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05/05/2004 - 03h30

Padre abusa de garoto em "O Santo Parto"

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MARCELO RUBENS PAIVA
articulista da Folha

Tem cheiro de polêmica no ar. E das fortes: pedofilia, anacronismo da igreja, sincretismo, escravidão e um jovem padre, José, que abusa sexualmente de um menino de 15 anos, um metaleiro evangélico, numa noitada de chá de cogumelo, e fica grávido. Sim, grávido.

Um cardeal de 250 anos, fundador do templo em que o padre congrega, ressuscita para infernizá-lo. São Jorge aparece e sugere fazer o parto com sua espada: "Minha boa santa Paulina, talvez eu não consiga abrir aquela barriga. Como parir sem vagina?".

Revela-se, depois, que são Jorge é cover de Elvis. Essa é a trama da comédia "O Santo Parto", do dramaturgo e autor de novelas Lauro César Muniz, 66, que estréia no dia 10 de junho, feriado de Corpus Christi, no teatro do Leblon (Rio).

A peça é produzida por sua filha, Fernanda Muniz, 37. No elenco, José de Abreu, Roberto Bomtempo e Sérgio Maroni. A direção ficará a cargo de Luiz Arthur Nunes ("Arlequim").

"Quando li, não acreditei e pensei: 'Será que, com a idade, o Lauro César Muniz ficou maluco?'", conta Abreu, ator que fará o cardeal de 250 anos.

"A peça vai mexer numa feridinha, naquela coisa arcaica da igreja, homossexualismo e drogas. Vamos brincar de fazer teatro de verdade, com uma peça que fala de algo para valer", diz Fernanda. "A data da estréia é uma coincidência, mas sabemos que provoca. Outra coincidência: o espetáculo demorou nove meses para fechar o elenco."

O custo da produção é de R$ 250 mil. "Ligamos para várias empresas, mas não fechamos nenhum patrocínio. A equipe está topando fazer por um custo mais baixo", completa Fernanda.

"O Santo Parto" começa com o padre em trabalho de parto na sacristia de uma igreja, após rezar uma missa. Ele fala pelo telefone: "Pedi que viesse à missa, você não veio. Eu estou torturado pela dor. Está bem grande, cada vez maior, cresce, cresce e parece não parar de crescer. Tem o tamanho maior que uma abóbora. Eu disse que precisava de você. Você me abandonou. Eu preciso de um médico. Não! Não vou à Santa Casa!".

O autor é de família católica, freqüentou a igreja na infância, mas nunca foi praticante. "Vai dividir. Quanto aos católicos, acho que haverá uma adesão, porque defende a igreja progressista, apesar da forma fantástica. Fica clara uma postura simpática à Teologia da Libertação. Não espero unanimidade. Não tenho unanimidade nem dentro de mim", diz Muniz.

Segundo o autor, houve um retrocesso grande a partir do papa João Paulo 2º: "Deixa-me intrigado o anacronismo da igreja. Como um poder tão grande pode estar tão fora da realidade? Há um descompasso entre o pensamento da igreja e a realidade".

"Sempre me atraiu a igreja, mas nada que me levasse à fé. Acho que, depois da idade, a gente fica mais corajoso. Está na hora de expor meu ponto de vista. Vou ter muitos seguidores com essa peça." Depois de "O Santo Milagroso", sua peça de estréia em 1963 (leia texto ao lado), Muniz quis retomar a discussão de forma mais contundente. Recentes denúncias de pedofilia deram o empurrão de que precisava.

O enredo surgiu quando ele pensou no padre grávido. "Comecei a pesquisar o assunto, li muita coisa a respeito do erotismo da igreja. São Jorge faz uma ligação com o sincretismo da umbanda, é um dos santos mais venerados, aquilo em que o povo acredita, mas foi cassado. Ele é o padroeiro de Madre Paulina, a primeira santa do Brasil", afirma.

E explica: "Do outro lado, o cardeal fundador daquela freguesia representa o pensamento reacionário, ultraconservador, que, no seu tempo, há 250 anos, tinha escravos negros e abusava sexualmente das escravas. E Elvis é a raiz da música contemporânea".
 

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