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17/06/2004 - 02h45

Uísque perde seu reinado dentro da boemia carioca

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LUIZ FERNANDO VIANNA
da Folha de S.Paulo, no Rio

Com o fechamento do Florentino, no último domingo, a noite carioca deu mais um chute no "cachorro engarrafado". Assim chamado por Vinicius de Moraes, que exaltava seu companheirismo, o uísque não passa, hoje, de um coadjuvante na boemia do Rio de Janeiro.

O primeiro baque veio na década de 1990, com o fechamento do Antonio's, bar do Leblon onde, nos anos 70, fartas doses eram consumidas por artistas como Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Chico Buarque, Rubem Braga, Fernando Sabino e inúmeros outros --o Florentino, aliás, foi criado há 25 anos depois de uma desavença entre os sócios do Antonio's, tendo o espanhol Florentino Prieto Graña resolvido criar seu próprio bar.

Nos anos seguintes, lugares em que o uísque tinha status, como o Real Grandeza, o Luna e o Bozó, também acabaram. Freqüentado por Agildo Ribeiro, Lúcio Mauro, Chico Caruso e sobrenomes tradicionais da "high society" carioca, o Florentino era visto como o último grande símbolo dessa boemia à moda antiga.

"Uísque tem cara de Frank Sinatra, Humphrey Bogart, bossa nova, Beco das Garrafas. É uma outra época, um outro estilo", diz o escritor Antônio Torres, 63, que foi cliente assíduo do Antonio's e do Florentino.

"O Florentino ficou um pouco estigmatizado como coisa de gente da antiga. Jovens não se sentiam tão à vontade lá quanto nos novos bares que existem ali perto. O barulho venceu a boa conversa", completa Torres, referindo-se às casas vizinhas que, lotadas de jovens e sons barulhentos, transformaram o Florentino numa ilha da velha boemia na rua General San Martin, no Leblon.

Lembrados por Torres, Sinatra tinha uma voz "de terceiro uísque", como se dizia, e Bogart é autor de uma famosa frase: "A humanidade está sempre três uísques atrasada". Os astros americanos são de uma época em que as coisas fluíam um pouco mais lentamente, como uma dose de uísque. Para o tempo frenético de hoje, a cerveja e o chope parecem mais adequados.

"A noite carioca está muito mais freqüentada por jovens do que no passado", diz Paulo Moraes, 57, para explicar por que decidiu fechar o Florentino, de onde era o único dono desde 1993. "Houve diminuição da clientela e das despesas per capita. Não estava compensando mantê-lo com aquela variedade de bebidas e o custo que ele tinha."

Moraes pretende abrir em Itaipava, na região serrana do Rio, um Florentino igual ao que fechou no Leblon. "A minha clientela, que são as pessoas de mais idade, estão lá", diz.

No lugar do original será aberto o Jiló, um bar feito por Moraes em associação com a cadeia Informal para atrair um público mais jovem, mais afeito ao chope, mais interessado em uma bebida que custa em torno de R$ 2 --uma dose de uísque oito anos saía por R$ 9 no Florentino.

"Quem bebe uísque não bebe uma dose, bebe várias. Fica caro, as pessoas estão duras. É melhor pagar R$ 60 por uma garrafa e beber em casa", analisa o cartunista Jaguar, 71. É o que o produtor, humorista e boêmio histórico Miéle tem feito. Como os bares têm fechado, ele costuma se encontrar com amigos em apartamentos. Cada um leva uma garrafa de uísque, um pianista é contratado, e os velhos tempos são recuperados. Como simulacro, mas são.
 

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