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01/03/2004 - 09h24

Burman confirma êxito do cinema argentino com prêmio em Berlim

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SYLVIA COLOMBO
da Folha de S.Paulo

O urso ele trouxe na mão. Com medo de perdê-lo, decidiu não despachá-lo junto com a bagagem. E foi assim, abraçado a um ursinho, que Daniel Burman, 30, regressou a Buenos Aires. O filme deste jovem diretor argentino, "El Abrazo Partido" (o abraço partido) foi a grande surpresa da competição da 54ª edição do festival de cinema de Berlim, no último dia 15, ao levar dois Ursos de Prata entre os prêmios mais importantes (melhor filme pelo júri e melhor ator), fazendo, ainda, com que cineastas badalados como Eric Rohmer e Ken Loach saíssem da Alemanha de mãos vazias.

Assim como o filme anterior de Burman exibido no Brasil, "Esperando o Messias" (2000), "El Abrazo Partido" tem o bairro portenho do Once, onde vivem os judeus, como cenário. O protagonista, Ariel, é interpretado pelo mesmo ator, o uruguaio Daniel Hendler. Desta vez, ele encarna um jovem que trabalha com a mãe numa galeria cheia de imigrantes, enquanto tenta reconstruir a figura do pai. Burman, que é judeu, se baseou em sua experiência pessoal no bairro.

"El Abrazo Partido", que estréia na Argentina em abril, foi vendido para a Europa, Israel e Brasil, onde deve ser exibido no segundo semestre. Seu filme anterior, "Todas las Azafatas Van al Cielo" (todas as aeromoças vão para o céu, 2001) foi comprado pela Buena Vista, mas ainda não tem uma data de estréia prevista aqui.

O prêmio em Berlim reforça a trajetória de sucesso que o cinema argentino tem desenhado no exterior. O estilo de Burman tem vários pontos em comum com os de outros cineastas do chamado novo cinema argentino. São filmes de baixo orçamento, com um olhar voltado a questões familiares e próprias da classe média argentina e que têm a crise econômica e política que se desencadeou no país depois da queda de Fernando De La Rúa, em 2001, como ponto de partida para refletir sobre as transformações da psique dessa sociedade.

Burman se destacou inicialmente ao produzir "Garage Olimpo" (1999), do diretor Marco Bechis --que marcou o início da retomada da produção argentina, narrando um romance entre um torturador e uma "desaparecida" no regime militar. Também foi o produtor na Argentina do mais recente filme de Walter Salles, "Diários de Motocicleta".

Foi em sua produtora, em Buenos Aires, que o cineasta recebeu a Folha de S.Paulo para uma entrevista.

Folha de S.Paulo - Você se preocupou com o fato de seu filme tratar de uma questão judaica, ao mostrá-lo num festival na Alemanha?

Daniel Burman - Me causou uma sensação de estranhamento positiva a maneira como as coisas se deram. Tenho 30 anos. Há 50, ou seja, menos que o dobro de minha vida, um sujeito como eu, só por existir, seria morto na Alemanha. E não é que hoje me colocam num hotel cinco estrelas, num terno, me dão de comer, me premiam, me levam numa limousine e, o que é mais incrível, a ninguém lá ocorreu me perguntar como eu me sentia por ser um diretor judeu com um filme sobre judeus em um festival em Berlim.

Folha de S.Paulo - Em "Esperando ao Messias" você já falava da busca de identidade de um garoto judeu na Argentina de hoje. Há um diálogo entre os dois filmes?

Burman - Este é uma comédia e "Esperando ao Messias" era um filme sombrio. Mas há um diálogo, um jogo. Tentei fazer algo com o mesmo pano de fundo, mas de uma maneira mais espirituosa.

Me interessa contar os grandes dramas, como a morte, a ausência, mas convertidos em algo cotidiano, esse momento em que o que existe de dramático se desvanece em coisas simples.

Folha de S.Paulo - Entre "Esperando o Messias" e "El Abrazo Partido", houve a comédia "Todas las Azafatas Van al Cielo". Como ela nasceu?

Burman - Quis explorar a idéia de um encontro de duas pessoas que, por diferentes motivos, chegam ao limite de suas vidas em um lugar limite, como é Ushuaia, e constróem uma relação baseada no desespero. Foi uma tentativa de contar que não somente o amor perfeito é cinematográfico, mas que amores intermediários nos ajudam a sobreviver.

Folha de S.Paulo - O que há em comum entre você e os outros diretores do chamado novo cinema argentino?

Burman - Muitas coisas. Não tanto no que diz respeito ao estilo ou à estética, mas no modo e nas razões pelas quais fazemos cinema. Optamos por certa liberdade, até porque gastamos pouco, que dá aos filmes ligeireza e nos permite vôos sentimentais que não vejo em outras cinematografias.
 

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