de sinais do tempo, Ozon diz fazer menção a Ingmar Bergman.
"Adoro os filmes em que ele segue um personagem muito de perto. Acho que Charlotte se parece com esse gênero de atriz sueca. Quando a filmo bem de perto, penso em Bergman."
A carreira da atriz inglesa radicada na França, 56, é marcada por filmes como "Max" (86), de Nagisa Oshima, em que se apaixonava por um chimpanzé. Ozon, que em 98 dirigiu o estranho "Sitcom", também é associado ao choque.
"Sob a Areia", porém, tirou de cima deles o olhar desconfiado do público.
"Ela fez filmes meio escandalosos, eu tenho reputação de provocador. As pessoas se surpreenderam ao nos ver fazer um filme quase normal."
Filme: Sob a Areia (Sous le Sable, 2000)
Direção: François Ozon
Produção: França
Com: Charlotte Rampling, Bruno Cremer
Diretor francês fala sobre o longa "Sob a Areia", em cartaz em SP
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da Folha de S.Paulo
Uma dor que não se conclui e é transmutada em um comportamento que, aos olhos dos outros, parece loucura.
Esse é o pressuposto de "Sob a Areia", filme do francês François Ozon, 34, em cartaz no Rio desde a semana passada e que chegou ontem a São Paulo.
Jean (Bruno Cremer) e Marie (Charlotte Rampling), um casal de meia-idade, vive uma relação em que a paixão deu lugar à cumplicidade: entendem-se mesmo sem falar, como nos conta o princípio quase silencioso do filme.
É verão, e os dois trocam Paris pelo mar. Um dia, Marie dorme na areia e, quando se dá conta, Jean desapareceu. Fugiu? Suicidou-se? A dúvida se instala nela e no espectador, sem se solucionar.
Em "Gotas d'Água sobre Pedras Escaldantes" (99), Ozon partira de uma peça de Rainer Werner Fassbinder (1945-82), cujo tema eram as dificuldades da vida conjugal. Embora mais contido, em "Sob a Areia" Ozon volta a falar das impossibilidades do amor.
"Fassbinder dizia que o amor não existe, só as esperanças de amor", lembra Ozon, em entrevista à Folha. ""Sob a Areia" fala de amor, mas de uma ligação quase obsessiva. Marie não vê que seu marido realmente desapareceu. É um filme sobre a obsessão, não sobre o amor cotidiano."
O diretor admite a referência a "A Aventura" (1959). No filme de Michelangelo Antonioni, parte de sua trilogia do distanciamento (somem-se "A Noite", de 60, e "O Eclipse", de 61), é a mulher que some, em uma viagem marítima.
Ozon cita também um elo com "Um Corpo que Cai", filme de 58 de Alfred Hitchcock (1899-1980) em que o luto tampouco se concretiza, pois não se vê o morto.
De fato, voltando à vida citadina, Marie não se desvencilha de Jean: vive como se ele ainda estivesse lá, mesmo quando ensaia uma ligação com outro homem. Em uma cena, "Septembre", canção de Barbara, dá a dica:
"Beau temps pour un chagrin que ce temps couleur d'ombre./Je reste sur le quai, mon amour. A bientôt/(...)/Car tu me reviendras, mon amour, à demain" (Belo tempo para um pesar que o tempo tinge de sombra/Eu fico no cais, meu amor. Até breve/(...)/ Pois você voltará para mim, meu amor/Até amanhã).
Em seu modo de filmar Charlotte Rampling e sua beleza carregada de sinais do tempo, Ozon diz fazer menção a Ingmar Bergman.
"Adoro os filmes em que ele segue um personagem muito de perto. Acho que Charlotte se parece com esse gênero de atriz sueca. Quando a filmo bem de perto, penso em Bergman."
A carreira da atriz inglesa radicada na França, 56, é marcada por filmes como "Max" (86), de Nagisa Oshima, em que se apaixonava por um chimpanzé. Ozon, que em 98 dirigiu o estranho "Sitcom", também é associado ao choque.
"Sob a Areia", porém, tirou de cima deles o olhar desconfiado do público.
"Ela fez filmes meio escandalosos, eu tenho reputação de provocador. As pessoas se surpreenderam ao nos ver fazer um filme quase normal."
Filme: Sob a Areia (Sous le Sable, 2000)
Direção: François Ozon
Produção: França
Com: Charlotte Rampling, Bruno Cremer
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