Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
23/03/2004 - 19h35

Festival de Curitiba se diferencia por ser dirigido ao público

Publicidade

JANAINA FIDALGO
enviada especial a Curitiba

Um festival dirigido ao público --não aos artistas-- e com produções predominantemente nacionais. Este é o princípio que fez o Festival de Teatro de Curitiba chegar onde chegou e ser o que é hoje: o principal evento de artes cênicas do país.

Para o diretor-geral do Festival de Teatro de Curitiba, Victor Aronis, 42, em nenhum festival de teatro há tantos grupos brasileiros e tão diferentes como no de Curitiba, cuja 13ª edição termina neste domingo (28).

"O Festival de Teatro de Curitiba é um festival de teatro nacional. No início, quando foi criado, houve vários encontros e organizadores de festivais solicitando que o festival fosse internacionalizado para fazermos um circuito. Fomos contra porque um circuito acaba com a característica de cada um. Se torna tudo igual", diz Aronis.

Com público estimado em 100 mil pessoas por edição, pelo menos 10% do público vem de fora de Curitiba (PR). As pesquisas feitas periodicamente para traçar o perfil dos espectadores do festival mostram que o público é jovem --tem entre 18 e 35 anos, segundo o diretor-geral-- e constituído principalmente por mulheres (57%).

Outra curiosidade sobre o evento é sua característica de iniciar/agregar espectadores nas artes cênicas. De 10% a 20% são pessoas que vão pela primeira vez ao teatro.

E o começar não se restringe apenas à platéia. Muitos grupos de teatro ainda desconhecidos do grande público ganham espaço e visibilidade com as apresentações no Fringe (mostra paralela).

"O Fringe alavancou carreiras como aconteceu com 'Hysteria' [do Grupo XIX de Teatro] e mesmo o Felipe Hirsch, em 'A Vida é Cheia de Som e Fúria'", afirma Aronis.

Leia trechos da entrevista concedida à Folha Online:

Folha Online - Após treze edições do festival, qual é o panorama do teatro em Curitiba hoje?

Victor Aronis -
Hoje a situação é bem diferente. Curitiba tem peças de teatro a semana inteira. Bastante produções e as peças de outros Estados vêm com freqüência, mas mesmo assim alguns diretores continuam vindo somente no festival.

Folha Online - Por quê?

Aronis -
São produções mais caras, sem apoio nem patrocínio. É difícil recuperar o dinheiro em alguma viagem. São espetáculos mais complicados de montar, com maior infra-estrutura, muita gente no elenco e muita carga. Isso é inviável economicamente para que eles fiquem se deslocando de um local para outro. São peças que ficam nos seus Estados e que podem estar em Curitiba somente no festival.

Folha Online - Ao que se deve a grande participação de peças do eixo Rio-SP na Mostra de Teatro Contemporâneo?

Aronis -
Rio e São Paulo ainda são os dois lugares onde há a maior produção de teatro do país. Fazendo uma mostra de teatro brasileiro, como é o caso do Festival de Teatro de Curitiba, lógico que o local que mais produz teatro vai ocupar a maior parte da programação. Curitiba produz, mas não tem escala como São Paulo. Aumentou bastante [a participação curitibana], mais no Fringe, porque são grupos que estão iniciando, do que na Mostra Contemporânea.

Folha Online - Qual o critério para a seleção dos espetáculos que fazem parte da Mostra Contemporânea?

Aronis -
Quais são os critérios da Mostra Contemporânea? Nenhum, na verdade. É livre. Uma das coisas que não abrimos mão nestes treze anos é o fato de o espetáculo ser inédito em Curitiba. Esse é o único critério, mas claro que os curadores procuram espetáculos que sejam representativos ou importantes no cenário nacional. Aí você tem uma mescla dos que já foram apresentados e outros que vão ser estréia nacional.

Folha Online - O que o sr. já assistiu nesta edição?

