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01/10/2003 - 03h31

Suleiman relata paixão e perda do pai em "Intervenção Divina"

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SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo

"Sou um estrangeiro em todos os lugares, ou estou em casa em qualquer parte. Depende de como se encare", diz o cineasta palestino Elia Suleiman, 43.

Suleiman não vive mais em sua terra natal, "por razões que tenho certeza de que você compreende", diz, numa referência ao recrudescimento do conflito israelo-palestino. Aliás, a única menção que se permite fazer, na conversa com a Folha, anteontem, por telefone, de Beirute.

O diretor se divide hoje entre o Líbano, que o atrai "por razões pessoais", e a França, país que produz seus filmes. No último ano, porém, passou quase todo o tempo viajando pelo mundo, junto com o longa "Intervenção Divina", que será apresentado pela primeira vez no Brasil na próxima segunda, no Festival do Rio, com a presença do cineasta.

Hoje, a mostra exibe o anterior "Cyber Palestina", curta-metragem que Suleiman realizou em 1999. "Intervenção Divina" ganhou o prêmio do júri e o da crítica internacional no Festival de Cannes em 2002.

É um filme ficcional ou um depoimento rigorosamente autobiográfico, dependendo de como prefira encará-lo o espectador. "Comecei a escrever um roteiro que era completamente diferente [de 'Intervenção Divina']. A certa altura do trabalho, meu pai ficou doente, e eu me apaixonei. Passei a pensar numa outra direção para o filme, voltei para meu escritório e saiu o que você viu."

Nazaré

O que se vê é um homem (vivido pelo próprio Suleiman) às voltas com a doença do pai, que vive em Nazaré, e o envolvimento com uma bela mulher, moradora de Ramallah. A ação e os poucos diálogos se dão entre uma Jerusalém, cidade onde mora o protagonista, ocupada por soldados e sujeita aos "check points" (postos de controle de entrada e saída da cidade) e Nazaré.

"Num certo sentido, eu sou a estrutura narrativa do filme. O resto são quadros, que criei não com a intenção de passar uma mensagem, mas pensando na estética das imagens", diz. Um ponto-chave da "estrutura narrativa" é aquele em que o personagem/Suleiman reata com a amada.

Na sequência da manobra de reconquista, ele enche um balão vermelho em que se vê o rosto do líder palestino Iasser Arafat. É o vôo do balão, atravessando casas e templos, que finalmente liberará a passagem do casal no "check point" que os retinha.

Entre os "quadros" há o da luta de uma mulher palestina com um grupo de soldados. Eles combatem com armas de fogo. Ela, com pedras e outros símbolos da causa palestina. A maneira como Suleiman filma a disputa reserva surpresas (e provavelmente algumas risadas) ao espectador.

Embora "Intervenção Divina" tenha recebido o aplauso de Cannes, a crítica não deixou de observar que o cineasta adota um ponto de vista unilateral sobre o conflito no Oriente Médio.

Suleiman diz que sua escolha é própria de quem faz uma espécie de cinema "sincero e pessoal", o que, segundo ele, não deve conferir aos filmes o caráter de diários da realidade.

"Não sou jornalista, correspondente, analista, historiador. Sou um homem de cinema. O cinema toma muito tempo para ser feito. São anos para escrever e filmar. Não necessariamente, ele deve ter relação com os eventos cotidianos", afirma.

Mas, em seguida, pondera: "Apesar disso, um diretor pode ser, algumas vezes, alguém que pressente fatos, que sente coisas que estão para acontecer, alguém um pouco --desculpe-me a palavra presunçosa-- profético".

O diretor afirma que, quando escreveu o roteiro de seu filme "Intervenção Divina", "obviamente não tinha nada a ver com a Intifada [revolta palestina iniciada em 2000, após o fracasso de tentativas de um acordo de paz com Israel], que aconteceu três anos mais tarde".

Risco

Na semana passada, Suleiman começou a desenvolver um novo projeto de filme. Ele estima que levará um ano para ter o roteiro terminado. Em seu modo de trabalho, não cabe ter a aprovação do público como meta.

"Se você começa pensando no que o público gostaria de ver, na minha opinião, parte de uma presunção muito arrogante, que é saber o que o público quer. Não se pode começar dessa maneira."

Continua Suleiman: "O único modo é ir fundo em você. Descobrir o mais íntimo e sincero que deseja retratar sobre sua vida, ou o mundo em torno de você, com a esperança de que isso alivie também o espectador".

O diretor diz que atingir a sinceridade no cinema é muito mais difícil do que a platéia imagina.

"Em geral, as pessoas acham que a linha entre ser sincero e ser mentiroso é muito tênue. Acredito que ser sincero é a coisa mais difícil, porque você precisa afastar muitas mentiras de sua vida emocional ou livrar-se de uma maneira auto-hipócrita de viver. É dificílimo chegar a um momento puro de verdade dentro de você", afirma.

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