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01/02/2003 - 04h40

Peça "Prêt-à-Porter" usa agressão como forma de carinho

SERGIO SALVIA COELHO
da Folha de S. Paulo

Houve um tempo em que o "Prêt-à-Porter" do Centro de Pesquisa Teatral de Antunes Filho se apresentava ao público enquanto catequese.

Com discurso messiânico, os atores avisavam ao público que este teatro totalmente baseado no ator seria o único antídoto contra um teatro equivocado, isto é, todos os outros. Provocado, o público atentava ao blefe: as tramas pendiam às vezes para o melodramático, havia trilhas supérfluas que buscavam um clima, a técnica dos atores não raro se encharcava de arrogância.

A causa, porém, era irrepreensível. Tanto é que venceu. Nos últimos tempos, o teatro é do ator. Livres da responsabilidade de pioneiros, os atores do CPT podem agora ser modestos. Apresentam "Prêt-à-Porter 5", na sua habitual forma de três sketches curtas para dois personagens, desta vez apenas como um esboço -e, assim, o projeto atinge seus objetivos.

Contra a pirotecnia cenográfica pseudo-Broadway, um palco com uma única tapadeira ao fundo, iluminado apenas pela luz ambiente -música de cena, só a trazida pela personagem. Esse despojamento, no entanto, não basta, já que a escassez pode roubar o foco do ator tanto quanto a exuberância, dando margem para soluções "geniais" do encenador. Mas aqui a encenação, assumida pelos atores, é invisível.

Não há nada de pobre nesse espetáculo, pois ele é sustentado na riqueza do ator. Quando Juliana Galdino passa por trás da tapadeira e se deslumbra com dezenas de estátuas imaginárias, o público passa a vê-las perfeitamente, graças à técnica da atriz: para atores assim escrevia Shakespeare. Isso não quer dizer que o texto, também composto pelos atores, seja brilhante.

A obrigatoriedade de um ator/ dramaturgo, objetivo perseguido há muito pelo CPT, desviava o ator de sua função essencial: a de viabilizar o verbo. Por isso, tramas complicadas foram substituídas nesses três esboços por situações simples, quase bases de improviso, com diálogos retrabalhados em cena, poéticos e profundos mais pela prosódia do que pelo conteúdo. E se há referência a arquétipos, isso fica só na cor de um chapéu, por exemplo: entenda quem quiser.

Assim, "Prêt-à-Porter 5" é como um Strindberg renovado, cruel na vivisseção sem buscar o lastro da psicologia. É o quintal de atrizes como Suzan Damasceno, cuja exuberância eclética comove e faz rir ao mesmo tempo, acertando as piadas sem fazer alarde, em contraste com a melancolia de Arieta Corrêa, que deixa transparecer uma tragédia secreta.

Emerson Danesi e Juliana Galdino, em participações menores, não ficam na sombra nem disputam foco: a cena é a luva deles, não tanto "prêt-à-porter", o que supõe uma fórmula infalível predeterminada, mas sob medida, para cada ator e cada platéia, cujo meio termo entre o trivial e o sublime deve ser reencontrado a cada apresentação.

Sai-se do espetáculo não deslumbrado pelos atores, o que seria deselegante, mas embriagado pela solidão dos que usam a agressão como forma suprema de carinho, que vislumbram a utopia em um encontro casual. E só depois se descobre que "Prêt-à-Porter 5" é uma obra prima.

Serviço
Prêt-à-Porter 5
Coordenação: Antunes Filho
Direção e interpretação: Suzan Damasceno, Arieta Corrêa, Emerson Danesi e Juliana Galdhino
Onde: Sesc Consolação (r. Dr. Vila Nova, 245, SP, tel. 0/xx/11/3234-3000)
Quando: hoje, às 22h
Quanto: de R$ 5 a R$ 10
 

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