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19/02/2002 - 04h12

Peça de Gaulier arma bufonaria contra formas de poder

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VALMIR SANTOS
free-lance para a Folha

A blasfêmia é uma das ferramentas prediletas do diretor e dramaturgo francês Philippe Gaulier, 58.

Radicado em Londres, ele comanda uma escola de teatro que predica, entre outras, a arte do bufão, arquétipo vertiginoso da comédia, aquele que vai à forra no enfrentamento do poder apoiado pela máscara teatral.

Na peça "Ele Não É Meu Filho" ("Celui-ci N'Est Pas Mon Fils", de 83), que participa hoje do ciclo "Leituras de Teatro", na Folha, Gaulier confronta os territórios do divino e do humano ao parodiar um encontro entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

A Santíssima Trindade protagoniza diálogos repletos de ironia e sarcasmo, como num dos rompantes de Deus: "É minha culpa se eu me confundo com as frases? Deus não é um teórico, um linguista, um intelectual. Deus é Deus, meu Deus!".

A tradução do texto que será lido hoje é do pesquisador Fernando Kinas.
"Os três bufões se divertem ao parodiar os bastardos que os baniram -os moralistas persuasores, os complacentes, os religiosos extremistas, os carreiristas, a velha-guarda", escreve o dramaturgo sobre os tipos da peça.

Gaulier recorre ainda aos jogos de palavras e a brincadeiras semânticas ("o primeiro nível da piada", "regras elementares de polidez").

Apropria-se dos meandros da linguística para "parodiar o tempo inteiro a teorização", como explica a diretora Beth Lopes, 46. Ela responde pela leitura dramática desta noite e pela encenação do espetáculo, a partir do dia 1º de março, no Centro Cultural São Paulo. Revelada no início dos anos 90, com a Cia. de Teatro em Quadrinhos (de "O Cobrador"), e atualmente dedicada aos estudos da bufonaria, a diretora Beth Lopes enxerga na obra de Gaulier o exercício de uma "dramaturgia inaugural".

"A linguagem da blasfêmia é usada de forma muito interessante. Quando nos deparamos com os diálogos, pensamos conhecê-los do besteirol, mas não são. As piadas, por vezes ralas, vazias demais, servem para criticar questões absolutamente sérias e contemporâneas, como os poderes constituídos, religiosos, políticos ou militares, por exemplo", afirma a diretora.

Beth Lopes estabelece paralelo de Gaulier com teóricos do início do século 20. Cita o russo Vsevolod Meyerhold e o dramaturgo italiano Luigi Pirandello.

"Na peça, o ser e a aparência de ser se superpõem, como propunham os pensadores", diz.

Em "Ele Não É Meu Filho", os personagens não são explicitados a priori. Revelam-se aos poucos. Gaulier determina que atrizes interpretem os papéis "masculinos" do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o que "adiciona um sacrilégio a mais ao texto".

Na leitura de hoje são elas, respectivamente, Cristina Mutarelli (Mulher 3), Yedda Chaves (Mulher 1) e Soledad Yunge (Mulher 2). "Nesta peça tudo é paródia, exceto... Exceto a humanidade das três mulheres", continua o dramaturgo.

O projeto da montagem inédita é iniciativa de Yunge, que trouxe Gaulier para o Brasil em 97 e 98, quando ele deu workshops em São Paulo, Rio e Porto Alegre.

A leitura dramática de "Ele Não É Meu Filho" tem entrada gratuita. Acontece hoje, às 19h30, no auditório da Folha (al. Barão de Limeira, 425, 9º andar, SP). Reservas devem ser feitas pelo telefone 0/xx/11/3224-3473, entre as 14h e as 17h.
 

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