Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
24/07/2000 - 10h52

Seis títulos do "rei do baião" são relançados

Publicidade

PEDRO ALEXANDRE SANCHES, da Folha de S.Paulo

A BMG dá continuidade ao projeto de recuperação da obra do pernambucano de Exu Luiz Gonzaga (1912-89), relançando em CD mais seis títulos de sua discografia, que se somam aos dez editados em maio (é sempre em torno da época junina, por que será?) de 98.

Há muito que recuperar ainda, mesmo porque a escolha dos títulos não parece obedecer a alguma lógica mais reconhecível.

Mas, bem, isso acaba sendo uma qualidade, já que propicia comparar os altos e baixos do homem que burilou e tornou gênero nacional o baião, a partir do sucesso de "Baião" ("eu vou mostrar pra vocês/ como se dança o baião"...), dele com Humberto Teixeira.

Dois dos seis títulos são coletâneas, mas não no sentido em que se entende coletânea hoje (ou seja, produto que amontoa "sucessos" sem qualquer critério ou capricho de edição).

É que Gonzaga gravava desde o início dos anos 40, e a supremacia do gênero LP só foi começar a se estabelecer no final dos 50. Essa fase de transição, então, resultou em LPs como "Luiz Gonzaga Canta Seus Sucessos com Zé Dantas" (59), sensacional compilação de obras-primas da dupla lançadas no decorrer dos anos 50.

Não há "Asa Branca" ou "Baião" (da lavra da dupla Gonzaga-Teixeira), mas estão aqui outras das mais perfeitas amostras da arte de Luiz Gonzaga -a picaresca "O Xote das Meninas" (53), a meiga "Sabiá" (51), a balançada "Riacho do Navio" (55), a dramática "Vozes da Seca" (53).

A outra compilação, "São João na Roça" (62), reúne motivos juninos de Gonzaga -divertidíssimos, ótimos para arrasta-pé, mas nada de fato muito importante.

Então vêm os quatro títulos originais, todos eles da década de 60, riquíssimos para que se entendam várias coisas sobre a história de Luiz Gonzaga.

O que eles explicam, nas entrelinhas, é que a natural guerra de gerações -a bossa nova havia eclodido em 58- operou estragos irreparáveis no vigor de Gonzagão.

Mais que a dança das cadeiras entre os modismos de cada hora, mostram que, por esgotamento de fórmula, pela queda de auto-estima forçada pela chegada forte dos mais novos ou pela decadência natural e inevitável, o artista perdera muito de sua fibra àquela altura.

Em "Ô Véio Macho" (62), inaugurava uma nova parceria, com José Marcolino, que, embora direitinha, em pouco lembraria as anteriores, históricas, com Humberto Teixeira, Zé Dantas. Luiz, o cantor/animador, ajudava na impressão de queda, parecendo triste, desanimado.

"Sanfona do Povo" (64) marca uma adesão ao populismo, provavelmente também ao próprio regime que se instalava.

Talvez nem fosse tão evidente ou agressivo à época, mas a loa religiosa "Rainha do Mundo" soa, hoje, trágica (não dá para rir), em versos como "Senhora rainha do mundo/ eu te suplico por piedade/ olhai e amparai/ esta terra da liberdade". Que terra da liberdade, seu Gonzaga?

Depois vem "São João do Araripe" (68), mais vivo e arejado porque mais leve, também provavelmente porque o tropicalismo já espanava um vento de reabilitação sobre o velho padroeiro. Aí cabiam mais festas juninas, tradicionalismo, o drama nordestino "A Cheia de 24", por Severino Ramos.

Por fim, há "Canaã" (69). Aí os efeitos tropicalistas se amplificavam, e Gonzagão se ocupava da empreitada de lançar seu filho, Gonzaguinha, como compositor em "Pobreza por Pobreza", "Festa", "Erva Rasteira" e "Diz Que Vai Virar".

Mesmo que o velho artista não quisesse, as quatro canções do filho (que só uns quatro anos depois conquistaria seu lugar ao sol, via festivais universitários e música politizada, em tudo distantes da festa que seu pai promovera nas décadas passadas) sorrateiramente o afastavam da raiz do baião (não só elas, é claro).

Como que em contra-ataque armado de dentro, "Canaã" retomava, depois de cerca de 20 anos de afastamento, a parceria com Humberto Teixeira, na faixa-título e em "Baião Polinário".

Nesta, estavam postas todas as contradições. "Mai (sic) respeito com o sertão/ essa coisa tão pachola/ sem cabocla e sem viola/ me perdoe, não é baião", indignava-se a letra.

Mas o tiro estava fugindo pela culatra: o baião já estava deturpado, mesmo o de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Luiz exibia na voz e no viço a dor de já pertencer mais à história que à vida, e assim seria por mais 20 anos (fase que a BMG fica devendo). Cruel, mas costuma ser assim mesmo.

Clique aqui para ler mais de Ilustrada na Folha Online

Discuta esta notícia nos Grupos de Discussão da Folha Online


 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página