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29/07/2004 - 06h28

João Donato comemora aniversário com artistas de hip hop

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PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Folha de S.Paulo

No próximo dia 17 ele completa 70 anos, e é mais moço que um menino. João Donato, sumidade da invenção bossa-novista e papa do "barato total" dos anos 70, começa a comemorar já neste fim de semana, no Sesc Vila Mariana.

Será explorada uma de suas grandes peculiaridades: o poder de atração que exerce sobre músicos mais jovens de várias extrações. A fatia mais pop da obra do artista acreano virá somada a participações em hip hop (Marcelo D2), drum'n'bass (DJ Patife), MPB eletrônica (Otto, Marcelinho da Lua), soul (Léo Maia, filho de Tim)...

Em entrevista por telefone, do Rio, o pianista, tecladista e cantor bissexto, que tem nada menos que sete discos prontos ou em fase de conclusão, fala sobre seu aniversário, sobre a recente parceria bêbada com Marcelo D2 em gravação ainda inédita do "Acústico MTV", sobre gaiolas abertas, sobre o balanço das horas.

Folha - O que fica diferente quando a gente faz 70 anos?
João Donato -
Especialmente, nada. A gente só vai ficando mais experiente, melhorando. Vou ganhar do ministro Gilberto Gil um diploma de honra ao mérito ou coisa assim, não sei direito o nome. É mais ou menos segredo, mas ouço uns comentários.

Folha - Seu parceiro Marcos Valle disse à Folha que nos anos 70 você tinha fama de "maluco". Tinha?
Donato -
Não, não, não tenho essa fama de maluco, não. Isso aí é meio lenda. Faz muito tempo que sou considerado uma pessoa normal (ri). Quando era mais jovem e menos compromissado, entrava numa gravação e às vezes não terminava, ia embora no meio do caminho porque achava que a coisa não estava boa (ri). A gente era maluco beleza, o maluco que andava na frente do tempo, não o de botar nas grades. João Gilberto também é considerado maluco, só porque não gosta de dar entrevista, de sair de casa.

Folha - Como foi o episódio da bebedeira de Marcelo D2 na gravação do "Acústico MTV"?
Donato -
(Ri.) Valeu como expressão de alegria, de euforia, de as coisas não seguirem uma rotina muito rígida. Ali na TV a gente não sabia o tempo, o tamanho. Como gravamos três vezes a mesma música, saiu de três maneiras diferentes. A gente perdia um pouco a noção, não era matematicamente contadinho em minutos e segundos. Eu gosto assim.

Eu quero é falar com todo mundo, ir ao D2 de bonezinho cor-de-rosa. Ainda quero botar aquelas roupas que eles botam, até metade da canela. Tenho esse espírito jovem, essa alma que não envelhece. Meu espírito é juvenil, é quase infantil. Gosto de brincar, acho que não tem razão para a gente ser tão sério a respeito de uma coisa tão alegre como a vida. Viro assim uma espécie de irmão mais velho da turma. Está aí a saúde da sua arte. Você pode arrumar uma combinação comercialmente boa, mas não tão saudável, tão bem-intencionada espiritualmente. Se é voltado para o sucesso, o lucro e o dinheiro perde sinceridade, é como um casamento por interesse, "vou casar com fulana de tal porque é milionária".

Folha - Por que você tem estado mais próximo de artistas mais jovens que dos de sua geração?
Donato -
Houve um distanciamento, as coisas diminuíram. A aproximação com Gil e Caetano Veloso se deu numa época em que eu tocava com Gal Costa, a gente vivia nas casas uns dos outros. Agora é difícil encontrar fisicamente, a gente só se vê em show, prêmio, não se encontra sem ter um porquê. Fica um troço de antemão, uma coisa assim de horário de consultório.

Os mais jovens me procuram assim como se eu fosse fazer alguma coisa nova para eles, e eu sei que vou encontrar algo novo com eles. Os dois lados ganham. Meu jeito de acreditar na música não foi passando por um processo de envelhecimento ou de amadurecimento. É como uma mangueira que quando jovem dá umas manguinhas e quando velha continua dando aquelas mesmas manguinhas, com o mesmo sabor. Não sei que comparação é essa.

Folha - Os shows do fim de semana serão inventados na hora?
Donato -
Tem coisa que tem que fazer na hora de ensaiar. Não pode tentar enclausurar a música como se fosse um pássaro numa gaiola. Ela tem que ter as próprias asinhas e sair voando. É só não tentar controlar a música, fazer a música. Deixa que ela se faz sozinha, você apenas capta. Senão a tendência é estragar, é como se a gente metesse a mão na panela e desandasse a maionese.

Você espera que a coisa aconteça, pode vir do canto de um passarinho. Agora comprei um relógio de parede que cada hora é o canto de um pássaro diferente. O meio-dia é o corrupião, que faz assim [cantarola a melodia do "Hino Nacional Brasileiro"]. O autor do hino ouviu isso, não é possível, é muita coincidência. Uma vez ouvi um pássaro, era assim [cantarola "Garota de Ipanema"]. Saí perguntando aos amigos, aos porteiros que são nordestinos. Um porteiro amigo meu disse que é o sabiá quando tem filhote no ninho. Está explicado, quem sabe se Tom Jobim não ouviu e saiu em frente com o resto da coisa.

Folha - Existe alguma música sua copiada de passarinho?
Donato -
(Ri.) De passarinho, não, mas o assovio de "Lugar Comum" ouvi na beira do rio, de um canoeiro que passava ao cair da tarde. Fiquei assim um pouquinho emocionado. Ficou na minha cabeça o momento, a paz do cair da tarde. Nunca mais esqueci, tempos depois peguei o tema e pedi ao Gilberto Gil para colocar uma letra. Não contei nada da historinha, mas ele fez, "beira do mar, lugar comum", "onde o fim da tarde é lilás", quase contou a história da canoinha sem saber.

JOÃO DONATO 70 ANOS - Shows comemorativos amanhã (com Marcelo D2, Wanda Sá e Péricles Cavalcanti) e sábado (com Otto e Marcelinho da Lua), às 21h, e domingo (com DJ Patife e Léo Maia), às 18h
Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, tel. 0/ xx/11/5080-3000)
Quanto: R$ 30

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