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08/07/2003
-
03h59
da Folha de S.Paulo
Foi um festival de contradições, mesmo. Após quatro noites, o "Com:Tradição" terminou anteontem, em São Paulo, entre altos e baixos, acidentes e acertos, novidades e clichês.
O que de mais novo ali aconteceu veio dos encontros entre "novos" e "velhos". Em vez de burocracia, o tom geral que se imprimiu foi de permitir que artistas "com tradição" fossem absorvidos e assimilados pelos novos, trabalhassem a serviço do novo.
Era só ver a felicidade no semblante de Naná Vasconcelos, J.T. Meirelles (os dois tocaram com Mamelo Sound System e Instituto em um único, longo e emocionante tema de clima pop-jazz), Jards Macalé (com o Vulgue Tostoi), Maria Alcina (e Bojo), Elza Soares (e Mugomango).
São daqueles artistas que, tendo seu conhecimento deglutido por hip hop, música eletrônica e nova MPB, sentem-se honrados, nunca diminuídos ou violentados. Poucos artistas "antigos" são assim, o "Com:Tradição" teve o privilégio de reunir alguns deles.
O ponto alto foi a colisão Maria Alcina-Bojo. Ela se empenhou em entender a linguagem eletrônica do grupo, chegando ao requinte de uma criação coletiva na irada "Tarja Preta", de Wado (também escalado no festival). O Bojo, por sua vez, cedeu à alegria de Alcina e deixou de lado um mau humor meio estrutural, que deixa menos visíveis suas qualidades.
Caso à parte foi o adorado Arnaldo Baptista, que colocou o público (sempre ralo, em todas as sessões) à sua total disposição sendo ele mesmo, não pelo encontro com Moisés Santana. Cantou sem muita voz clássicos de "Lóki?" (74), mas o show mesmo ele deu ao piano, de arrepiar. Onde andava Rita Lee fora desse festival, oh, quanta saudade?
Se Moisés teve de enfrentar a grosseria do público (que pedia a entrada de Arnaldo enquanto ele fazia inteligente e vigorosa releitura de "Alegria", de Assis Valente), Arnaldo só tinha de piscar para ser elevado ao céu. O público era tradicional e conservador como nem os "antigos" queriam ser.
Ali estava a grande contradição. Rebeca Matta, Mim, Dona Zica, Curumin, Karine Alexandrino, Bonsucesso SambaClube, Beto Villares, Maurício Negão e BNegão têm o bastão, mas ainda não o domínio sobre o público.
Pode-se sempre culpar as gravadoras (que ignoram essas existências), as casas de shows (que não lhes oferecem cancha), as TVs (que não mostram essas imagens), as rádios (que não tocam --jabá, aliás, foi tema de uma debochada invenção tipo vanguarda paulista, pela banda Dona Zica).
Os apresentadores falastrões e o teatro antimusical arquitetado por Lina Bardi podem ser responsabilizados, também. Aquele era um festival para assistir de pé, não na assembléia do teatro maluco do Sesc Pompéia. Mas a distância não veio daí. Por falta de público, no terceiro dia metade da arena foi fechada. E tudo ficou igual.
Que tal então, por um momento, soltar mesmo o bastão aos artistas da nova contradição? Fazendo-o, teremos que reconhecer que falta presença de palco a essa nova geração. Mesmo os que a possuem (caso da maluquete Karine Alexandrino) pareciam pouco relaxados, talvez paralisados pela tensão de terem que estar ali.
Noutros casos, como os de Wado e Beto Villares, a incomunicabilidade era tanta que eles pareciam tocar num teatro sem público. E o público desinteressado e sem curiosidade parecia assistir a um não-show. Ali estava a crise, que é da nova MPB, e não da velha (que, no máximo, ajudou a criar as condições perversas de agora). Os novos querem seu lugar?
A "nova MPB" quer mesmo ocupar seu lugar ao sol?
PEDRO ALEXANDRE SANCHESda Folha de S.Paulo
Foi um festival de contradições, mesmo. Após quatro noites, o "Com:Tradição" terminou anteontem, em São Paulo, entre altos e baixos, acidentes e acertos, novidades e clichês.
O que de mais novo ali aconteceu veio dos encontros entre "novos" e "velhos". Em vez de burocracia, o tom geral que se imprimiu foi de permitir que artistas "com tradição" fossem absorvidos e assimilados pelos novos, trabalhassem a serviço do novo.
Era só ver a felicidade no semblante de Naná Vasconcelos, J.T. Meirelles (os dois tocaram com Mamelo Sound System e Instituto em um único, longo e emocionante tema de clima pop-jazz), Jards Macalé (com o Vulgue Tostoi), Maria Alcina (e Bojo), Elza Soares (e Mugomango).
São daqueles artistas que, tendo seu conhecimento deglutido por hip hop, música eletrônica e nova MPB, sentem-se honrados, nunca diminuídos ou violentados. Poucos artistas "antigos" são assim, o "Com:Tradição" teve o privilégio de reunir alguns deles.
O ponto alto foi a colisão Maria Alcina-Bojo. Ela se empenhou em entender a linguagem eletrônica do grupo, chegando ao requinte de uma criação coletiva na irada "Tarja Preta", de Wado (também escalado no festival). O Bojo, por sua vez, cedeu à alegria de Alcina e deixou de lado um mau humor meio estrutural, que deixa menos visíveis suas qualidades.
Caso à parte foi o adorado Arnaldo Baptista, que colocou o público (sempre ralo, em todas as sessões) à sua total disposição sendo ele mesmo, não pelo encontro com Moisés Santana. Cantou sem muita voz clássicos de "Lóki?" (74), mas o show mesmo ele deu ao piano, de arrepiar. Onde andava Rita Lee fora desse festival, oh, quanta saudade?
Se Moisés teve de enfrentar a grosseria do público (que pedia a entrada de Arnaldo enquanto ele fazia inteligente e vigorosa releitura de "Alegria", de Assis Valente), Arnaldo só tinha de piscar para ser elevado ao céu. O público era tradicional e conservador como nem os "antigos" queriam ser.
Ali estava a grande contradição. Rebeca Matta, Mim, Dona Zica, Curumin, Karine Alexandrino, Bonsucesso SambaClube, Beto Villares, Maurício Negão e BNegão têm o bastão, mas ainda não o domínio sobre o público.
Pode-se sempre culpar as gravadoras (que ignoram essas existências), as casas de shows (que não lhes oferecem cancha), as TVs (que não mostram essas imagens), as rádios (que não tocam --jabá, aliás, foi tema de uma debochada invenção tipo vanguarda paulista, pela banda Dona Zica).
Os apresentadores falastrões e o teatro antimusical arquitetado por Lina Bardi podem ser responsabilizados, também. Aquele era um festival para assistir de pé, não na assembléia do teatro maluco do Sesc Pompéia. Mas a distância não veio daí. Por falta de público, no terceiro dia metade da arena foi fechada. E tudo ficou igual.
Que tal então, por um momento, soltar mesmo o bastão aos artistas da nova contradição? Fazendo-o, teremos que reconhecer que falta presença de palco a essa nova geração. Mesmo os que a possuem (caso da maluquete Karine Alexandrino) pareciam pouco relaxados, talvez paralisados pela tensão de terem que estar ali.
Noutros casos, como os de Wado e Beto Villares, a incomunicabilidade era tanta que eles pareciam tocar num teatro sem público. E o público desinteressado e sem curiosidade parecia assistir a um não-show. Ali estava a crise, que é da nova MPB, e não da velha (que, no máximo, ajudou a criar as condições perversas de agora). Os novos querem seu lugar?
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