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02/08/2000 - 04h55

Companhia do Latão investe no conflito de classes

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VALMIR SANTOS, da Folha de S.Paulo

O quinto espetáculo da Companhia do Latão, "A Comédia do Trabalho", promete ser o mais radical do repertório erguido durante os quatro anos de existência do grupo.

A começar pela política. A montagem joga luz sobre o conflito de classes hoje. Expõe ricos e pobres, patrões e (des)empregados, com filiação incondicional ao pensamento do teórico, poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956).

"A peça se passa no campo da revolta, do protesto. A gente mostra que existe uma potência revolucionária nas forças sociais quando elas se organizam ou estão em vias de", afirma o co-diretor Sérgio de Carvalho, 33.

Não por acaso, um dos ensaios abertos aconteceu há poucas semanas em um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) em Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná.

"Os sem-terra cobriram com plástico preto uma cavidade que existe nas
ruínas de um antigo cinema da cidade", lembra Carvalho. A receptividade, diz ele, foi satisfatória e mostrou que a narrativa estava no caminho certo, "contava uma história".

"A Comédia do Trabalho" projeta uma província imaginária, Tropélia, cujo cotidiano é estampado nas manchetes dos jornais do Brasil real.

Dois banqueiros "gêmeos", Léo (Ney Piacentini) e Créo (Heitor Goldflus), buscam ajuda do Estado para sanar dívidas.

Por meio desse simulacro de Proer (programa de reestruturação do sistema financeiro nacional), eles querem fazer negócios com investidores estrangeiros.

"Mais do que a crise do trabalho, a peça ataca a ideologia da crise do trabalho. A crise é um pouco glamourizada como um dado contra o qual você não pode tomar nenhuma atitude", diz o co-diretor Márcio Marciano, 37. "Queremos mostrar que é possível ver a crise com outros olhos."
As maracutaias de Léo e Créo são entrecortadas pelo drama do
desempregado Núlio (Piacentini), que ameaça se jogar do topo do prédio onde trabalhou por dez anos. A sua atitude desperta a população para o caos social em que está metida.

"Uma das grandes questões que tínhamos era como representar forças de reação popular sem mistificar a revolta", explica Carvalho. "Ao mesmo tempo, não queríamos cair no contrário disso, o niilismo, que não deixa possibilidades de transformação a partir das classes oprimidas." Brechtianamente, o indivíduo espelha a força coletiva (leia abaixo).

Há até uma alegoria da foice e do martelo na cena em que o empresário, que "superexplora" funcionários, tem um pesadelo com os "fantasmas esquerdistas".

Diante do desespero de Núlio, a população, formada em sua maioria por desempregados, grita em protesto, ainda que se ouça, aqui e ali, um "pula!, pula!".

A contradição é um dos fundamentos da linguagem do Latão. "É o único jeito de traduzir a complexidade do que está acontecendo", diz Carvalho. Instaurada a confusão, o governador de Tropélia manda "baixar o cacete".

A Companhia do Latão investe no "poder desmistificador" do teatro, arte antiilusionista por natureza, segundo Carvalho. "O teatro está fundado na contradição entre ficção e realidade, e o público percebe imediatamente o que é uma coisa ou outra na cena."

Esta é a primeira criação eminentemente coletiva do grupo, que afunilou todo o processo em cursos do projeto Artistas em Residência, da Oficina Oswald de Andrade, em SP, onde a peça foi gestada entre março e julho. Originou também um documentário em vídeo sobre a pesquisa.

Peça: A Comédia do Trabalho
Texto: Companhia do Latão
Direção: Sérgio Carvalho e Márcio Marciano Direção musical: Walter Garcia e Lincoln Antônio
Com: Companhia do Latão (Adriana Mendonça, Alessandra Fernandes, Maria Tendlau, Heitor Goldflus e Ney Piacentini
Quando: estréia amanhã, às 21h; qui. a sáb., às 21h; dom., às 19h. Até 1º/10
Onde: teatro Sesc Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, tel. 0/xx/11/256-2281)
Quanto: R$ 15

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