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28/10/2003 - 06h48

Filme documenta "esquizofrenia cultural" mexicana

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FRANCESCA ANGIOLILLO
free-lance para a Folha

"O filme conta a história de uma mulher rarámuri. Não se incomodem se não sabem quem são; no México eles também são desconhecidos." Foi assim que Mercedes Moncada abriu a primeira sessão de seu filme, "La Pasión de María Elena" --longa de estréia dessa hispano-nicaraguense de 31 anos-- na 27ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Visto o filme, que tem hoje sua última exibição no festival e é um dos três documentários na disputa pelo prêmio do júri, entende-se que a frase diz mais do que parece. Ao contar a trajetória de uma mulher indígena em busca de justiça pela morte do filho, atropelado por uma mulher branca, Moncada aponta para um problema de fundo da sociedade mexicana: o choque entre a cultura nativa e a do conquistador e a negação da primeira pela segunda.

A existência dos tarahumaras --como são (um pouco) mais conhecidos os rarámuris-- ou de qualquer dos povos indígenas que compõem 10% da população do México é incômoda para uma sociedade que se quer branca e contemporânea. Uma verdadeira "esquizofrenia cultural", opina Mercedes Moncada, em entrevista à Folha.

Graduada em sociologia, Mercedes Moncada mudou-se para o México (onde viveu até este ano) no início da década de 90, trabalhando em uma organização não-governamental para o desenvolvimento de comunidades rurais no sul do país.

O interesse pelos grupos indígenas da América Latina, que já a acompanhava desde a faculdade, se intensificou pela experiência; foi natural que ela se inclinasse à questão dos povos nativos quando resolveu, em 2001, realizar seu primeiro filme.

Desde 1996, ela já tinha uma carreira de produtora, alternativa (resgatada entre desejos remotos da infância de fazer cinema) encontrada para evitar sua mudança para a Guatemala, como pretendia a ONG. Dentro do amplo espectro de temas possíveis, foi bem específica: queria enquadrar "casos de conflito de identidade cultural deflagrados pela Justiça".

Dos julgamentos tradicionais indígenas, interessava-lhe mais o rarámuri, que conhecia melhor. Rumou, então, a Chihuahua, onde fica a chamada serra Tarahumara, à procura de seu objeto de estudo. Com María Elena Durán Morales, teve a "empatia" necessária.

Dos três meses de filmagem, divididos em três viagens --entre julho de 2001 e janeiro de 2003-- resultou um filme de estrutura circular, girando ao redor de um eixo: a tentativa de retorno de María Elena à comunidade que a considerara, em certa medida, responsável da morte do filho. O que María Elena pretendia não era a prisão da motorista, mas a sua própria despenalização, que só poderia vir da admissão de culpa da acusada.

Assim, o caso passa por dois julgamentos: o rarámuri e o da Justiça branca, com resultados diferentes, que prolongaram a via-crúcis da mulher indígena em busca da paz interior e do direito de criar o segundo filho em meio à sua cultura.

Dividido por subtítulos vindos da língua rarámuri e conduzido pela excelente fotografia de Javier Morón --que imprime um tom quase onírico às imagens contrastantes da serra e da cidade de Chihuahua--, o documentário se encaminha para um final surpreendente em que se comprova a hipótese inicial de que partiu Moncada: "A recondução de María Elena à comunidade por meio da justiça". Nem que tenha sido, como pontua a cineasta, "justiça divina".

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