Aronis -
Até agora assisti a quatro espetáculos: "Sonhos de Einstein" [Cláudio Baltar], "Fausto Zero" [Gabriel Vilella], "O Que Diz Molero" [Aderbal Freire-Filho] e "100" [Christopher Heimann]. São bons espetáculos. Acho que a estréia do Gabriel [Vilella], do "Fausto", uma estréia muito bacana. Um trabalho bem legal, uma maneira diferente de contar a história do Fausto. O "100" me surpreendeu cenograficamente --eles fazem todo o cenário somente com vara de bambu. É um espetáculo internacional e próximo. Não é uma mensagem distante.

Folha Online - Foram os que o sr. mais gostou?

Aronis -
Sim, esses dois. "Sonhos de Einstein" eu já tinha assistido no ano passado, no Rio de Janeiro. Acho que cumpre a função. Foi um dos espetáculos que mais sessões extras abriu --fez duas sessões extras por dia.

Folha Online - Ao que o sr. atribui a importância que o festival tem hoje no cenário nacional?

Aronis -
Curitiba achou desde o início o seu caminho. É um festival diferente com objetivo diferente. É dirigido ao público, ao espectador. Não é um festival dirigido aos artistas. Não é que os artistas sejam mal tratados no Festival de Curitiba [risos]. Mas o objetivo não é o intercâmbio explícito destes artistas. Não é que um artista assiste a outro artista e isso basta para que o festival se realize. No Festival de Teatro de Curitiba o artista está no palco, o público na platéia e é esse o objetivo: agradar e atender às necessidades do público. A imprensa que vem maciçamente ao festival e não freqüenta desta maneira os outros festivais. Os outros, muitos deles, acabam se copiando. Quer dizer, a mesma programação que está em um está no outro.

Folha Online - Como acontece com as mostras de cinema de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília?

Aronis -
Exatamente. São parecidas. No momento que você tem um mesmo espetáculo sendo visto em Belo Horizonte e depois em Porto Alegre e em Recife, as pessoas não precisam se deslocar. Esse festival se restringe a essa cidade. No FTC, não. Em nenhum festival de teatro você vai encontrar tantos grupos brasileiros e tão diferentes. É mais representativo. O Festival de Teatro de Curitiba é um festival de teatro nacional. No início, quando foi criado, houve vários encontros e organizadores de festivais solicitando que o festival fosse internacionalizado para fazermos um circuito. Fomos contra porque um circuito de festivais acaba com a característica de cada um. Se torna tudo igual.

Folha Online - Quanto à participação do público, o sr. acredita que o festival seja uma porta de entrada para o "mundo das arte cênicas"?

Aronis -
É uma porta de entrada para o público sim. Muitas pessoas se "inicializam" no teatro através do festival. Ele hoje atrai a atenção de muita gente. Você tem uma campanha enorme de mídia --não que seja o nosso objetivo--, mas tem muita gente querendo fazer parte deste evento. Hoje, depois de 13 anos, estamos muito mais autorizando parcerias do que buscando. As pessoas perceberam que o evento é importante. Aí volta àquela coisa inicial. Não é importante somente para os artistas. É importante para o público, para as empresas, para os restaurantes... Economicamente passa a ser importante.

Folha Online - Qual é o perfil do público do Festival de Teatro de Curitiba?

Aronis -
É jovem, de 18 a 35 anos, e na maioria feminino --cerca de 57%. Faixa de renda A e B. De 10% a 20% são espectadores que vão pela primeira vez ao teatro.

Folha Online - O Fringe, por sua grandiosidade, ajuda a aproximar o público?

Aronis -
Na verdade, as peças do Fringe acabam envolvendo a cidade porque há mais espetáculos e maior abrangência. De alguma maneira, quem quiser pode ser afetado pelo festival e quem não quiser também é afetado pela transformação da cidade.

Folha Online - O Fringe é um trampolim para quem está começando?

Aronis -
É uma feira. Tem de tudo. Desde a barraquinha que é a primeira vez que aparece até o Nelson de Sá, com "4.48 Psicose", que traz atores como Luciana Vendramini. E ainda o ator que faz o Sambarilove [David Pinheiro, que atuou em "Escolinha do Professor Raimundo"]. Isso é bacana.

