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28/07/2003 - 17h53

Crônica: Festival de Rio Preto, depois do aplauso

SERGIO SALVIA COELHO
crítico da Folha

O que pode fazer um crítico ao final de dez dias de festival? Com certeza não um alinhavo de resenhas, como se o todo fosse a soma de espetáculos avulsos. Uma apresentação é sempre única, confluência imprevisível de uma platéia e dos atores em exposição. Uma platéia de festival, no entanto, já vem plena de espetáculos anteriores, vistos ou praticados, e o fenômeno teatral, espectro que ronda a insônia crítica, transborda o aplauso final e se aprofunda noite adentro, enquanto acordados estiverem os artistas criadores.

Aí vai, portanto, uma crônica de uma noite do Festival, sob o trópico de Henry Miller, ofertado como suvenir para quem o viveu, e instigando a imaginação dos que virão.

Daquele Rio Preto de 2003 somente uma noite permanece na minha memória: a de segunda-feira. Pela primeira vez não-enquadrados pelo lugarNenhum, escoadouro único para a adrenalina cênica, que redundava infalivelmente em bate estaca lá pelas 3 da manhã, as tribos que deixavam os palcos vagavam à esmo, à beira do rio que dorme à meia-noite, segundo revela o grupo Lume.

Disse ao Hugo: o posto é o point. E ele imediatamente acatou. Foi então ali no posto, ao lado do hotel, entre as bombas 24 horas e o pequeno mercado de inconveniências que baixaram musas e pecadores. Nomes? Aos pecadores não se atribuem estrelas, e a crítica cala; às estrelas, porém, todos os pecados afloram.

No olimpo de mesas de plástico e cervejas em lata, Maíra, a ninfa húngara de Lins, transitava desenvolta entre parlapatões, vertigem e cemitério, fazendo Hugo discorrer sobre o código civil. Medéia ali por perto sorria da fragilidade do crítico, e, com a bravura das mulheres de Atenas, relevou polêmicas passadas e abriu novos horizontes ao exigir mais duras penas (havia prometido a meu amigo Tersites não citar mais o Chico Buarque, agora é tarde).

Patrícia, viajante da imaginação, fazia o respeitável público montar plantão no hotel, atrás da sua personagem, mas os consolava no desamparo, com a generosidade de uma elfa entre hobbits. Mas não, Tersites: as musas não cedem nem pelo cansaço, nem ficam abaixo da crítica; por uma alusão menos infame uma geração inteira já devolveu prêmios a outro jornal.

No começo da madrugada, portanto, Maíra, tão sábia quanto as outras, voltava para seu apartamento na companhia apenas de um macarrão instantâneo.

Esperamos Zé, que não viria naquele ano, mas no ano que vem, com certeza. Então vamos? Vamos. Às 6h, com Mário ao meu lado já virando Kerouac, no curto caminho para o hotel sentia esse Rio Preto correndo através de mim, como se o público ávido houvesse semeado já os espetáculos do ano que vem.

Criadas as raízes, hora de se arrancar, segundo as leis do grande circo místico de São José dos Festivais.

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