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18/05/2004
-
03h36
SÉRGIO DÁVILA
Enviado especial a Cannes
Cannes assistiu ontem de manhã às primeiras cenas filmadas de iraquianos sendo submetidos a humilhações por soldados norte-americanos --até agora, a imprensa mundial só teve acesso a fotografias, mas não imagens em movimento, dos maus-tratos que aconteceram no período que se seguiu à invasão dos EUA. As cenas, de poucos minutos, fazem parte do novo documentário de Michael Moore, "Fahrenheit 9/ 11", que participa da competição do festival de cinema francês.
O polêmico diretor e ativista norte-americano não quis especificar como obteve as imagens nem a exata data e locação em que elas foram feitas no Iraque, mas disse se tratar de material conseguido por um jornalista americano free-lancer que estava "embutido" (jornalistas autorizados pelo Pentágono a viajar com as tropas). Pela semelhança do local e dos uniformes, as imagens lembram as fotos já publicadas, colocando o Departamento de Defesa dos EUA e seu secretário, Donald Rumsfeld, sob pesadas críticas.
Numa das cenas, um soldado posa ao lado de um preso encapuzado enquanto outro tira fotos dos dois. Na outra, mais perturbadora, vários soldados se revezam para fingir que tocam a lona que cobre o corpo de um iraquiano idoso, que teve uma ereção enquanto dormia. "Quando resolvemos incluir o Iraque no filme, entramos em contato com diversas equipes que tinham feito imagens naquele país, mas não encontraram receptividade na grande mídia", disse Moore.
"Fahrenheit 9/11", que faz trocadilho em seu título com o filme de François Truffaut de 1966, "Fahrenheit 451" --por sua vez baseado no livro homônimo de Ray Bradbury, de 1951, sobre uma sociedade do futuro que baniu os livros--, é um panfleto contra o governo George W. Bush, a maneira com que lidou com os ataques de 11 de Setembro, antes e depois, os motivos que o levaram a invadir o Iraque e as relações da família do presidente americano com a de Osama Bin Laden.
Na entrevista de ontem, Moore disse que republicanos ligados a Bush haviam telefonado para a Icon, produtora de Mel Gibson que bancou "Fahrenheit" em seu início, em 2002, e dito que, se o ator continuasse produzindo o filme, "poderia esquecer de ser convidado para a Casa Branca por um bom tempo". Ao jornal "Los Angeles Times", a empresa negou qualquer pressão do governo.
O certo é que, antes mesmo de ser mostrado pela primeira vez ao publico, "Fahrenheit" já vinha envolto em polêmicas. Há duas semanas, a Disney, proprietária da Miramax, que produziu o filme, disse que não mais o distribuiria. Seu executivo-chefe, Michael Eisner, afirmou que não queria a empresa metida em lançamentos políticos num ano de eleição. Moore disse que foi censurado.
E o que, afinal, mostra o filme?
Nada que a imprensa já não tenha mostrado, descontando as cenas da tortura e diversos depoimentos de soldados americanos no Iraque descontentes com Bush e Rumsfeld, que o americano médio ainda não viu na TV. Só que "Fahrenheit" tem o mérito de juntar todos os desmandos e atitudes suspeitas do governo Bush --a começar da "eleição" de 2000-- num pacote atraente, bem editado, embora esse pacote seja parcial e às vezes distorça fatos.
Moore não omite de que lado está. Suas principais fontes são deputados democratas e, na entrevista, apesar de dizer que não é filiado, referiu-se ao Partido Democrata como "o nosso lado". Disse que luta para que o filme estréie antes da eleição de 2 de novembro, pois acha que pode influenciá-la e quer evitar que Bush seja reeleito --ou "eleito", como afirmou ironicamente.
O filme cresce quando Michael Moore está sendo mais Michael Moore. Por exemplo, quando ouve de um deputado que a maioria de seus colegas que aprovaram a Lei Patriótica, que amplia os poderes do governo à custa de liberdades individuais já conquistadas, não leu o projeto na íntegra. Pois o cineasta aluga um carro de sorveteiro e fica rodando o Congresso recitando a lei em voz alta pelos alto-falantes do veículo.
Mas, paradoxo, o filme perde quando Moore está sendo mais Michael Moore. Caso da cena que rivaliza em apelação e constrangimento com a da fotografia da menina vítima de uma arma ilegal sendo depositada na casa do ator Charlton Heston em "Tiros em Columbine". É quando ele leva a mãe de vários soldados que acaba de perder seu filho no Iraque para chorar na frente da Casa Branca.