O Fringe é inspirado em Edimburgo, mas antes nós fizemos uma feira de negócios. Aproveitando que havia muita gente aqui --produtores, atores e diretores--, havia a possibilidade de mostrar o trabalho através de fitas. O Fringe é uma evolução disso. É uma feira de negócios ao vivo.

Nós tínhamos oito espetáculos no começo, depois 35 e hoje são 140. Quando passamos da marca dos cem muita gente apostou na falta de público. Os jornais diziam que os grupos estavam perdidos por que quem iria assistir? Foi uma aposta que graças a Deus perderam. Teve e tem público. Claro que uns mais que os outros, mas assim é a vida e assim é em seus lugares de origem. Há concorrência e as pessoas vão naquilo que se identificam.

Folha Online - Mas no fringe é mais uma aposta que uma escolha consciente...

Aronis -
Tudo é uma aposta.

Folha Online - Mesmo na Mostra Contemporânea?
Aronis -
Pode ser que sim, pode ser que não. Eu já vi na Mostra Contemporânea grandes desastres. Grandes estréias que eram horrorosas. Bom diretor, bom texto, bons atores e o resultado é horroroso. Não garante e ainda bem que não garante. Você tem uma série de espetáculos sendo lançados no eixo Rio-SP, uns vão fazer sucesso, uns vão agradar o público e os outros não. Vão sair de cartaz mais cedo.

Folha Online - E uma peça do Fringe pode...

Aronis -
Pode estourar. O Fringe alavancou carreiras como aconteceu com "Hysteria" [Grupo XIX de Teatro] e mesmo o Felipe Hirsch, em "A Vida é Cheia de Som e Fúria", que foi resultado do Fringe. Agora, Felipe Hirsch também participou da Mostra Contemporânea com dois espetáculos que passaram despercebidos. A graça da arte é que não tem fórmula. Como eu falei, bom ator, bom diretor e bom texto não produzem necessariamente bom resultado. Ainda bem porque seria muito chato. Se o Gabriel Vilella fizesse sempre um sucesso, que coisa chata!

Folha Online - Qual é o panorama do teatro hoje no Brasil?

Aronis -
Os grupos de teatro vêm novamente ganhando espaço, mais do que essas produções esporádicas que se juntam. Há um espaço bem grande para o teatro de grupo. Acho que isso vai gerar resultados mais para frente porque há continuidade de trabalho, pesquisa maior, entrosamento... Essas leis de incentivo, principalmente em São Paulo e no Rio, estão estimulando o trabalho dos grupos.

Folha Online - Qual grupo o sr. destacaria hoje?

Aronis -
O Grupo Galpão, de Belo Horizonte, se estabilizou completamente através desses patrocínios da Petrobras. Já era um grupo importante e por ter patrocínio constante e não ter preocupação financeira, de sobrevivência, o grupo pode melhorar, fazer mais pesquisa e ter repertório. A falta de dinheiro faz você fazer qualquer coisa para sobreviver.

Folha Online - E para o festival, como é a oferta de patrocínios?

Aronis -
Patrocínio é complicado. O festival chegou em um ponto... Ele é caro, então os patrocínios são altos.

Folha Online - Dá para falar em números?

Aronis -
O festival tem um orçamento de R$ 1,8 milhão. Não é qualquer empresa que pode patrocinar porque as cotas são altas. O objetivo do festival sempre foi dar visibilidade aos patrocinadores. Não temos a pulverização de patrocínios. Temos poucos para que eles possam ter retorno. Então, se o patrocinador nos dá uma cota de R$ 500 mil, o nosso retorno em publicidade e imagem chega a mais de R$ 1 milhão.

A repórter Janaina Fidalgo viaja a convite da organização do 13º Festival de Teatro de Curitiba

Especial
  • Confira o que acontece no Festival de Teatro de Curitiba
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página