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21/09/2002 - 00h19

Brasileiro protagoniza novo filme de David Lynch

AUGUSTO PINHEIRO
free-lance para a Folha Online

Ele bateu Matt Damon, Tom Welling (o Super-Homem do seriado "Smallville") e Wes Bentley (de "Beleza Americana"). O carioca Pedro Andrade, 23, concorreu com esses três e com outros tantos atores e ganhou o papel de protagonista no novo filme do norte-americano David Lynch, "Our Lady of Sorrow".

O filme, uma produção independente do diretor ("Cidade dos Sonhos", "Veludo Azul"), está em fase de edição e deve estrear no próximo Sundance Festival, em janeiro do ano que vem.

Reprodução
Pedro em editorial da "Oyster"
Pedro começou sua carreira como modelo e, nos EUA, já fez campanhas para Ralph Lauren e Calvin Klein. Mas, ao mesmo tempo, estudou para ser ator. No Brasil, já havia feito cursos no Tablado e em uma faculdade de artes cênicas. Em Nova York, onde mora há dois anos, fez Actor's Studio, Esper Studio e um intensivo de interpretação para cinema.

Em Nova York, trabalhou em duas peças e dois curtas-metragens, "Dinner" e "The Dress", o último dirigido por Peter Hagist, que já havia trabalhado como assistente de Lynch e que deu o toque sobre os testes para Pedro. "Eu pensei que era impossível. Mas fui de qualquer maneira."

"Foram 11 testes", conta Pedro. "Em cada um deles, Lynch dava um texto. Tive que interpretar, além do personagem principal, outro papel."

No último teste, quando só havia Pedro e mais quatro concorrentes, o ator brasileiro teve de sentar na frente de Lynch. "Foi até engraçado, ele botou um holofote na minha cara, aí disse 'não fala nada'. Ele ficou de 15 a 20 minutos olhando para a minha cara, desligou o holofote e disse que o papel era meu. E eu tinha decorado nove páginas", lembra.

Pedro conta que, depois, o diretor disse que ele foi o escolhido exatamente por ter obedecido e ficado quieto. "Os outros riram ou falaram", diz.

Houve uma preparação de quatro meses antes do início das filmagens. "Ele teve o maior cuidado com esse período de estudo, de leitura, de ensaio."

As filmagens começaram em maio e terminaram em agosto. Houve locações em Nova York, Long Island e no Tennessee, mas a história passa em Long Island. "Diferentemente de 'Cidade dos Sonhos', esse filme tem começo, meio e fim", diz Pedro.

No filme, Pedro contracena com Kirsten Dunst ("Homem-Aranha") e Gloria Stuart (a velhinha de "Titanic"). Ele interpreta Tim, um "trailer trash", como define. "Ele mora num trailer com a avó [Gloria Stuart], vive bebendo cerveja e vendo TV", conta.

Tim maltrata a avó e a namorada, interpretada por Dunst. "Depois dos primeiros 25 minutos, a personagem da Kirsten desaparece, e todo mundo começa a acusar o Tim, porque ele batia nela. Ele tem que provar que não foi ele."

Reprodução
Pedro Andrade em campanha
Como todo bom filme de David Lynch, as bizarrices estão, sim, presentes. "Tive que filmar uma cena com sete mulheres mortas. Ele pediu autorização ao governo, à funerária e às famílias para usar os cadáveres", conta Pedro. "Foi uma cena dificílima para mim. Ele não deixou eu ter contato com os corpos antes porque queria uma reação espontânea. Eu entrei em um quarto com cheiro de éter e nem tive que me preocupar com a atuação porque o choque é o mesmo."

"Depois, tive pesadelos. Fiquei me perguntando como é que uma família pode autorizar isso."

Pedro conta que Lynch escolheu fazer um filme independente porque não queria que houvesse censuras. "É um filme superpesado, superdenso, tem umas cenas de sexo superfortes."

Sobre trabalhar com Lynch, Pedro diz que ele é muito perfeccionista e "dirige muito" os atores. A equipe teve que refazer o trabalho de duas semanas, pois, durante a edição, Lynch percebeu que Kirsten Dunst estava com as unhas pintadas de cor-de-rosa, e ele queria unhas vermelhas.

A cena em que Tim atira a avó escada abaixo teve de ser refeita porque as flores que apareciam no trailer estavam muito viçosas. "Ele queria que estivessem murchas. Todo mundo tinha gostado do resultado, inclusive ele, mas tivemos que refazer. E é uma cena superdesgastante, principalmente contracenando com uma senhora de 80 anos."

"Mas, pelas cenas que já vi, dá para entender a razão de tudo isso. Sem dúvida é o detalhe que faz a diferença."

Pedro diz que Lynch está atento a todos os movimentos dos atores. "Ele fala 'por que você não morde o lábio?', 'por que você não coloca a mão no bolso?', 'olha para ela com um sorriso', 'vira a cabeça assim'"

Durante o período de filmagem, Lynch usava também métodos pouco ortodoxos para envolver os atores com os personagens. "Às vezes, ele me ligava às três horas da manhã e falava para eu voltar a dormir como Tim em vez de Pedro."

Outra vez, ele deu no set um par de óculos com lentes acinzentadas para Pedro. Pediu para o ator passar o dia inteiro com eles. "Queria que eu tivesse outra perspectiva do mundo, que ficou com uma cara menos empolgante, menos colorida, menos bonitinha", diz.

Pedro diz que o filme mudou sua vida. "Não só profissionalmente, como reputação, cachê e currículo, mas mudou a minha vida como ator mesmo. Cresci muito mais do que se eu tivesse feito dois anos de curso. Ele é muito didata, tem prazer em ensinar, em instigar, em aproveitar o ator."

Mas completa: "Ele não é o tipo de diretor que fica seu amiguinho, que vai me ligar para tomar um chopp."

Depois das bizarrices lynchianas, Pedro continua trabalhando como modelo (no dia desta entrevista, tinha feito um ensaio para a revista "Arena"), mas já tem novos projetos.

Ele vai interpretar um jornalista em apuros em "Mísseis para o Rio", de Beto Brant. "Adoro a linguagem dele, contemporânea. Eu amei 'O Invasor'. Não deve nada a filme nenhum aqui fora."

Ele também está fazendo testes para seriados da NBC, nos EUA, e para alguns filmes, mas prefere não dizer quais.

"Trabalhar com o David Lynch abriu muitas portas. Hoje as pessoas prestam mais atenção quando falo, quando me recebem."

Se pudesse escolher outro diretor, ele gostaria de trabalhar com Walter Salles, Pedro Almodóvar ("Sou alucinado por ele") ou Woddy Allen. Alguém duvida?
 

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