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08/04/2002
-
11h55
MARCELO RUBENS PAIVA
da Folha de S.Paulo
Miguel Falabella, 43, é onipresente e incansável. Fora da telinha -despediu-se do programa dominical "Sai de Baixo" e está temporariamente fora do "Vídeo Show"-, ele reaparece nos bastidores, desembarcando em São Paulo com duas "miguelanças", como ele mesmo diz.
É dele a direção e a adaptação do musical "Godspell", de Stephen Schwartz, baseado no Evangelho Segundo São Matheus, que estréia nesta quarta, e é dele a autoria e direção do premiadíssimo "South American Way", uma co-autoria com Maria Carmem Barbosa, sua parceira de muitas peças, que abre o pano no dia 19.
"Godspell" é uma releitura do musical norte-americano hippie lançado há 31 anos na off-Broadway -aquele da música "Day by Day". Releitura, porque o diretor diz que ele terá mais o clima do Cassino da Urca do que o do espetáculo símbolo da contracultura.
Já "South American Way", que rendeu matéria no "New York Times", vem de uma temporada de muito sucesso no Rio. O musical conta a vida de Maria do Carmo Miranda da Cunha, a Carmen Miranda. Duas atrizes, Soraya Ra- venle (Carmen antes da fama) e Stella Miranda (Carmen nos últimos dias), refletem sobre, entre outras coisas, a hostilidade que a Pequena Notável sofreu do Brasil, após "conquistar a América".
O espetáculo surpreende, porque se apropria de uma elaborada dramaturgia e de três anos de pesquisa para impulsionar o "chica-chica-bum" imortal.
Musicais não são novidades na carreira deste carioca que participou do grupo Pessoal do Despertar e fez dupla besteirol com Guilherme Karan ("As Sereias da Zona Sul"). Ele já atuou em "Happy End" e, mais recentemente, em "O Beijo da Mulher-Aranha".
Falabella, que tem um teatro no Rio de Janeiro com o seu nome, não pára. Deu esta entrevista pelo telefone enquanto se preparava para subir num dos palcos da "Paixão de Cristo", megaespetáculo anual de Nova Jerusalém (em Pernambuco).
Folha - Você faz o Pilatos na "Paixão de Cristo"?
Miguel Falabella - Que nada. Faço o Heródes. Fico nas festas, orgias, bebendo. É o baile do furico roxo.
Folha - Do quê?
Falabella - Está vendo, este é o terceiro ano em que venho e já aprendi até as expressões locais. Aqui, danço que me acabo. Eu me adaptei até à culinária. É uma terra diferente, sem água, telefone...
Folha - Você não pára nunca?
Falabella - Sempre trago minhas "miguelanças" para São Paulo.
Folha - Como são os musicais que vão estrear?
Falabella - São dois musicais opostos, encenados em dois teatros com que tenho muita intimidade: o Procópio, por causa do "Sai de Baixo", e o Jardel, em que fiquei em cartaz com "Beijo". Os espetáculos norte-americanos vêm com cartilha própria, exigida por contrato. Mas tive liberdade para mexer no "Godspell".
Folha - Por onde começa a criação de um musical?
Falabella - O grande segredo é escolher bem os fatos da biografia. Depois, é importante realçar as qualidades das músicas. Os solos têm de ser bem distribuídos. Esse é o xis do problema: as músicas também contam a história.
Folha - Mas, no caso da Carmen Miranda, as músicas já existiam.
Falabella - Carmen Miranda é um mito. Mais no mundo do que no Brasil. Tinha muita mágoa com a hostilidade daqui. Tanto que nunca mais morou no Brasil. Como as canções já existiam, tivemos de nos preocupar em como inseri-las, porque o pico dramático é na canção, sem sermos óbvios.
Folha - Como você conta a história de Carmen Miranda?
