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12/11/2002
-
10h42
free-lance para a Folha
Os nove trabalhos da exposição "Intimidade" curto-circuitam noções de tempo, sanidade, autoria, identidade e até mesmo de gravidade. São, em sua maioria, videoinstalações, assinadas por artistas brasileiros e estrangeiros que configuram um panorama das atuais melhores provocações da arte contemporânea.
O inglês Chris Cunningham comparece com a obra "flex", exibida na Bienal de Veneza passada (2001), em que um homem e uma mulher encenam o mito da criação em chave pós-moderna. O artista trata de forma escultórica os corpos, que lutam violentamente e se reconciliam em meio a uma "ejaculação cósmica", nas palavras da crítica Sarah Kent.
Caberia um paralelo entre o Adão e Eva de Cunningham e os respectivos seres fundantes do cineasta alemão Tom Tykwer, no filme "Paraíso", atualmente em cartaz em SP. Do cinema vem a matéria-prima para a obra "Schizo", do suíço Christoph Draeger, que sobrepõe as notórias cenas de assassinato no "Psicose" de Hitchcock e no de Gus van Sant.
Enquanto em "flex" a noção de gravidade parece suspensa e em "Schizo" a idéia de autoria é disputada, no vídeo "Blanche Neige, Lucie", do francês Pierre Huyghe, estão em jogo os limites da identidade. Trata-se de um depoimento da dubladora da voz de Branca de Neve, que confessa ter levado 30 anos para se questionar sobre os direitos de uso de sua voz porque se confundia com a princesinha a quem insuflou vida.
O conceito de intimidade que perpassa a exposição, que tem curadoria de Daniela Bousso, não se resume, como se vê, ao clichê da privacidade e dos "reality shows". Mesmo a obra de Lucas Bambozzi ("Entre Quatro Paredes"), que tematiza mais diretamente a questão do voyerismo, é plena de sutilezas, como na busca, recorrente em seu trabalho, de impregnar objetos com a memória de pequenas existências.
Outro brasileiro na exposição, Gustavo Rezende constrói um retrato da ruptura com o status quo digno de um romance de Thomas Bernhard. Na instalação "A Natureza do Amor e a Passagem do Tempo", revisita um local de infância e, paradoxalmente, entoa uma canção de amor enquanto, tendo à mão um rato morto, simboliza desprezo pelas origens.
Sam Taylor-Wood e Pipilotti Rist, o francês Claude Lévêque e o brasileiro Marepe fecham o curto-circuito. A inglesa Taylor-Wood escancara em "Hysteria" a vizinhança entre riso e choro. A suíça Rist apropria-se de "Happiness Is a Warm Gun", dos Beatles, para assumir para si, não sem cinismo, a alienação feminina.
A exposição marca o possível fim da gestão de Daniela Bousso (1997-2002) na direção do Paço, que fincou a instituição no mapa das artes e imprimiu o perfil mais militantemente contemporâneo a um espaço expositivo da cidade.
INTIMIDADE
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária, tel. 3814-4832)
Quando: hoje, às 20h; de ter. a sex., das 11h30 às 18h30; sáb. e dom., das 12h30 às 17h30; até 15/12
Quanto: entrada franca
Paço das Artes exibe visão de nove artistas sobre a intimidade
JULIANA MONACHESIfree-lance para a Folha
Os nove trabalhos da exposição "Intimidade" curto-circuitam noções de tempo, sanidade, autoria, identidade e até mesmo de gravidade. São, em sua maioria, videoinstalações, assinadas por artistas brasileiros e estrangeiros que configuram um panorama das atuais melhores provocações da arte contemporânea.
O inglês Chris Cunningham comparece com a obra "flex", exibida na Bienal de Veneza passada (2001), em que um homem e uma mulher encenam o mito da criação em chave pós-moderna. O artista trata de forma escultórica os corpos, que lutam violentamente e se reconciliam em meio a uma "ejaculação cósmica", nas palavras da crítica Sarah Kent.
Caberia um paralelo entre o Adão e Eva de Cunningham e os respectivos seres fundantes do cineasta alemão Tom Tykwer, no filme "Paraíso", atualmente em cartaz em SP. Do cinema vem a matéria-prima para a obra "Schizo", do suíço Christoph Draeger, que sobrepõe as notórias cenas de assassinato no "Psicose" de Hitchcock e no de Gus van Sant.
Enquanto em "flex" a noção de gravidade parece suspensa e em "Schizo" a idéia de autoria é disputada, no vídeo "Blanche Neige, Lucie", do francês Pierre Huyghe, estão em jogo os limites da identidade. Trata-se de um depoimento da dubladora da voz de Branca de Neve, que confessa ter levado 30 anos para se questionar sobre os direitos de uso de sua voz porque se confundia com a princesinha a quem insuflou vida.
O conceito de intimidade que perpassa a exposição, que tem curadoria de Daniela Bousso, não se resume, como se vê, ao clichê da privacidade e dos "reality shows". Mesmo a obra de Lucas Bambozzi ("Entre Quatro Paredes"), que tematiza mais diretamente a questão do voyerismo, é plena de sutilezas, como na busca, recorrente em seu trabalho, de impregnar objetos com a memória de pequenas existências.
Outro brasileiro na exposição, Gustavo Rezende constrói um retrato da ruptura com o status quo digno de um romance de Thomas Bernhard. Na instalação "A Natureza do Amor e a Passagem do Tempo", revisita um local de infância e, paradoxalmente, entoa uma canção de amor enquanto, tendo à mão um rato morto, simboliza desprezo pelas origens.
Sam Taylor-Wood e Pipilotti Rist, o francês Claude Lévêque e o brasileiro Marepe fecham o curto-circuito. A inglesa Taylor-Wood escancara em "Hysteria" a vizinhança entre riso e choro. A suíça Rist apropria-se de "Happiness Is a Warm Gun", dos Beatles, para assumir para si, não sem cinismo, a alienação feminina.
A exposição marca o possível fim da gestão de Daniela Bousso (1997-2002) na direção do Paço, que fincou a instituição no mapa das artes e imprimiu o perfil mais militantemente contemporâneo a um espaço expositivo da cidade.
INTIMIDADE
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária, tel. 3814-4832)
Quando: hoje, às 20h; de ter. a sex., das 11h30 às 18h30; sáb. e dom., das 12h30 às 17h30; até 15/12
Quanto: entrada franca
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