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31/10/2003 - 08h24

Espirais de Egoyan quase se perdem do eixo

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PEDRO BUTCHER
crítico da Folha

Nas dependências de um aeroporto, um jovem chamado Raffi (David Alpay) é interrogado por um policial (Christopher Plummer). Raffi trouxe de sua viagem algumas latas lacradas, que, segundo ele, não podem ser abertas sob pena de velar o negativo. Perderiam-se imagens preciosas, cenas complementares de um filme que reconstitui um episódio tão trágico quanto polêmico: o massacre de mais de 1 milhão de armênios pelo Exército turco, em 1915. Massacre que, segundo os turcos, jamais ocorreu.

David, o policial, não acredita em Raffi. Suspeita que a versão do "negativo" é uma história falsa, inventada para encobrir transporte de drogas. Ele estabelece com o rapaz um longo diálogo. Não tem pressa. É seu último dia de trabalho antes da aposentadoria, e tem todo o tempo do mundo para ouvir sua história.

Aos diálogos no aeroporto intercalam-se outras situações, todas elas relacionadas à produção do épico histórico, uma superprodução que está sendo dirigida pelo cineasta de origem armênia Edward Saroyan (Charles Aznavour). Além da história do próprio Raffi, que se envolveu com o filme quando sua mãe (Arsinée Khanjian) foi chamada para dar consultoria ao roteiro, há ainda os dilemas de um ator turco chamado para viver o vilão no filme; os ciúmes da namorada de Raffi da intensa relação que ele tem com a mãe ou, ainda, a história narrada em flashback do pintor Arshile Gorky, sobrevivente do massacre que representou a tragédia em suas pinturas e se suicidou.

É estranha a estrutura de "Ararat" (o nome do filme refere-se à montanha onde aconteceu o massacre armênio). É como se Atom Egoyan (de "Exótica" e "O Doce Amanhã"), ele mesmo um cineasta de origem armênia, precisasse dar voltas para chegar à verdade. Não uma verdade simples (o massacre ocorreu, os turcos mentem), mas uma verdade intrinsecamente ligada à sua versão. São várias versões, aliás, que formam o tecido do filme, que no fim chega à sua "verdade" particular.

Nem sempre, no entanto, Egoyan é feliz ao tecer essa estrutura em espiral, rocambolesca. Para falar de um episódio histórico, Egoyan discute a própria possibilidade de fazer um filme histórico, o que para ele, claramente, é uma tarefa impossível. Esse, certamente, é um dos pontos interessantes do filme. Mas às vezes ele parece fugir demais do eixo, como na exagerada história da relação edipiana de Raffi e sua mãe e nos dilemas do jovem, cujo pai morreu em uma ação terrorista. Nada disso interessa muito no contexto.

Por sorte, o próprio eixo da história --o longo diálogo entre Raffi e o policial-- é forte o suficiente para não deixar o interesse se apagar. Aos poucos, esse diálogo vai desvelando também a história daquele homem velho, à véspera de se aposentar. E de quebra revelam, ainda, como Christopher Plummer (mais conhecido por "A Noviça Rebelde") é um grande ator. Uma gratíssima surpresa do capitão Von Trapp.

Avaliação:

Ararat
Produção:
Canadá/França, 2002
Direção: Atom Egoyan
Com: David Alpay, Charles Aznavour, Eric Bogosian
Quando: a partir de hoje nos cines Cineclube DirecTV, Espaço Unibanco, Frei Caneca Unibanco Arteplex, Sala UOL de Cinema
 

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