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24/07/2004 - 04h52

Escritor Sérgio Sant'Anna coroa "paraíso astral" com Jabuti

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CASSIANO ELEK MACHADO
da Folha de S.Paulo

Em uma semana, Sérgio Sant'Anna foi chamado de "um clássico da língua portuguesa" no jornal lisboeta "Público". Outra semana e se tornou uma das sensações da Festa Literária Internacional de Parati (Flip), colocando até Machado de Assis "em xeque". Algumas voltas da Terra em torno de seu eixo de rotação a mais e seu último livro apareceu na lista dos mais cotados ao Prêmio Portugal Telecom. Na última quarta, o mesmo "O Vôo da Madrugada" (Companhia das Letras) consolidou o "paraíso astral" do escritor.

Sua literatura rápida laçou uma tartaruga. Ele ganhou o Prêmio Jabuti de melhor livro de contos, quarta estatueta de quelônio para as estantes de seu apartamento nas Laranjeiras, Rio de Janeiro.

Sem conseguir escrever, em meio a essas e outras tantas histórias, Sant'Anna, 63, teve seu cotidiano interrompido ainda por algumas perguntas da Folha. Em entrevista por e-mail, comentou as "críticas" a Machado de Assis ("transformá-lo no único grande autor brasileiro é de um triste passadismo"), criticou a forma como a imprensa (Folha incluída) imprimiu trechos de seu debate com Luiz Vilela na Flip e explicou por que escolheu a prosa breve (categoria na qual divide a pole position nacional com Dalton Trevisan e outros poucos). Leia trechos a seguir.

Folha - Uma das declarações mais polêmicas da Flip foi a sua, sobre seu cansaço com alguns aspectos de Machado de Assis. O mediador do evento provocou, dizendo que a imprensa cravaria que sua fala foi "Machado é um saco". E a idéia se espalhou. Machado é um saco?
Sérgio Sant'Anna -
Jamais diria isso com tanta deselegância: "Machado é um saco". Quem sou eu para falar mal de Machado? Equivaleria a falar mal da própria inteligência. Falei que estava cansado de reler Machado, da santificação da ironia machadiana. Paradoxalmente, já apontaram várias vezes em obras minhas um tom machadiano. Aconteceu agora mesmo, em Portugal, no jornal "Público". Na mesma crítica disseram que sou um clássico da língua portuguesa. Fiquei perplexo. Sempre tive veleidades experimentalistas. E fui para a Flip com uma intenção provocadora, anti-clássica, bem pós-machadiana.

Folha - Você errou no tom?
Sant'Anna -
Muita gente se espantou, mas quem estava lá entendeu bem o que eu queria dizer. O erro no tom foi da imprensa, já que não disse "Machado é um chato" e muito menos "um saco", embora seus primeiros livros...

Além de penetrar fundo na alma humana, Machado pode ser até muito divertido em seus romances. E grande parte dos seus contos é extraordinária. Mas daí a transformá-lo no único grande autor brasileiro é de um triste passadismo. Tratava-se, então, de dessacralizá-lo na Flip.

Folha - Outra fala sua que levantou poeira na Flip foi a de que hoje só "zapeava livros". Até que ponto era uma declaração pessoal da sua falta de paciência para enfrentar os livros que são lançados, até que ponto você apontava a saturação do nosso mercado editorial?
Sant'Anna -
Percebi recentemente que há muito ando lendo trechos de romances. Da mesma forma que na TV vejo trechos de filmes, pulo de um para outro, isso tem acontecido com livros.

Acho que, seja em romance seja em contos, o autor deve se ater ao essencial. Para não parar no meio de um calhamaço, o autor tem de me convencer. Acontece muito de eu pegar um romance e perceber lá pela metade que o livro já está lido no que me interessa.

Quanto aos contemporâneos, o problema é, sim, excesso de oferta. Todos têm direito de publicar, só que a balança autor/leitor está desequilibrada para os primeiros.

Folha - A sua opção por escrever mais narrativas breves do que longas está ligada de alguma forma a uma percepção de que os leitores preferem também coisas curtas?
Sant'Anna -
Tenho dificuldades para escrever romances, histórias que se desenrolam num espaço de tempo maior, com muitos personagens. É uma limitação minha. E escrevo com muita angústia.

Mas, em defesa da prosa breve, quero dizer que me agrada muito o tensionamento da linguagem. Literatura para mim é arte, não é só contar histórias para distrair. E o conto é um campo fértil para esse tipo de atitude.

Folha - Enquanto na Inglaterra e nos EUA fazem sucesso obras de mais de 600 páginas, no Brasil os autores mais celebrados escrevem na bitola curta: de Dalton Trevisan a Lygia Fagundes Telles. Somos uma literatura de fôlego curto?
Sant'Anna -
Dalton Trevisan é um dos maiores escritores do país e o mais conciso. João Gilberto Noll faz romances muito breves e é também dos maiores.

Não acho que no Brasil há uma tradição de fôlego curto. O que há, creio, é uma maior vitalidade das narrativas curtas. Mesmo Guimarães Rosa era mais contista. E os contos de Clarice eram ótimos.

Folha - Você é um escritor muito querido pelos mais jovens. Já fez prefácios e orelhas para Ronaldo Bressane e Nelson de Oliveira, entre outros. Você consegue ver esses autores como uma "geração"?
Sant'Anna -
Autores como Bressane, Joca Reiners Terron, Mirisola, Chico Mendes, Marcelino Freire podem ser definidos como geração por terem uma atitude comum de irreverência, desrespeito aos cânones. Desde a década de 70 algo assim não acontecia.

Especial
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