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21/02/2003
-
03h43
da Folha de S.Paulo, em Nova York
De tempos em tempos, Hollywood produz uma obra de arte. É o reverso da regra de tentativa e erro, sendo o erro o filme bom. A mais recente é "Adaptação", que estréia hoje no Brasil, da jovem dupla Spike Jonze (diretor) e Charlie Kaufman (roteirista), a mesma do excelente "Quero Ser John Malkovich". Agora, contam a história de um roteirista que enlouquece ao receber a tarefa de adaptar um livro para o cinema.
O roteirista existe (é o próprio Kaufman, interpretado por Nicolas Cage), assim como o livro, "O Ladrão de Orquídeas", da jornalista Susan Orlean (interpretada por Meryl Streep), que conta a história de um irresistível anti-herói que se envolve com índios seminole para poder colher as cobiçadas orquídeas brancas sem ser importunado pela polícia.
Mais do que por sua qualidade, "Adaptação" vem envolto num burburinho por conta de um segredo de polichinelo. O roteiro é assinado em dupla, por Charlie Kaufman e um tal Donald Kaufman, que seria seu irmão gêmeo.
"Ter sido escrito por dois roteiristas quer dizer que o filme mistura ficção e realidade e que não se deve procurar saber até onde vai uma e onde começa a outra", disse Charlie à Folha, quando do lançamento do filme nos EUA. "Nossa intenção era deixar muitas perguntas por serem feitas."
Spike Jonze coloca lenha semelhante na fogueira, na mesma conversa: "É óbvio que queremos muito que as pessoas tentem descobrir e façam suas apostas, pois fizemos o filme torcendo para que ele iniciasse discussões e fosse o assunto de conversas, mas não vamos esclarecer nada".
A obra foi indicada a quatro Oscar: ator (Nicolas Cage), atriz coadjuvante (Meryl Streep), ator coadjuvante (Chris Cooper) e roteiro adaptado (Charlie Kaufman e Donald Kaufman). Se há alguma justiça no mundo, ou pelo menos na Academia, os dois últimos já estão no papo.
Cooper interpretou o vizinho ex-militar psicopata de "Beleza Americana", entre dezenas de outros papéis menos memoráveis mas igualmente bons. Ator sutil e versátil, está aqui em seu grande momento na carreira, como o tal ladrão de orquídeas.
Quanto aos roteiristas, as ironias são muitas. Primeiro, de uma vez por todas: Donald Kaufman não existe. É uma invenção da cabeça de Charlie, criado para ser o alter ego sem superego no filme e para resolver seu problema de adaptar o livro. Segundo, Hollywood teve de se curvar à maluquice de Charlie ao indicar os dois, já que ambos constam da ficha técnica como roteiristas. Terceiro, não há nada mais delicioso do que ver este filme concorrer justamente por roteiro "adaptado".
"Penso o tempo inteiro sobre a fronteira turva entre ficção e realidade", disse Charlie. "Mas não tomei a decisão de colocar isso no filme conscientemente. Foi uma intenção do inconsciente. Faz algum sentido? (risos)."
Faz.
Roteirista sofre bloqueio criativo em "Adaptação"
SÉRGIO DÁVILAda Folha de S.Paulo, em Nova York
De tempos em tempos, Hollywood produz uma obra de arte. É o reverso da regra de tentativa e erro, sendo o erro o filme bom. A mais recente é "Adaptação", que estréia hoje no Brasil, da jovem dupla Spike Jonze (diretor) e Charlie Kaufman (roteirista), a mesma do excelente "Quero Ser John Malkovich". Agora, contam a história de um roteirista que enlouquece ao receber a tarefa de adaptar um livro para o cinema.
O roteirista existe (é o próprio Kaufman, interpretado por Nicolas Cage), assim como o livro, "O Ladrão de Orquídeas", da jornalista Susan Orlean (interpretada por Meryl Streep), que conta a história de um irresistível anti-herói que se envolve com índios seminole para poder colher as cobiçadas orquídeas brancas sem ser importunado pela polícia.
Mais do que por sua qualidade, "Adaptação" vem envolto num burburinho por conta de um segredo de polichinelo. O roteiro é assinado em dupla, por Charlie Kaufman e um tal Donald Kaufman, que seria seu irmão gêmeo.
"Ter sido escrito por dois roteiristas quer dizer que o filme mistura ficção e realidade e que não se deve procurar saber até onde vai uma e onde começa a outra", disse Charlie à Folha, quando do lançamento do filme nos EUA. "Nossa intenção era deixar muitas perguntas por serem feitas."
Spike Jonze coloca lenha semelhante na fogueira, na mesma conversa: "É óbvio que queremos muito que as pessoas tentem descobrir e façam suas apostas, pois fizemos o filme torcendo para que ele iniciasse discussões e fosse o assunto de conversas, mas não vamos esclarecer nada".
A obra foi indicada a quatro Oscar: ator (Nicolas Cage), atriz coadjuvante (Meryl Streep), ator coadjuvante (Chris Cooper) e roteiro adaptado (Charlie Kaufman e Donald Kaufman). Se há alguma justiça no mundo, ou pelo menos na Academia, os dois últimos já estão no papo.
Cooper interpretou o vizinho ex-militar psicopata de "Beleza Americana", entre dezenas de outros papéis menos memoráveis mas igualmente bons. Ator sutil e versátil, está aqui em seu grande momento na carreira, como o tal ladrão de orquídeas.
Quanto aos roteiristas, as ironias são muitas. Primeiro, de uma vez por todas: Donald Kaufman não existe. É uma invenção da cabeça de Charlie, criado para ser o alter ego sem superego no filme e para resolver seu problema de adaptar o livro. Segundo, Hollywood teve de se curvar à maluquice de Charlie ao indicar os dois, já que ambos constam da ficha técnica como roteiristas. Terceiro, não há nada mais delicioso do que ver este filme concorrer justamente por roteiro "adaptado".
"Penso o tempo inteiro sobre a fronteira turva entre ficção e realidade", disse Charlie. "Mas não tomei a decisão de colocar isso no filme conscientemente. Foi uma intenção do inconsciente. Faz algum sentido? (risos)."
Faz.
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