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09/04/2004
-
08h53
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Folha de S.Paulo
Após a estréia em 2002 com um álbum todo dedicado à obra de Paulinho da Viola, Teresa Cristina, 36, vive agora sua hora da verdade.
É tempo de se apresentar como compositora, não mais apenas como a cantora sambista tímida e precisa de dois anos atrás.
"A Vida me Fez Assim", segundo disco de Teresa com seu Grupo Semente, vai sem sede ao pote. Oito faixas são de punho próprio (com ou sem parceiros), as demais pertencem ao domínio dos clássicos do samba.
Apaixonada pelos sambistas da antiga, Teresa canta Zé da Zilda (a divertida "Um Calo de Estimação"), Silas de Oliveira ("Na Água do Rio"), Zé Keti e Elton Medeiros ("Sorri"), Manacé ("Quantas Lágrimas"), Candeia ("Viver"), Wilson Moreira e Nei Lopes ("Peito Sangrando") etc.
Quando canta a si própria, faz a lição, soando como discípula daqueles nomes todos, notadamente de Paulinho da Viola.
O terreno, portanto, é o da tradição, de poesia de versos mansos, como a de "Acalanto" ("em todo samba que faço/ tem espaço, eu ponho o mar").
É o litoral do samba, mas aí há o contraponto, que é um dos dados intrigantes da obra ainda menina de Teresa Cristina.
Como autora, ela tende a soar interiorana, a parecer caipira ("A Borboleta e o Passarinho"), a pesquisar as origens de seus pais, nos sambas de roda do interior da Bahia. Indo mais fundo e mais longe, visita origens de cativeiro, do passado escravo de sua linhagem.
"Pedro e Tereza" insinua um vínculo sexual entre negro escravo e sinhazinha branca, com toda a dor que isso pudesse implicar.
"Se negro soubesse o talento que ele tem/ não aturava desaforo de ninguém", condensa "Pedro e Tereza", citando escravidão, crítica velada ao imaginário de Gilberto Freyre, canto baiano de terreiro e reivindicação de igualdade e dignidade.
O grupo miscigenado de Teresa transforma dor em festa, fazendo o ouvinte de "Pedro e Tereza" se sentir na fazenda, no interior fundo do Brasil.
O significado do samba, nesse momento, se dissocia de futilidades de Carnaval e de leis de Gerson ou malandros afins.
Teresa Cristina chegou tímida, tímida ainda está. Mas a altivez --de sambista, mulher, negra, compositora etc.-- é o ponto de ganho de "A Vida me Fez Assim". Deve vir mais por aí.
A Vida me Fez Assim
Avaliação:
Artistas: Teresa Cristina e Grupo Semente
Lançamento: Deckdisc
Quanto: R$ 30, em média
Teresa Cristina dosa timidez e altivez em "A Vida me Fez Assim"
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da Folha de S.Paulo
Após a estréia em 2002 com um álbum todo dedicado à obra de Paulinho da Viola, Teresa Cristina, 36, vive agora sua hora da verdade.
É tempo de se apresentar como compositora, não mais apenas como a cantora sambista tímida e precisa de dois anos atrás.
"A Vida me Fez Assim", segundo disco de Teresa com seu Grupo Semente, vai sem sede ao pote. Oito faixas são de punho próprio (com ou sem parceiros), as demais pertencem ao domínio dos clássicos do samba.
Apaixonada pelos sambistas da antiga, Teresa canta Zé da Zilda (a divertida "Um Calo de Estimação"), Silas de Oliveira ("Na Água do Rio"), Zé Keti e Elton Medeiros ("Sorri"), Manacé ("Quantas Lágrimas"), Candeia ("Viver"), Wilson Moreira e Nei Lopes ("Peito Sangrando") etc.
Quando canta a si própria, faz a lição, soando como discípula daqueles nomes todos, notadamente de Paulinho da Viola.
O terreno, portanto, é o da tradição, de poesia de versos mansos, como a de "Acalanto" ("em todo samba que faço/ tem espaço, eu ponho o mar").
É o litoral do samba, mas aí há o contraponto, que é um dos dados intrigantes da obra ainda menina de Teresa Cristina.
Como autora, ela tende a soar interiorana, a parecer caipira ("A Borboleta e o Passarinho"), a pesquisar as origens de seus pais, nos sambas de roda do interior da Bahia. Indo mais fundo e mais longe, visita origens de cativeiro, do passado escravo de sua linhagem.
"Pedro e Tereza" insinua um vínculo sexual entre negro escravo e sinhazinha branca, com toda a dor que isso pudesse implicar.
"Se negro soubesse o talento que ele tem/ não aturava desaforo de ninguém", condensa "Pedro e Tereza", citando escravidão, crítica velada ao imaginário de Gilberto Freyre, canto baiano de terreiro e reivindicação de igualdade e dignidade.
O grupo miscigenado de Teresa transforma dor em festa, fazendo o ouvinte de "Pedro e Tereza" se sentir na fazenda, no interior fundo do Brasil.
O significado do samba, nesse momento, se dissocia de futilidades de Carnaval e de leis de Gerson ou malandros afins.
Teresa Cristina chegou tímida, tímida ainda está. Mas a altivez --de sambista, mulher, negra, compositora etc.-- é o ponto de ganho de "A Vida me Fez Assim". Deve vir mais por aí.
A Vida me Fez Assim
Avaliação:
Artistas: Teresa Cristina e Grupo Semente
Lançamento: Deckdisc
Quanto: R$ 30, em média
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