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25/05/2002 - 03h23

Escritor diz que Carter quer o Nobel da Paz

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SILVIO CIOFFI
da Folha de S. Paulo, em Londres

Guillermo Cabrera Infante está convencido de que "Jimmy Carter está é querendo ganhar o Nobel da Paz". Com sua verve de metralhadora, o escritor desqualificou a ida do ex-presidente americano Carter a Cuba.

Para o principal desafeto de Fidel Castro, "Carter em Cuba é realmente como o papa em Cuba: o papa se encontrou com Fidel, disse que Cuba iria se abrir para o mundo e que o mundo se abriria para Cuba e a verdade é que isso não significa nada".

Mestre dos jogos de palavras, Cabrera Infante, 73, apoiou Fidel contra Fulgêncio Batista, tornou-se diretor do departamento de Cultura pós-Revolução de 1959. Foi nomeado adido na Bélgica, entre 1962 e 1965, de onde partiu para o exílio em Madri e, depois de 1968, em Londres, onde vive.

Autor de "Mea Cuba", "Havana para um Infante Defunto" e co-autor do recém-lançado "Diez Autores en Busca de una Ciudad", sobre Nova York (297 págs., Editorial Planeta, de Barcelona), o escritor falou à Folha:

CARTER - "Jimmy Carter acreditou que tudo vai bem em Cuba, que não se produzem lá armas bacteriológicas: mas o que iria dizer Fidel Castro? Que tem? Carter deu sua opinião sobre o assunto, sem ser físico, nem químico, nem biólogo... Ele não significa nada, mas está tentando dar uma legitimidade "americana" ao regime. E, quando era presidente, se meteu no Haiti e fez estrago. Fidel, aliás, o atacou nos anos 80, no episódio dos refugiados de Mariel, e quando houve a crise do Irã. Até o chamava de "el manissero", vendedor de amendoins [Carter produz amendoins na Geórgia, sul dos EUA]. Agora virou "o grande americano, amigo de Cuba': amigo de que Fidel se mantenha no poder até que tenha vontade, ou até que morra, ou que o matem."

FIDEL - "Ele é um mentiroso, promete tudo e não cumpre. É um grande ator fazendo o papel de Fidel Castro, já que Cuba vive uma revolução de 43 anos sem nenhuma mudança. Carter está é alentando uma gente dissidente, mas de uma dissidência permitida, gente ligada ao projeto Varela, ao sistema Arcos, a planos de reformas permitidas. Se fossem opositores de verdade, seriam enviados à Sibéria, à prisão. Cada vez que vem gente dos EUA, Fidel tem preços para presentear, como já fez com Jesse Jackson. Antes dava charutos e frutas -hoje dá de presente seres humanos."

PAPA - "Como disse, Carter em Cuba é como o papa em Cuba. Deram ao papa um espaço que ele queria e, em Cuba, deram à igreja um espaço que a ela interessava. A Cúria Romana não liga a mínima para Fidel, mas se preocupa com o crescimento do que se lá chama "santería" -esses ritos que combinam iemanjá, xangô e tudo isso ao catolicismo, igual, aliás, com o que ocorre no Brasil. Fidel não tem religião, a não ser a religião de si mesmo: ele é o papa, ele é o rei, ele é o presidente, uma figura como a dos caudilhos sul-americanos, se fez marxista e já não é marxista, fez uma revolução que já não é revolução, porque a União Soviética que o subvencionava já não existe mais. Mas, enfim, é inegável que o papa deu legitimidade católica a Fidel Castro."

DIPLOMACIA - "Questionam porque os EUA mantêm relações com a China e com o Vietnã. É simples: Mao Tsé-tung e Ho Chi Minh morreram. Depois disso, não sobra muito nesses regimes autocráticos, impostos por uma só pessoa, como ocorreu também com a URSS de Stálin. Fidel não morreu e já dividiu tudo com os irmãos, um é ministro das forças armadas, outro da agricultura, a mulher de Raúl Castro é chefe de não sei o quê, uma dinastia que reina para tentar se conservar no poder. Raúl Castro, por exemplo, é uma espécie de ditador paraguaio, não é simpático, nem fotogênico, nem tampouco inteligente como o irmão -porque Fidel é inteligente, é um mestre da propaganda. Em Cuba o que funciona é a propaganda, para o exterior, e a polícia, para o interior."

NOBEL - "Carter não significa nada. É candidato ao Nobel da Paz, em Oslo, como de resto escritores medíocres ganharam o Nobel de Literatura. Queria estar na televisão, como esteve, e Castro queria as primeiras páginas -e conseguiu isso, quer se passar não por ditador, mas por um sujeito benévolo, "pai dos cubanos" . Não podemos esquecer que Joseph Stálin era chamado de "Tio Joe". Um "Tio Joe" que matou 50 milhões de russos, o que se soube só depois que ele morreu. Quando Fidel morrer, ou sair do poder, saberemos de todos os horrores que fez, respaldando guerrilhas na América do Sul, ajudando esse Hugo Chávez na Venezuela, que é uma caricatura de Juan Domingo Perón na Argentina, saído das forças armadas, populista, prometedor. A Venezuela está hoje pior do que era."

LIVRO - "Estou escrevendo. Termino um livro iniciado em 1995, "A Ninfa Inconstante", porque houve um filme famoso, aliás foram feitas três versões desse filme, que se chamava de "A Ninfa Constante"."

CINEMA - "Gostei de "A.I." ["Inteligência Artificial", de Steven Spielberg], que me pareceu bom até a meia hora final. Vi fragmentos do "Homem-Aranha" e me parece que o filme é uma festa! Sou um fanático dos "comics". Quero ver como ficou o filme depois do 11 de setembro, pois na primeira versão havia um clímax entre as torres gêmeas, que foi eliminada."


 

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