Falabella - Para mim, era mais interessante se eu fincasse os pés na dramaturgia. Sabíamos que teríamos problemas com a quantidade de figurinos. Pensei: "Só se forem duas Carmens". Temos de ter uma excelente camareira, já que são 200 figurinos, e duas atrizes formando uma interação, conversando entre si. É um fetiche meu o diálogo interior.
Folha - Qual é o ponto de partida?
Falabella - A peça começa quando ela desaba no chão, ainda no limbo, vestida de noiva, uma homenagem a Nelson Rodrigues. Junta-se a um fato real: no zoológico do Rio de Janeiro, Carmen estava com Sinval Silva quando uma cigana apareceu e disse que ela iria morrer com 26 anos. Ela ficou desesperada. A cigana acabou virando uma terceira Carmen no espetáculo. É quem fica com o turbante no final.
Folha - A música é secundária?
Falabella - Não. Precisamos de qualidade vocal, de pessoas que cantam mesmo.
Folha - Em "Godspell" você traduziu as letras?
Falabella - Sim. Fiz versões das músicas. É o mesmo texto, só que mais para a realidade brasileira, mais para a Teologia da Libertação. Será um circo do ano 2000 multiétnico.
Folha - Você vai muito à Broadway?
Falabella - Conheço tudo da Broadway. Meu conhecimento de musicais é americano. Aqui, nossa musicalidade e temática são diferentes. Tem um surdo [tambor" no meu "Godspell".
Folha - O que você herdou dos tempos do besteirol?
Falabella - O humor. Sem ele, você não vive e não trabalha. Até na Nova Jerusalém o brasileiro tem humor, que não sei de onde vem. No besteirol, que é um termo pejorativo, descobrimos uma linguagem. Havíamos herdado um comportamento dos anos de chumbo em que rir era proibido. Fui muito patrulhado. Temos que entreter as pessoas.
Folha - Você acha que a marca de Caco Antibes ainda vai persegui-lo por muito tempo?
Falabella - Não, porque antes dele eu já era muito conhecido.
Miguel Falabella estréia "South American Way" e "Godspell" em SP
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da Folha de S.Paulo
Miguel Falabella, 43, é onipresente e incansável. Fora da telinha -despediu-se do programa dominical "Sai de Baixo" e está temporariamente fora do "Vídeo Show"-, ele reaparece nos bastidores, desembarcando em São Paulo com duas "miguelanças", como ele mesmo diz.
É dele a direção e a adaptação do musical "Godspell", de Stephen Schwartz, baseado no Evangelho Segundo São Matheus, que estréia nesta quarta, e é dele a autoria e direção do premiadíssimo "South American Way", uma co-autoria com Maria Carmem Barbosa, sua parceira de muitas peças, que abre o pano no dia 19.
"Godspell" é uma releitura do musical norte-americano hippie lançado há 31 anos na off-Broadway -aquele da música "Day by Day". Releitura, porque o diretor diz que ele terá mais o clima do Cassino da Urca do que o do espetáculo símbolo da contracultura.
Já "South American Way", que rendeu matéria no "New York Times", vem de uma temporada de muito sucesso no Rio. O musical conta a vida de Maria do Carmo Miranda da Cunha, a Carmen Miranda. Duas atrizes, Soraya Ra- venle (Carmen antes da fama) e Stella Miranda (Carmen nos últimos dias), refletem sobre, entre outras coisas, a hostilidade que a Pequena Notável sofreu do Brasil, após "conquistar a América".
O espetáculo surpreende, porque se apropria de uma elaborada dramaturgia e de três anos de pesquisa para impulsionar o "chica-chica-bum" imortal.
Musicais não são novidades na carreira deste carioca que participou do grupo Pessoal do Despertar e fez dupla besteirol com Guilherme Karan ("As Sereias da Zona Sul"). Ele já atuou em "Happy End" e, mais recentemente, em "O Beijo da Mulher-Aranha".
