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24/05/2003 - 03h08

Escritora Naomi Klein faz remix de velhas obsessões

NELSON ASCHER
Colunista da Folha de S.Paulo, em Paris

Os fundadores do marxismo e de tudo aquilo que, até hoje, constitui grosso modo a "esquerda" não entendiam muito de economia, mas, colocando os fatores de ordem material ostensivamente no centro de suas preocupações, imitavam os economistas de verdade, da mesma maneira como os homeopatas fazem de conta que praticam a medicina.

Com isso, pelos menos admitiam que há uma realidade pragmática, incontornável, na qual pessoas reais têm necessidades como comer, vestir-se, morar em algum lugar etc. e, portanto, precisam em conjunto produzir tanto ou mais do que consomem.

Seus sucessores, porém, tão logo chegaram ao poder, esqueceram ou fizeram o possível para ignorar esses fatos elementares e os resultados, da União Soviética à China, de Cuba ao Camboja, são conhecidos.

Se o anticapitalismo militante era antigamente capitaneado pelos repetentes da faculdade de economia, há uns bons 50 anos ele começou a ser apropriado pelos matadores de aula dos cursos, primeiro, de sociologia, em seguida, de letras e artes plásticas e, finalmente, de filosofia.

Discurso

O resultado é que as poucas coisas a respeito das quais a velha esquerda não se havia equivocado, ou seja, a primazia do material e a importância das forças produtivas, foi inteiramente perdido de vista pela nova esquerda que, em seu lugar, dedicou sua atenção ao "discurso" (do poder, do capital, das corporações, da mídia) e, com a desculpa de analisá-lo, aliás, "desmascará-lo", vem multiplicando exponencialmente o seu próprio.

Nada do que a canadense Naomi Klein diz, seja em seu "Sem Logo", seja na revista americana "Nation" e no jornal inglês "The Guardian", não foi dito antes e, se não de modo mais convincente, seguramente com um estilo melhor.

Remix

O que se pode, generosamente, chamar de seu pensamento é um remix de certas obsessões da Escola de Frankfurt, particularmente na sua encarnação mais degradada, Herbert Marcuse, e do linguajar (mas, para sua sorte, não da sintaxe) de uma sucessão de acadêmicos franceses que vai de Foucault a Baudrillard, tudo isso ancorado num temário tipicamente norte-americano e, em parte, europeu ocidental (feminismo, minorias, multinacionais, ecologia, terceiromundismo, antiamericanismo, anticonsumismo), sustentado pela fé nas virtudes e no eventual poder de instituições e movimentos alternativos e embrulhado nos preceitos da correção política.

Naomi Klein tem, desta maneira, se mais nada, o mérito de resumir em si mesma o antiglobalismo do qual é uma das porta-vozes, pois a inversão (ou talvez incompreensão) de causa e efeito que se evidencia na sua relação de amor e ódio com as marcas de produtos aponta para as raízes mais sombrias desse movimento.

Estas se encontram na vertente irracionalista, reacionária e tecnófoba do romantismo europeu que, não acidentalmente, gerou outrora o fascismo e agora leva objetivamente os beneficiários mimados e improdutivos do progresso ocidental a se aliarem ao fundamentalismo islâmico.
 

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