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25/11/2003 - 03h30

Recine revela os cortes da tesoura federal

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MÁRVIO DOS ANJOS
da Folha de S.Paulo, no Rio

Hoje e amanhã, "o país sem memória" vai poder se lembrar até das cenas que não conseguiu ver. O Arquivo Nacional promove no Rio a Recine 2003, mostra de cinema de arquivo que vai destacar a produção cinematográfica censurada durante o regime militar.

No jardim interno do belo conjunto neoclássico do órgão, serão exibidos "Cortes da Censura Federal" hoje, e "ABC da Greve", de Leon Hirzsman (1938-87) amanhã, sempre às 19h30. Hoje haverá também dois debates, às 14h e às 16h, sobre cinema e censura.

"Cortes" foi montado pelo próprio Arquivo Nacional a partir de um fato curioso: várias latas contendo fragmentos de filmes censurados ficaram por vários anos nas dependências da Polícia Federal em Brasília, sem que se soubesse exatamente o que eram.

O cheiro de vinagre, causado pela deterioração do acetato das películas, acabou forçando a transferência para o Arquivo Nacional, primeiro em Brasília e depois no Rio, onde finalmente foi descoberto seu valor histórico.

Os trechos de longas, curtas, e até de anúncios de TV foram compilados e editados na Coordenação de Documentos Audiovisuais e Cartográficos do órgão, sob chefia de Clovis Molinari Jr. Entremeados com reproduções dos pareceres sobre as cenas, o resultado, muitas vezes divertido, dá uma panorâmica sobre como funcionava a censura, segundo Molinari.

"É famosa a história de um censor que bateu na porta de um teatro chamando Sófocles de subversivo", diz Molinari. "Muitas vezes os cortes são coisas que hoje nós percebemos como bobagens, pelo distanciamento histórico. E, se havia tanta preocupação com essas bobagens, podemos ter uma idéia de como o regime era frágil."

Entre as "bobagens", Molinari aponta os cortes de cunho moralista, que proibiam expressões como "rabo gostoso", no trailer de "O Jogo da Vida" (1977), de Maurice Capovilla, e até abusos críticos, como o caso de "Luciana, a Comerciária" (75), de Mozart Cintra, cortado por ter "baixo nível técnico" e pelo "ridículo das atuações", escreve o censor.

Há sucessos como "A Dama do Lotação" (78), de Neville de Almeida, e "Menino do Rio" (82), de Antonio Calmon, que perdeu uma cena em que personagens fumavam um cigarrinho "que não é o convencional", diz o parecer.

Ao longo do filme, porém, as "bobagens" dão lugar aos cortes feitos em documentários de enfoque mais político, como "Restos" (75), de José Batista Moraes de Andrade, e "Veias Abertas" (75), de Luiz Arnaldo Campos.

"Nossa idéia é partir do mais light, do mais divertido, para encaminharmos o público para o clima de "ABC da Greve'", diz Molinari. O filme de Leon Hirzsman, praticamente inédito no Brasil, narra a luta do movimento sindical no ABC paulista, tendo como líder Luís Inácio Lula da Silva.

"Estamos devolvendo ao público algo que ele foi impedido de ver, para que possa tirar suas próprias conclusões", diz Molinari, afirmando que os filmes devem ganhar uma mostra itinerante gratuita em salas pelo Brasil.

RECINE 2003. Exibição de filmes, debates e exposição sobre a censura na produção audiovisual. Hoje: debates (às 14h e às 16h) e exibição de "Cortes da Censura Federal" (às 19h30). Amanhã: "ABC da Greve", de Leon Hirszman (às 19h30). Onde: Jardim Interno - Arquivo Nacional (pça da República, 173, Centro, Rio de Janeiro). Entrada Franca. Informações: 0/xx/21/3806-6166.
 

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