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18/04/2003
-
06h36
da Folha de S.Paulo
O drama e paixão de Cristo carregado de distanciamento brechtiano. De forma involuntária ou não, o velho dramaturgo Bertolt Brecht (1898-1956) está no herói e no traidor. Jesus e Judas não saem das suas próprias peles. Cada qual com suas razões. "Aqui nego entrega o outro, meu irmão me entrega, é assim, sempre", sopra um dos viventes e atores. Ninguém é tão bonzinho, bem-aventurados os que não têm piedade.
"Via Sacra da Rocinha" é um espetáculo encenado, desde 1992, no meio do rebuliço da favela carioca, sempre no dia de hoje, a sexta-feira da Semana Santa. Com o mesmo título, a produtora Giros rodou documentário, que passa hoje no GNT. A direção é de Alexandre Montoro.
Não há mesmo piedade dos pobres coitados na fita. Nem imagens lindamente tratadas da miséria, esse pendor tão cristão e publicitário. Não é mesmo aquele baita documento -"oh, que fotografia, que tomada, que planos!". Nem pretende tal aura.
Mas podemos dizer assim: como esse Eduardo Coutinho, o de "Cabra Marcado para Morrer" e do "Edifício Master", faz bem para a rapaziada que se embrenha no perigoso mundo do documentário. É o macete, a empatia, de saber roubar a boa fala e a munganga, o gesto da narração afetiva.
"Via Sacra..." deixa os atores e viventes da Rocinha largarem o verbo. Nem carecia do antropólogo solitário explicando. Chega de decifrar as coisas. Os personagens são bons, deliram com atualização de parábolas bíblicas. Da bagunça de Cafarnaum para o caos do tráfico. Um rapaz que furtou comida em um supermercado da área é preso. Oportunidade para inflamar os sermões do diretor da peça, Aurélio Mesquita, o José Celso local, é bom que haja um Zé Celso em cada morro.
Mas nada de piedade. Um naco de compaixão, se muito. Os ensaios, na praia, deixam vazar, lá atrás, meninas de shortinhos. O drama das "cachorras". Do funk e de Cristo. Durante o calvário, o ônibus lotado não pára. Pressiona a multidão figurante. Depois que dão sumiço no "cara", como Jesus é tratado na intimidade, a farra é grande. Aleluia é isso aí.
Via Sacra da Rocinha
Onde: no canal GNT, hoje, às 21h
Cristo vive drama de rua sem vício da piedade
XICO SÁda Folha de S.Paulo
O drama e paixão de Cristo carregado de distanciamento brechtiano. De forma involuntária ou não, o velho dramaturgo Bertolt Brecht (1898-1956) está no herói e no traidor. Jesus e Judas não saem das suas próprias peles. Cada qual com suas razões. "Aqui nego entrega o outro, meu irmão me entrega, é assim, sempre", sopra um dos viventes e atores. Ninguém é tão bonzinho, bem-aventurados os que não têm piedade.
"Via Sacra da Rocinha" é um espetáculo encenado, desde 1992, no meio do rebuliço da favela carioca, sempre no dia de hoje, a sexta-feira da Semana Santa. Com o mesmo título, a produtora Giros rodou documentário, que passa hoje no GNT. A direção é de Alexandre Montoro.
Não há mesmo piedade dos pobres coitados na fita. Nem imagens lindamente tratadas da miséria, esse pendor tão cristão e publicitário. Não é mesmo aquele baita documento -"oh, que fotografia, que tomada, que planos!". Nem pretende tal aura.
Mas podemos dizer assim: como esse Eduardo Coutinho, o de "Cabra Marcado para Morrer" e do "Edifício Master", faz bem para a rapaziada que se embrenha no perigoso mundo do documentário. É o macete, a empatia, de saber roubar a boa fala e a munganga, o gesto da narração afetiva.
"Via Sacra..." deixa os atores e viventes da Rocinha largarem o verbo. Nem carecia do antropólogo solitário explicando. Chega de decifrar as coisas. Os personagens são bons, deliram com atualização de parábolas bíblicas. Da bagunça de Cafarnaum para o caos do tráfico. Um rapaz que furtou comida em um supermercado da área é preso. Oportunidade para inflamar os sermões do diretor da peça, Aurélio Mesquita, o José Celso local, é bom que haja um Zé Celso em cada morro.
Mas nada de piedade. Um naco de compaixão, se muito. Os ensaios, na praia, deixam vazar, lá atrás, meninas de shortinhos. O drama das "cachorras". Do funk e de Cristo. Durante o calvário, o ônibus lotado não pára. Pressiona a multidão figurante. Depois que dão sumiço no "cara", como Jesus é tratado na intimidade, a farra é grande. Aleluia é isso aí.
Via Sacra da Rocinha
Onde: no canal GNT, hoje, às 21h
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