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03/08/2004
-
15h09
IVAN DELMANTO
especial para a Folha Online
Na despedida de Brasiléia, no Acre, os integrantes da expedição do Teatro da Vertigem pelo interior do Brasil se dividem para conhecer o encanto da floresta e as histórias e lendas da cidade. Acompanhe:
Sexta-feira, 30/07/2004: Despedida de Brasiléia
Últimas horas em Brasiléia. O grupo se dividiu entre a cidade e as visitas a um seringal e a uma aldeia indígena na região de Assis Brasil.
As impressões dos que saíram da cidade foram de deslumbramento pela floresta. A pobreza das comunidades encontradas não encheu os olhos de sombra, deixando espaço para perceber o encanto.
Enquanto isso, eu percorria sem rumo a cidade, em busca de histórias. A oralidade, seguindo a tradição dos povos da floresta acreana, é definidora da cultura local. Em meu vagar pelas ruas encontrei muitos narradores, que me conduziram, no ritmo variado e colorido da fala, pelos rios de lendas e testemunhos de Brasiléia. Gostaria de poder, ao transcrever estas histórias, relatar a presença soberana do rio. Como diria uma das suas narradoras, "o rio é a vida de Brasiléia."
1
Cabrito gostava muito de mentir. Quando seu pai morreu em um atentado, Cabrito foi morar em um sofá abandonado nas margens do rio e gostava de contar para o barro que o pai fora chamado para curar Plácido de Castro, com água e magia.
2
Quando os bolivianos venceram sua única batalha contra o Exército brasileiro, os soldados aprisionados foram obrigados a lavar os uniformes ensangüentados dos vencedores com a lama do rio, para que o castigo não terminasse nunca. A instrução era para que não restasse uma única sujeira.
3
Dimas tinha um segredo: ensinava os bois a nadar para atravessarem o rio.
4
Lenda do nascimento do rio: a terra chorou porque o homem nasceu.
5
Para cada castanheira que morre, cercada pela imensidão e solidão da secura dos pastos, com os galhos secos levantados para o céu, pedindo vingança, a bruxa Ciciana recolhe, com uma garrafa plástica de refrigerante, um pouco da água do rio. Quando sua casa está cheia de garrafas, Ciciana rompe os plásticos e alaga os cômodos. Então um fazendeiro sempre morre.
Ivan Delmanto é pesquisador e coordenador teórico e de dramaturgismo do projeto Vertigem BR3, do Teatro da Vertigem. Escreve periodicamente um "Diário de Viagem" para a Folha Online, narrando a experiência do grupo pelo interior do Brasil
Especial
Acompanhe o diário de viagem do Teatro da Vertigem
Arquivo: saiba o que já foi publicado sobre o Teatro da Vertigem
Para os povos da floresta acreana, oralidade define cultura local
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especial para a Folha Online
Na despedida de Brasiléia, no Acre, os integrantes da expedição do Teatro da Vertigem pelo interior do Brasil se dividem para conhecer o encanto da floresta e as histórias e lendas da cidade. Acompanhe:
Sexta-feira, 30/07/2004: Despedida de Brasiléia
Últimas horas em Brasiléia. O grupo se dividiu entre a cidade e as visitas a um seringal e a uma aldeia indígena na região de Assis Brasil.
As impressões dos que saíram da cidade foram de deslumbramento pela floresta. A pobreza das comunidades encontradas não encheu os olhos de sombra, deixando espaço para perceber o encanto.
Enquanto isso, eu percorria sem rumo a cidade, em busca de histórias. A oralidade, seguindo a tradição dos povos da floresta acreana, é definidora da cultura local. Em meu vagar pelas ruas encontrei muitos narradores, que me conduziram, no ritmo variado e colorido da fala, pelos rios de lendas e testemunhos de Brasiléia. Gostaria de poder, ao transcrever estas histórias, relatar a presença soberana do rio. Como diria uma das suas narradoras, "o rio é a vida de Brasiléia."
1
Cabrito gostava muito de mentir. Quando seu pai morreu em um atentado, Cabrito foi morar em um sofá abandonado nas margens do rio e gostava de contar para o barro que o pai fora chamado para curar Plácido de Castro, com água e magia.
2
Quando os bolivianos venceram sua única batalha contra o Exército brasileiro, os soldados aprisionados foram obrigados a lavar os uniformes ensangüentados dos vencedores com a lama do rio, para que o castigo não terminasse nunca. A instrução era para que não restasse uma única sujeira.
3
Dimas tinha um segredo: ensinava os bois a nadar para atravessarem o rio.
4
Lenda do nascimento do rio: a terra chorou porque o homem nasceu.
5
Para cada castanheira que morre, cercada pela imensidão e solidão da secura dos pastos, com os galhos secos levantados para o céu, pedindo vingança, a bruxa Ciciana recolhe, com uma garrafa plástica de refrigerante, um pouco da água do rio. Quando sua casa está cheia de garrafas, Ciciana rompe os plásticos e alaga os cômodos. Então um fazendeiro sempre morre.
Ivan Delmanto é pesquisador e coordenador teórico e de dramaturgismo do projeto Vertigem BR3, do Teatro da Vertigem. Escreve periodicamente um "Diário de Viagem" para a Folha Online, narrando a experiência do grupo pelo interior do Brasil
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