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19/07/2004 - 18h07

Expedição de grupo de teatro chega ao Acre

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IVAN DELMANTO
especial para a Folha Online

Depois de passar por Rondônia, a expedição do Teatro da Vertigem chegou ao Acre. Para o grupo, a capital Rio Branco é a imagem do projeto urbano da modernidade. Acompanhe:

Quinta-feira, 15/7/2004 e sexta-feira, 16/7/2004: Rio Branco

Enfim, chegada ao Acre. Caminhando por Rio Branco, as impressões são as de uma cidade moderna, com largas avenidas de asfalto perfeito, com praças bonitas cheias de árvores bem verdes, com monumentos e museus preservando sua memória.

Para quem caminha um pouco mais, há, no limite da região central, um portal. Este portal é formado pela praça da Bandeira, um aglomerado de pequenas lojinhas amontoadas em galerias à beira do mau cheiro do rio. Para quem caminha por estas galerias são passagens para uma outra cidade, a cidade verdadeira, que habita para além das fachadas bem cuidadas. A cidade sem escolas e com péssimos postos de saúde, a cidade das casas de madeira capenga, sem saneamento básico, com esgoto à céu aberto.

Rio Branco é, mais do que a utopia sofisticada de Brasília, imagem perfeita do projeto urbano da modernidade que, desde as modificações que Haussman empreendeu em Paris, insiste na beleza das superfícies, adequação do tecido da cidade aos padrões de sedução da mercadoria.

As fachadas de Rio Branco

A avenida mais antiga da cidade foi restaurada e seus prédios antigos tiveram suas fachadas rejuvenescidas. A luz noturna permite transpor suas fachadas: nas bonitas casinhas, carcomidas por dentro, funcionam botecos sem higiene e um decadente prostíbulo.

Esse transpor das fachadas é o caminho de nossa pesquisa em Rio Branco. Depois da morte de Chico Mendes, o Acre se tornou um importante ponto de turismo social, cercado por inúmeros projetos de organismos internacionais sedentos por lavar seu dinheiro. Para atrair estes investimentos, o governo de Jorge Viana se autodenominou "governo da floresta", cunhando diversas estratégias de marketing para divulgar (ou vender) a imagem do Estado.

O símbolo do "governo da floresta" é a castanheira, árvore que marcou o movimento dos seringueiros por representar a união popular (a castanheira só sobrevive quando cercada por outras inúmeras espécies). A castanheira, esvaziada do seu antigo sentido subversivo, simboliza agora o projeto de desenvolvimento, conduzido por latifundiários e empresas nacionais e multinacionais, que têm como carro chefe a consolidação da indústria madeireira no Estado.

O mesmo processo de apropriação indébita conduz as iniciativas de preservação da memória acreana. Os monumentos, museus e homenagens infinitas estão fincados sobre uma visão oficialesca e deturpada da história. Frases como "o povo acreano lutou para ser brasileiro" ou o culto à personalidade do general Plácido de Castro (líder do Exército brasileiro na guerra contra a Bolívia), escondem a luta sanguinária, levada a cabo pelos interesses dos seringalistas e donos de terra, que terminou com a tomada de antigos territórios bolivianos, que hoje formam o Acre.

Tal processo de engodo nacionalista, esconde que a chamada Revolução Acreana não existiu, que, ao final da guerra com a Bolívia, não houve nenhuma modificação na estrutura de dominação presente na região. O marketing histórico esconde que o que houve foi apenas uma guerra imperialista de conquista. Perceber, ao transpor passagens escondidas e esquecidas, o que vive além das fachadas, mais do que interesse histórico, é perceber o que é o Acre hoje.

Ivan Delmanto é pesquisador e coordenador teórico e de dramaturgismo do projeto Vertigem BR3, do Teatro da Vertigem. Escreve periodicamente um 'Diário de Viagem' para a Folha Online, narrando a experiência do grupo pelo interior do Brasil

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