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16/08/2003 - 07h35

Ceticismo guia biografia de Chico Xavier

ARMANDO ANTENORE
free-lance para a Folha

"Escolha outro Chico, cara! O Buarque, o Anysio...". Foi assim, com sarcasmo, que colegas reagiram quando o repórter Marcel Souto Maior, 38, anunciou: "Vou me tornar biógrafo de Chico Xavier [1910-2002]".

Quase um deus para uma multidão de brasileiros, o líder espírita nunca gozou de prestígio dentro das redações. Rendia, no máximo, manchetes ruidosas, proporcionais à desconfiança que despertava. Charlatão, acusavam. Santo do pau oco.

Naquele ano, 1993, Souto Maior não pensava muito diferente. Ateu, jamais se aproximara do espiritismo e duvidava das façanhas de Chico. O personagem, entretanto, o intrigava --talvez porque, ainda menino, o jornalista brasiliense passasse férias em Araxá. A estância mineira fica perto de Uberaba, onde o médium morava desde 1959. "A fama dele me assombrou durante toda infância. Mal pisava em Araxá, ouvia histórias tenebrosas sobre "o sujeito que falava com almas do outro mundo"."

Resolveu biografá-lo para desmontar o mito. "Revelar como se constrói um ídolo do povo." O resultado está em "As Vidas de Chico Xavier", que a Planeta acaba de relançar. Os incrédulos, porém, podem botar as barbas de molho: o mito continua de pé. "Não encontrei nada que o desabonasse", diz. "E olhe que procurei à beça."

Publicado originalmente em 1994 pela Rocco, o volume retornou em 30/6, atualizado. Doze meses antes, Chico morria. Tinha 92 anos e se preparava para comemorar 75 de mediunidade.

Cerca de 15 biógrafos já esquadrinharam a trajetória do mulato franzino, filho de analfabetos, que nasceu em Pedro Leopoldo (MG) e psicografou 412 livros. A garimpagem de Souto Maior destaca-se como a única de cunho jornalístico. O repórter consultou arquivos da Biblioteca Nacional, no Rio, e conversou com 96 pessoas. Da lista, constam o barbeiro, o médico e os desafetos. O próprio Chico, que autorizou a pesquisa, enfrentou duas sessões de perguntas.

Familiares, no entanto, mostraram-se desgostosos. Julgam que trechos tomam o protagonista como homossexual. Souto Maior discorda: "Boatos recorrentes o associavam à homossexualidade. Não pude, por isso, deixar de investigar o tema. Mas concluí que Chico conservou-se casto. Enxergava mortos e os escutava o tempo inteiro. Você acha que conseguia ter sossego para transar?".

A biografia aborda a questão da vaidade. Por um lado, recusava bajulações. Humilde, chamava a si mesmo de "Cisco Xavier". Por outro lado, insistia em usar uma prosaica peruca. Disfarçava, esclarecendo que a adotara para proteger a cabeça da friagem. Depois, admitiu: a careca o incomodava e pretendia escondê-la.

No ponto que realmente importa, o da idoneidade de Chico, o jornalista é categórico: era homem íntegro. "Não extraiu proveito financeiro dos dons que dizia carregar. Vendeu 25 milhões de livros e morreu pobre. Comprovei que doou cada centavo às instituições kardecistas. Cumpriu com disciplina a meta que se impôs: difundir o espiritismo e as mensagens dos "desencarnados"."

O biógrafo relata que, enquanto produzia o livro, presenciou "fenômenos estranhos". "Coisas de arrepiar." Quando psicografava cartas de mortos, o médium narrava fatos que só a família do "remetente" conhecia. "Se persisto em meu ceticismo?", indaga-se Souto Maior. "Digamos que, hoje, duvido bem menos dos espíritos. Ou melhor: creio profundamente na fé de Chico. Ele acreditava que possuía uma missão, e tal crença o fez mover montanhas."

As Vidas de Chico Xavier
Autor: Marcel Souto Maior
Editora: Planeta
Quanto: R$ 28,60 (272 págs.)
 

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