Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
06/04/2002 - 04h42

Projetos fazem banquete com Oswald de Andrade

Publicidade

CASSIANO ELEK MACHADO
da Folha de S.Paulo

Ainda não será desta vez que a massa fará um banquete antropofágico com os "biscoitos finos" de Oswald de Andrade, como pedia a famosa profecia do mesmo. Mas 2002 entrará para o nosso calendário editorial como o ano em que a "pâtisserie" desse parteiro do modernismo brasileiro ganha pela primeira vez tal embalagem.

No ano em que se completam oito décadas da Semana de 22, a extensa obra de Oswald receberá suas duas edições mais refinadas.

Os dois projetos estão atualmente em uma escrivaninha em Washington D.C. Por trás da mesa, o professor de literatura da USP Jorge Schwartz, atualmente cumprindo temporada de docente visitante na Johns Hopkins University, uma das principais instituições de ensino dos EUA.

De lá, ele vem acertando detalhes finais nos originais de um calhamaço que levará o nome de "Obras Incompletas de Oswald de Andrade" (da Unesco) e, por paradoxal que possa parecer, ajuda a dar contornos às "Obras Completas" oswaldianas para a editora Globo.

Mas aparentes paradoxos à parte, são as "Obras Incompletas" o grande destaque no horizonte. O tomo, que terá cerca de 1.800 páginas, integra uma das principais coleções já elaboradas sobre a literatura latino-americana, a série Archivos.

O volume, que só deverá ser comercializado em meados do segundo semestre, trará a público de uma tacada só toda a parte mais "oswaldiana" de Oswald e as análises mais minuciosas que já se fizeram desse manancial.

O livro reúne seus dois romances centrais, "Memórias Sentimentais de João Miramar" (1924) e "Serafim Ponte Grande" (1933), a poesia completa, aí incluídos 14 inéditos, encontrados nos arquivos do escritor em posse da Unicamp, e dez "textos de tese", como Schwartz batiza escrituras como o "Manifesto Antropofágico" (marco do movimento antropofágico, de 1928) ou "A Crise da Filosofia Messiânica" (projeto de tese apresentado na USP, em 1950).

O conjunto de textos, trabalhado pelas pesquisadoras Maria Augusta Fonseca (prosa) e Gênese Andrade (poesia), vem acompanhado do que se chama de abordagem genética, estudo do processo de criação das obras a partir da análise de seus manuscritos.

"Os textos foram cotejados milimetricamente com os originais que existem ou com as versões mais fidedignas", diz Schwartz.

"Obras Incompletas" trará, assim, não apenas a íntegra de "Serafim Ponte Grande", mas também um retrato das mudanças pelas quais a obra passou ao longo dos três manuscritos que o escritor fez do trabalho. "A exposição desses vários manuscritos ajuda a acabar com o mito de que o Oswald era descuidado."

De fato, Oswáld (Antonio Candido, do grupo de intelectuais que o próprio Oswald batizou de "chato boys", já explicou bem explicadinho que a pronúncia correta é Oswáld, não Ôswald) chegou a fazer até 17 manuscritos de uma obra, como é o caso de "O Santeiro do Mangue" (obra publicada pela primeira vez só em 91).

Dois bem cuidados dossiês complementam o volume. No primeiro, o "Dossiê Memória", estão uma extensa série de depoimentos sobre o "antropófago".

O segundo, o "Caderno de Imagens", reúne pouco conhecidos desenhos do escritor, pinturas como "O Abaporu", que uma de suas mulheres, Tarsila do Amaral, lhe deu quando ele completou 38 anos, e retratos variados.

Nas fotos, está toda a alegria do primeiro e já bonachão Oswald (com seus 1,65 m e os quilinhos extras que faziam com que o outro vértice modernista, o magrela Mário de Andrade, lhe tirasse frequentes sarros) e todo o desapontamento dos seus últimos anos.

O autor da frase "tupi or not tupi that is the question" morreu em 1954, aos 64, "quase no ostracismo, endividado e sem muita credibilidade literária", como já testemunhou o crítico teatral Sábato Magaldi, que acompanhou o enterro como repórter.
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página