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21/05/2002 - 03h49

Aïnouz filma racismo pelo viés sexual

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ALCINO LEITE NETO
enviado especial a Cannes

A audácia de "Madame Satã", primeiro longa-metragem do diretor brasileiro Karim Aïnouz, exibido na mostra Um Certo Olhar, do Festival de Cannes, não se deve apenas ao fato de abordar o racismo no Brasil pelo viés escandaloso da vida de um homossexual negro dos anos 30.

Trata-se também de um filme com ampla liberdade estética, que se permite inclusive o excesso e o erro, desde que sejam resultado da paixão de filmar e da convicção na força do personagem.

O mitológico bairro da Lapa, no Rio, é o universo do filme. Nele circula João Francisco dos Santos (1900-76), negro, malandro e homossexual, que ficará famoso para a história da marginalidade do país como Madame Satã (nome de filme de Cecil B. DeMille).

A Lapa de Aïnouz, extraordinariamente reinventada pela fotografia de Walter Carvalho e pelos cenários de Marcos Pedrosa, é um mundo de claro-escuro, de brilhos e pontos cegos, de lama, lodo e ruína. Tudo isso serve menos para impregnar o ambiente de realismo e glamour do que para dar materialidade às coisas, evitando a reconstrução fria de época e transformando a película num espaço de convergências sensoriais e poéticas.

Aïnouz concentrou-se nessa composição visual -que aquece, umidifica, desfoca, rascunha a imagem- para fazê-la corresponder à fantasia exuberante e à sensualidade conflitiva do personagem, mas também ao ambiente de brutalidade, excrescência social e pobreza que filma.

A pulsação do diretor impregnou os atores. Lázaro Ramos faz o protagonista com grande fôlego, acompanhado de uma dupla brilhante, Flávio Bauraqui (o travesti Tabou) e Marcélia Cartaxo (a prostituta Laurita). "Madame Satã" é um dos bons filmes exibidos na mostra oficial de Cannes.

Amor e concorrência
Sexualidade e poder também é tema de "Demonlover", do francês Olivier Assayas, que concorre à Palma de Ouro. O filme foi vaiado em várias sessões, mas é um dos bons trabalhos de cinema em exibição no Festival de Cannes.

A tendência do público majoritário de se apegar ao roteiro e à história é contrariada perversamente pelo diretor. Assayas faz um filme quase experimental, em que as linhas narrativas se perdem e o espectador que não estiver atento à própria expressão do cinema se desinteressa. Ao mesmo tempo, ele se dedica a fazer um verdadeiro inventário dos signos e sinais da época, fixando sua câmera numa multidão de objetos e lugares que fazem parte da experiência contemporânea.

O filme tem base ficcional, mas que segue à risca: é um thriller de espionagem, em que uma executiva conspira contra sua própria firma num grande negócio de videogames pornôs. A disputa das mulheres pelo poder no mundo high-tech é o que interessa a Assayas. Ele a demonstra num estilo que converge a obra de Hitchcock e de David Cronenberg.

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