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03/06/2002 - 06h09

Ferruccio Soleri encena Arlecchino imemorial

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FRANCESCA ANGIOLILLO
da Folha de S.Paulo

Se, na peça de Carlo Goldoni, Arlequim serve a dois patrões, há 38 anos ele tem somente um mestre: o veterano Ferruccio Soleri.

Desde a fundação do Piccolo Teatro di Milano, em 1947, somente outro ator encenou antes de Soleri o papel de Arlecchino (a grafia original do nome se justifica pelo fato de as peças, aonde quer que a companhia vá, sempre serem encenadas em italiano).

Agora, Soleri e mais 19 atores da mítica trupe criada por Giorgio Strehler (1921-1997) vêm ao Brasil para representar o clássico que Goldoni escreveu em 1745, "Arlecchino, Servitore di Due Padroni" (Arlequim, Servidor de Dois Patrões), em quatro apresentações -duas no Municipal do Rio, nos dias 8 e 9, e duas no Alfa, em São Paulo, em 13 e 14 de junho.

Um tira-gosto do trabalho será oferecido já hoje por Soleri. O ator faz, a partir das 19h30 -para os presentes à abertura da mostra de 12 figurinos, vindos dos baús da companhia milanesa-, uma demonstração do uso das máscaras na commedia dell'arte.

A commedia dell'arte é um gênero teatral popular e itinerante, surgido no século 17, no território que viria a ser a Itália. Vêm dela personagens, sempre mascarados, cuja representação é marcada por improviso e acrobacia. Ela inspirou o personagem de Goldoni e marca o teatro de Strehler.

Na peça que o Piccolo Teatro traz ao Brasil, o personagem bufo encenado por Soleri apronta estripulias enquanto tenta obedecer simultaneamente a dois patrões, Florindo e Beatrice.

"É um personagem ingênuo, que não poderia viver no mundo de hoje, porque não sabe o que é compromisso: faz só o que quer, como uma criança. E só é esperto quando se encontra em dificuldades", explica Soleri em entrevista à Folha, com a autoridade dada pela longa convivência.

Na quinta, Soleri amplia a dose, em workshop gratuito, às 15h, na Faculdade de Teatro da Unirio (Universidade do Rio de Janeiro), sobre a criação do Arlecchino.

Ele hoje define sua "relação" com o papel como "belíssima". Mas confessa que teve "crises".

"Depois de um cinco ou seis anos fazendo quase exclusivamente Arlecchino, disse a Strehler: "Giorgio, me deixe fazer alguma outra coisa também". E ele: "Ferruccio, veja, eu deixo, quando você estiver livre. Mas todos querem Arlecchino! É você". Entendi que o importante não é quantos papéis se faça, mas a satisfação e a gratidão do público."

A companhia que Strehler fundou e se tornou um paradigma tem duas frentes de atuação. Na primeira, a influência assimilada por Strehler das vertentes do teatro do alemão Bertolt Brecht (1898-1956) aparece em sua forma crítica. É o caso, por exemplo, da recente montagem de "As Rãs", de Aristófanes.

Exibida em Siracusa, na Sicília (sul da Itália), no mês passado, a peça causou uma reação irada do governo italiano, por exibir de forma satírica a figura do premiê Silvio Berlusconi no cenário.

Já as artimanhas do cândido Arlecchino são brechtianas em outro rumo, como explica Soleri: "Strehler não fez em "Arlecchino, Servitore di Due Padroni" um teatro político. Porém há algumas tiradas que são um tanto quanto estranhas para aquela época, mas soam atuais, então se ressaltam."

"Nela, o discurso brechtiano é o que Strehler colocou em todo seu teatro: isto é, brechtiano no sentido de que o ator deve se ver de fora, fingir quase que é um espectador de si -mas não no sentido político, de uma modernização da encenação", conclui Soleri.


 

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