Diretor Michael Moore exibe maus-tratos no Iraque
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Enviado especial a Cannes
Cannes assistiu ontem de manhã às primeiras cenas filmadas de iraquianos sendo submetidos a humilhações por soldados norte-americanos --até agora, a imprensa mundial só teve acesso a fotografias, mas não imagens em movimento, dos maus-tratos que aconteceram no período que se seguiu à invasão dos EUA. As cenas, de poucos minutos, fazem parte do novo documentário de Michael Moore, "Fahrenheit 9/ 11", que participa da competição do festival de cinema francês.
O polêmico diretor e ativista norte-americano não quis especificar como obteve as imagens nem a exata data e locação em que elas foram feitas no Iraque, mas disse se tratar de material conseguido por um jornalista americano free-lancer que estava "embutido" (jornalistas autorizados pelo Pentágono a viajar com as tropas). Pela semelhança do local e dos uniformes, as imagens lembram as fotos já publicadas, colocando o Departamento de Defesa dos EUA e seu secretário, Donald Rumsfeld, sob pesadas críticas.
Numa das cenas, um soldado posa ao lado de um preso encapuzado enquanto outro tira fotos dos dois. Na outra, mais perturbadora, vários soldados se revezam para fingir que tocam a lona que cobre o corpo de um iraquiano idoso, que teve uma ereção enquanto dormia. "Quando resolvemos incluir o Iraque no filme, entramos em contato com diversas equipes que tinham feito imagens naquele país, mas não encontraram receptividade na grande mídia", disse Moore.
"Fahrenheit 9/11", que faz trocadilho em seu título com o filme de François Truffaut de 1966, "Fahrenheit 451" --por sua vez baseado no livro homônimo de Ray Bradbury, de 1951, sobre uma sociedade do futuro que baniu os livros--, é um panfleto contra o governo George W. Bush, a maneira com que lidou com os ataques de 11 de Setembro, antes e depois, os motivos que o levaram a invadir o Iraque e as relações da família do presidente americano com a de Osama Bin Laden.
Na entrevista de ontem, Moore disse que republicanos ligados a Bush haviam telefonado para a Icon, produtora de Mel Gibson que bancou "Fahrenheit" em seu início, em 2002, e dito que, se o ator continuasse produzindo o filme, "poderia esquecer de ser convidado para a Casa Branca por um bom tempo". Ao jornal "Los Angeles Times", a empresa negou qualquer pressão do governo.
O certo é que, antes mesmo de ser mostrado pela primeira vez ao publico, "Fahrenheit" já vinha envolto em polêmicas. Há duas semanas, a Disney, proprietária da Miramax, que produziu o filme, disse que não mais o distribuiria. Seu executivo-chefe, Michael Eisner, afirmou que não queria a empresa metida em lançamentos políticos num ano de eleição. Moore disse que foi censurado.
E o que, afinal, mostra o filme?
Nada que a imprensa já não tenha mostrado, descontando as cenas da tortura e diversos depoimentos de soldados americanos no Iraque descontentes com Bush e Rumsfeld, que o americano médio ainda não viu na TV. Só que "Fahrenheit" tem o mérito de juntar todos os desmandos e atitudes suspeitas do governo Bush --a começar da "eleição" de 2000-- num pacote atraente, bem editado, embora esse pacote seja parcial e às vezes distorça fatos.
Moore não omite de que lado está. Suas principais fontes são deputados democratas e, na entrevista, apesar de dizer que não é filiado, referiu-se ao Partido Democrata como "o nosso lado". Disse que luta para que o filme estréie antes da eleição de 2 de novembro, pois acha que pode influenciá-la e quer evitar que Bush seja reeleito --ou "eleito", como afirmou ironicamente.
O filme cresce quando Michael Moore está sendo mais Michael Moore. Por exemplo, quando ouve de um deputado que a maioria de seus colegas que aprovaram a Lei Patriótica, que amplia os poderes do governo à custa de liberdades individuais já conquistadas, não leu o projeto na íntegra. Pois o cineasta aluga um carro de sorveteiro e fica rodando o Congresso recitando a lei em voz alta pelos alto-falantes do veículo.
Mas, paradoxo, o filme perde quando Moore está sendo mais Michael Moore. Caso da cena que rivaliza em apelação e constrangimento com a da fotografia da menina vítima de uma arma ilegal sendo depositada na casa do ator Charlton Heston em "Tiros em Columbine". É quando ele leva a mãe de vários soldados que acaba de perder seu filho no Iraque para chorar na frente da Casa Branca.
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