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16/08/2004 - 09h31

"Regurgitofagia" floresce no deserto cultural do Rio

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GERALD THOMAS
Especial para a Folha de S.Paulo

Para os que odeiam o trocadilho, perdão. Mas o espetáculo espetacular solo de Michel Melamed "Regurgitofagia" é chocante mesmo --o soliloquista amarrado a fios elétricos leva choques cada vez que a platéia se manifesta, rindo, tossindo, aplaudindo etc.

Como o título sugere, Michel é filho adotivo da vanguarda, ou melhor, da ousadia dos que fazem das palavras algo elástico e vibrante até o momento em que as palavras pegam velocidade alucinante e o raciocínio (brilhante) eletriza o espectador, e a dinâmica e o humor do espetáculo vão do sublime ao crítico, em segundos.

É que nós, da platéia, nos damos conta de que nossa reação está realmente afetando o autor-ator com choques elétricos. Algo de David Blane talvez? Uma autoflagelação? Não, não creio. Um truque cênico muito bem bolado e muito mítico (no sentido grego da palavra, em se tratando de teatro).

Michel Melamed fala, zomba e faz a melhor poesia sobre as questões fundamentais. Quais são? Pensem um minuto. Pensem dois. Pois é. Justamente nelas. Michel toca em todos os pontos, dos mais triviais aos mais paradoxais ou indecifráveis, intocáveis, inimagináveis (como Schoenberg diria em sua ópera "Moisés e Arão"), desde o que "é estar aqui e já estar morto, porém ter tido o cuidado de deixar o espetáculo escrito antes... Ou vice-versa, ou seja, o que é estar aqui, ainda vivo".

Oswald de Andrade é revisitado (criticado, mas reverenciado também) e Waly Salomão recebe belíssima homenagem, mas não antes do truque cênico (o do cristal japonês que faz chorar) aparecer em cena, para dar o esfriamento necessário para que aquilo saia na medida exata de uma emoção controlada, e não patética.

Trata-se de um homem brilhante com um espetáculo igualmente genial. Principalmente numa cidade onde pouco acontece no rumo das ousadias teatrais. Fiquei comovido com "Regurgitofagia".

A direção é de Alessandra Colasanti --atriz engraçadíssima e cabeça ótima-- e Bruno Abujamra, e a contra-regragem (contra-regram?) ficou por conta de Vitor Paiva (outro poeta, autor fenomenal, dessa turma de jovens gênios que se aglomeraram e formaram esse oásis no Rio de Janeiro).

Espero que São Paulo tenha a chance de ver que o Rio não é um deserto cultural. Ou melhor, é sim. Mas existe aqui e ali uma árvore florida. E essa árvore chamada Michel Melamed é gigantesca, florida, digna de dar frutos em qualquer cidade do mundo.

Gerald Thomas é diretor de teatro

REGURGITOFAGIA - De: Michel Melamed. Direção: Alessandra Colasanti. Com Michel Melamed. Onde: teatro Candido Mendes (r. Joana Angélica, 63, Ipanema, tel. 0/xx/21/ 2267-7295, Rio de Janeiro). Quando: de amanhã a 6/10, terças e quartas, 21h. Quanto: R$ 15.

Especial
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