Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
01/09/2000 - 04h39

Sergio Rezende mistura rusticidade e cinema fantástico

Publicidade

INÁCIO ARAUJO, da Folha de S.Paulo

No material de apresentação de "Quase Nada", o diretor Sergio Rezende explica o que tem sido até aqui seu trabalho, centrado sobretudo em biografias históricas: "Eu vinha buscando uma saída para este grande labirinto que é o Brasil. Pensava que, compreendendo o passado, conseguiríamos achar mais fácil a saída do labirinto".

A idéia não é descabida. O problema é que o passado de Rezende era só imitação do passado, uma espécie de carbono sem vida. Ora, todo o cinema, o moderno pelo menos, vai na direção contrária: o real não se encontra no ponto de partida -é irrelevante que Paulo Betti pareça com o capitão Lamarca, em "Lamarca", por exemplo. É algo que se revela (quando se revela) ao final.

Em "Quase Nada", Rezende renega esse cinema supostamente histórico, o dos lamarcas, mauás, Canudos, como a reconhecer que a compreensão do passado, ou do presente, começa em si mesmo.

O resultado de "Quase Nada" são três estranhos episódios referentes à inveja, ao medo e à traição. Como todo filme de episódios, o resultado é um tanto irregular. O primeiro diz respeito a um trabalhador de fazenda, João, alçado pelo patrão a capataz.

A promoção representa quase nada, do ponto de vista econômico, mas é o bastante para desencadear a inveja de seu compadre. O encanto da trama vem da desproporção entre o fato em si e a reação do compadre. No entanto, o episódio sofre de alguma timidez na mise-en-scène, que o impede de mergulhar no fenômeno mais profundamente.

No segundo episódio, referente ao medo, a história quase desaparece. Tudo gira em torno de um vaqueiro covarde e seu temor de que um velho desafeto reapareça para acertar contas. Também a mise-en-scène tende à abstração.

Estamos no sertão (mineiro, salvo erro), na plena rusticidade de paisagens e personagens. Ali, no entanto, Rezende introduz elementos do cinema fantástico -visões, estranhamento- e consegue chegar a uma formulação moderna, isto é, a um realismo que não se encontra no princípio (imitativo), mas no fim. Em vez do faz-de-conta acadêmico, trata-se de conduzir o espectador a um universo estranho e a, lá, encontrar algo de verdadeiro e de essencial nos personagens.

Rezende consegue ali, de resto, retratar escrupulosamente um mundo específico, extraindo dele consequências de interesse geral.

Se os dois primeiros episódios são marcados pela boa escolha de atores (Augusto Pompeo e Camilo Bevilacqua, no primeiro, Genezio Barros, Denise Weinberg, Chico Expedito), o terceiro se ressente da escolha de Caio Junqueira, ator muito leve para fazer o jardineiro Ernani, cujo ciúme da mulher determinará o trágico desfecho do episódio final.

Pode-se argumentar que, nos filmes anteriores, Rezende ao menos podia aspirar a um contato com o "grande público". É uma ilusão. A imagem sem imagem, puramente convencional, essa peste que a TV vulgarizou até o infinito, não precisa do cinema para existir.

Ou antes, se o cinema ainda tem um sentido no mundo, é precisamente o de se opor a ela. Rezende pode não acertar o tempo todo, pode agradar a poucos. Mas em "Quase Nada" é deste lado que se coloca. Boas vindas.

Quase Nada
Direção: Sergio Rezende Produção: Brasil, 2000
Com: Augusto Pompeo, Genezio Barros, Denise Weinberg
Quando: a partir de hoje nos cines Lumière, Jardim Sul, Espaço Unibanco e Villa-Lobos

Clique aqui para ler mais de Ilustrada na Folha Online

Discuta esta notícia nos Grupos de Discussão da Folha Online - uol.folha.ilustrada.cinema
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página