Falabella, que tem um teatro no Rio de Janeiro com o seu nome, não pára. Deu esta entrevista pelo telefone enquanto se preparava para subir num dos palcos da "Paixão de Cristo", megaespetáculo anual de Nova Jerusalém (em Pernambuco).
Folha - Você faz o Pilatos na "Paixão de Cristo"?
Miguel Falabella - Que nada. Faço o Heródes. Fico nas festas, orgias, bebendo. É o baile do furico roxo.
Folha - Do quê?
Falabella - Está vendo, este é o terceiro ano em que venho e já aprendi até as expressões locais. Aqui, danço que me acabo. Eu me adaptei até à culinária. É uma terra diferente, sem água, telefone...
Folha - Você não pára nunca?
Falabella - Sempre trago minhas "miguelanças" para São Paulo.
Folha - Como são os musicais que vão estrear?
Falabella - São dois musicais opostos, encenados em dois teatros com que tenho muita intimidade: o Procópio, por causa do "Sai de Baixo", e o Jardel, em que fiquei em cartaz com "Beijo". Os espetáculos norte-americanos vêm com cartilha própria, exigida por contrato. Mas tive liberdade para mexer no "Godspell".
Folha - Por onde começa a criação de um musical?
Falabella - O grande segredo é escolher bem os fatos da biografia. Depois, é importante realçar as qualidades das músicas. Os solos têm de ser bem distribuídos. Esse é o xis do problema: as músicas também contam a história.
Folha - Mas, no caso da Carmen Miranda, as músicas já existiam.
Falabella - Carmen Miranda é um mito. Mais no mundo do que no Brasil. Tinha muita mágoa com a hostilidade daqui. Tanto que nunca mais morou no Brasil. Como as canções já existiam, tivemos de nos preocupar em como inseri-las, porque o pico dramático é na canção, sem sermos óbvios.
Folha - Como você conta a história de Carmen Miranda?
Falabella - Para mim, era mais interessante se eu fincasse os pés na dramaturgia. Sabíamos que teríamos problemas com a quantidade de figurinos. Pensei: "Só se forem duas Carmens". Temos de ter uma excelente camareira, já que são 200 figurinos, e duas atrizes formando uma interação, conversando entre si. É um fetiche meu o diálogo interior.
Folha - Qual é o ponto de partida?
Falabella - A peça começa quando ela desaba no chão, ainda no limbo, vestida de noiva, uma homenagem a Nelson Rodrigues. Junta-se a um fato real: no zoológico do Rio de Janeiro, Carmen estava com Sinval Silva quando uma cigana apareceu e disse que ela iria morrer com 26 anos. Ela ficou desesperada. A cigana acabou virando uma terceira Carmen no espetáculo. É quem fica com o turbante no final.
Folha - A música é secundária?
Falabella - Não. Precisamos de qualidade vocal, de pessoas que cantam mesmo.
Folha - Em "Godspell" você traduziu as letras?
Falabella - Sim. Fiz versões das músicas. É o mesmo texto, só que mais para a realidade brasileira, mais para a Teologia da Libertação. Será um circo do ano 2000 multiétnico.
Folha - Você vai muito à Broadway?
Falabella - Conheço tudo da Broadway. Meu conhecimento de musicais é americano. Aqui, nossa musicalidade e temática são diferentes. Tem um surdo [tambor" no meu "Godspell".
Folha - O que você herdou dos tempos do besteirol?
Falabella - O humor. Sem ele, você não vive e não trabalha. Até na Nova Jerusalém o brasileiro tem humor, que não sei de onde vem. No besteirol, que é um termo pejorativo, descobrimos uma linguagem. Havíamos herdado um comportamento dos anos de chumbo em que rir era proibido. Fui muito patrulhado. Temos que entreter as pessoas.
Folha - Você acha que a marca de Caco Antibes ainda vai persegui-lo por muito tempo?
Falabella - Não, porque antes dele eu já era muito conhecido.
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