Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
22/09/2002 - 02h30

Atores encontram novo mercado nas simulações de casos reais na TV

FERNANDA DANNEMANN
free-lance para a Folha de S.Paulo

Nem só de novelas e "reality shows" vivem os aspirantes ao estrelato na TV. Uma leva de atores desconhecidos encontra a sonhada oportunidade nas breves encenações envolvendo sexo, religião e tragédia produzidas por programas como o "Eu Vi na TV" (Rede TV!), "Fala que Eu te Escuto" (Record), "Linha Direta" (Globo) e "Programa do Ratinho" (SBT).

"Meu sonho é ser protagonista de uma novela da Globo", diz Priscila Trevisan, 24, que já estrelou o quadro "Aconteceu no Motel", no programa noturno de João Kléber na Rede TV!. "Mas como chegar lá? O ramo é podre", diz a ex-lutadora da lama do "Domingo Legal" (SBT), que arriscou-se a apanhar sabonetes na "Banheira do Gugu".

Ex-dançarina em cassinos e casas noturnas da Europa, Priscila diz que ficou constrangida: "O povo é preconceituoso, mas se for na Globo, ninguém fala. A Débora Secco ficou nua na novela, e todo mundo achou lindo. A Mel Lisboa fez cenas fortes na cama e foi elogiada", afirma. Mas no programa de João Kléber, o nu feminino divide o papel principal com os intervalos comerciais.

No roteiro costurado pelo apresentador, que bola as histórias com sua equipe, tudo é motivo para as atrizes tomarem banho. As cenas, dignas de comercial de sabonete, são longas e repetidas à exaustão.

Em certos momentos, o telespectador pensa estar diante de um filme pornô. "O quadro "Aconteceu no Motel" aumentou o ibope em cinco pontos", diz o apresentador, que, no entanto, reconhece as limitações do elenco: "Alguns são legais, outros não, né?". Os cachês pagos pelo programa são de R$ 400 em média, mas tudo pode acontecer: Beatriz Fonseca, 27, é um exemplo. "Nem fiz teste. O João [Kléber] olhou para a minha cara e disse que podia ser. O cachê era de R$ 450 pra gravar de lingerie. Mas, na hora, a cena foi um banho sensual. Quase desisti e acabei ganhando R$ 3.000", diz ela, que deu graças a Deus quando soube que os colegas do escritório em que trabalha não viram seu banho via satélite.

Mais falas
Mas a teledramaturgia alternativa não atrai somente atores de ocasião. Gente que há anos vem tentando se lançar no palco vê esse nicho como uma grande chance. É o caso de Márcio Aguiar, 27, que estudou artes cênicas na PUC, participou de programas no SBT e na Record e posou nu para uma revista.

"Adorei o trabalho na Rede TV!, foi um dos papéis com mais falas que já peguei. Exigiu muita expressão corporal e facial", afirma Aguiar, contando que a namorada não gostou das cenas em que ele e uma atriz se agarravam quase nus.

As locações podem ser motéis ou residências. "Como só tinha uma câmera, a moça tomava banho e era filmada da porta do banheiro, enquanto eu e o João Kléber assistíamos num monitor no quarto", explica Renné Navarro, 38, que virou ator por acaso, depois de procurar a produção do programa para pedir ajuda para conhecidos do bairro onde vive. "O João ia dando as coordenadas, dizendo "passa a mão assim, mexe assim"."

Humor
No SBT, Ratinho também inovou o quadro "Teste de DNA", que, segundo ele, "estava monótono". "Quisemos uma coisa mais light e a audiência aumentou dois pontos", afirma o apresentador. "Ficou mais família, porque nosso negócio é humor, não sexo", diz ele, que optou por fazer as encenações com atores fixos do programa.

"Eles eram crus mas melhoraram tanto que vamos colocar diálogos", explica o diretor Fábio Furiatti. Segundo ele, não há roteiros nem elaboração para as histórias, baseadas em depoimentos de pessoas que querem fazer o teste de paternidade. "Com esse sarrinho todo, tira o ódio do pessoal e facilita o acerto dos advogados", diz Ratinho.

Drama
Na Record, o filão é o dramalhão baseado em depoimentos dos fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus ao programa religioso "Fala que Eu Te Escuto" (exibido diariamente à 1h).

O programa existe há cinco anos e só nos últimos três meses usou cerca de 200 atores para encenar situações que, comentadas por um bispo-apresentador, têm o sobrenatural como astro principal. A equipe se resume à diretora, Denise Antunes, um câmera, um assistente e um motorista. "A gente grava em várias casas, não tem critério. Pode ser até na minha. Não temos cenário para não ficar repetitivo", afirma ela.

Os atores fazem questão de não revelar o cachê. "Não é muito, mas é gratificante e vale como laboratório. Espero que me vejam e me convidem para fazer novelas", diz Rosângela Crepaldi, 37. Paula Millen, 31, que já gravou clipes, comerciais e fez teatro profissional, diz que não há texto. "A Denise tem mais ou menos a história na cabeça, e a gente improvisa. Independentemente de eu acreditar naquilo, o importante é que estou treinando. A gente dá muita risada", conta ela, que já fez papel de amante de homem casado e de vítima de feitiçaria.

Alessandro Mazzer, 38, há dez anos estudando interpretação, integra o "cast" do "Fala que Eu Te Escuto", mas se queixa da falta de oportunidades. "Hoje, todo mundo é ator, modelo e figurante. Para entrar, você tem que ser amiguinho de diretor".

Incentivo
A modelo Mariza Cardoso, 29, que participou duas vezes do "Aconteceu no Motel", não se incomodou com a nudez, mas quer algo mais. "Quero papéis em que possa interpretar", diz ela, que saiu cheia de arranhões de uma gravação de pegadinhas na mesma emissora. Iraci Navarro, 72, atuou ao lado do filho, Renné, no quadro do Motel. E adorou. " Só ganhei R$ 50, mas valeu a pena", afirma. "Ela é macaca de auditório. O cachê é relativo. Foi só para dizer "sim, claro". Eu, que fui o ator principal, ganhei R$ 300 por dois dias de trabalho. Foi bom", diz Renné.

Fim de linha
O elenco anônimo do "Linha Direta" (Globo) conta com melhor estrutura, mas está ameaçado de perder seu lugar ao sol na emissora carioca, já que o programa teve as gravações paralisadas durante o horário eleitoral. Procurada pela Folha, a Globo se recusou a fornecer os telefones dos atores. Na produção, a suspeita é de que a atração não voltará ao ar.
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página