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23/05/2003 - 09h00

Mercado questiona aplicação da lei antijabá

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
LAURA MATTOS

da Folha de S.Paulo

A proposta para criminalizar o jabá (execução paga de música em rádio e TV), apresentado ao Congresso anteontem, já traz à tona a seguinte questão ao mercado musical: uma lei será eficiente para coibir a prática no país?

O projeto, do deputado Fernando Ferro (PT-PE), propõe detenção de até dois anos a quem receber dinheiro para incluir uma música ou a apresentação de um artista na programação. Fala também em cassar a emissora responsável, sob o argumento de que é uma concessão pública e não pode negociar seu espaço (além do já reservado à publicidade).

Anteontem, a Folha publicou entrevista com André Midani (um dos principais presidentes de gravadoras no Brasil dos anos 60 aos anos 90), em que ele admitiu ter pagado jabá e explicitou a maneira como o esquema há anos domina o mercado musical.

Ele, que também foi executivo da gravadora Warner nos EUA, afirmou que a lei antijabá norte-americana, apesar de ter reduzido a prática, não conseguiu aboli-la.

"É melhor haver uma. Essa lei foi útil nos Estados Unidos durante uns dez anos. A coisa diminuiu muito. Evidentemente, com o passar do tempo, o ser humano é de tal qualidade que vai encontrando modos de lidar com a lei."

Em emissoras norte-americanas de rádio e TV, segundo ele, o jabá "não corre solto, corre escondido e organizado".

Marcelo de Carvalho, sócio e vice-presidente da Rede TV!, também acha a aplicação da lei "discutível". Ele disse, no entanto, que "o jabá é uma praga, vinda da indústria fonográfica, que ataca as TVs e as rádios".

Carvalho toca no fato de o projeto não enquadrar as gravadoras. "Os detidos deveriam ser tanto o "jabazista" (quem oferece) como o "jabazeiro" (quem aceita)."

Na opinião dele, se a lei fosse aprovada e aplicada, as "prisões logo contariam com a presença de apresentadores muito conhecidos, figurinhas incentivadoras do jabá nacional".

A TV Gazeta, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o projeto de lei foi entregue ao seu departamento jurídico, onde está sendo "apreciado e estudado", e que a tramitação da proposta será acompanhada "com interesse".

A Globo também afirmou que seu departamento jurídico analisará o texto. Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação, disse que na emissora "a escolha de músicas se baseia em critérios artísticos". "A preocupação é tamanha que a Som Livre [gravadora das Organizações Globo] nem dispõe de elenco próprio."

A Rede Bandeirantes, que engloba TV, rádios e gravadora, declarou que "recrimina a prática do jabá e acha que misturar conteúdo editorial musical com propaganda é enganar o público".

O SBT afirmou que não iria se pronunciar, e as outras principais emissoras, procuradas pela Folha, não haviam respondido até a conclusão desta edição.

O deputado Fernando Ferro considera a lei aplicável. "Quem ganha dinheiro com esse esquema sempre faz cortina de silêncio para abafar o debate. O projeto ao menos está abrindo a discussão."

Gravadoras e artistas

O presidente da Som Livre, João Araújo, disse que "o jabá acabará em breve, pois os custos das gravadoras e a redução dos mercados limitarão esse expediente no futuro. Quanto ao projeto, acho que não surtirá maiores efeitos, o que lastimo."

Procuradas para comentar o assunto, as gravadoras BMG, Sony, Universal, Warner, EMI e Trama não se pronunciaram até a manhã de ontem.

Segundo o presidente da Associação Brasileira de Música Independente, Pena Schmidt, "é preciso relembrar que disco é cultura, e não apenas uma questão fiscal".

Entre músicos, os poucos que se manifestaram se disseram favoráveis ao projeto de lei -casos de Lobão, Lulu Santos, Frejat, Edgard Scandurra e Leoni. Lulu está entre os que demonstram dúvida quanto à aplicabilidade. "A lei é bonita, mas vamos ver se pega."

O cantor disse que é preciso "se perguntar se [coibir o jabá] é mesmo possível". "O vazio que uma denúncia como a de Midani nos deixa é o de duvidar se aquilo dê em alguma mudança concreta."

Edgard Scandurra (da banda Ira!), declarou apoio à lei. "Se um radialista ganha um apartamento para dizer todos os dias que tal banda é o máximo, seus milhares de ouvintes também vão achar que a tal banda é realmente o máximo, sem saber que a verdadeira razão de sua opinião é a corrupção."

Leoni, ex-integrante do grupo Kid Abelha, diz que teve uma experiência recente com o jabá.

"No ano passado, quando lancei um CD independente, tentei montar uma equipe de divulgação, e a resposta que invariavelmente recebíamos era de que sem dinheiro para o jabá não dava nem para entrar nas rádios, que não havia conversa possível."


 

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