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27/08/2004
-
05h05
PEDRO BUTCHER
crítico da Folha
Concebido como uma parábola religiosa em torno dos preceitos do budismo, "Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera" observa a vida como um ciclo em que cada estação corresponde a um estágio do aprendizado humano. Essa visão está claramente orientada pelo conceito do karma e a filosofia da "causa e efeito", e é apresentada de forma didática, com a relação entre um monge e seu aprendiz.
São muito específicos, portanto, os objetivos do cineasta Kim Ki-duk neste seu novo filme. "Primavera..." só pode ser entendido com plenitude sob a perspectiva religiosa: cada acontecimento encenado é a representação de alguma idéia budista (ou de alguma idéia de uma entre as várias linhas do budismo), e para quem não as conhece de antemão tudo pode parecer estranho e artificial.
Não se trata, no entanto, de um filme de catequese, mas sim da tentativa de transformar em narrativa uma visão de mundo de contornos espirituais. Toda a ação se passa em um cenário único: um pequeno templo isolado, erguido no meio de um lago. Lá habita o monge que vai criar um bebê, seu aprendiz. A educação isolada, em meio à natureza, sob o aprendizado ético rigoroso do monge, não será suficiente para poupar o jovem do horror.
Numa visão no mínimo extrema, o aprendiz é levado à perdição logo pela primeira mulher que conhece. Quando dá sinais de desejo sexual, o jovem é reprimido pelo monge: "A luxúria leva ao sentimento de posse, e o sentimento de posse leva à morte". Surdo aos conselhos do sábio e levado por seus impulsos, o aprendiz cai em desgraça. A frase do mestre é praticamente uma antevisão, e o que ele diz acontece de fato. É difícil fazer um discernimento claro, nesse contexto, entre a idéia de karma e a idéia de destino, e entre a lei de "causa e efeito" e a famosa culpa judaico-cristã.
Toda parábola, e principalmente a parábola religiosa, trabalha com simplificações extremas; no caso de "Primavera...", não são bem resolvidas por Kim Ki-duk --um dos mais prolíficos cineastas coreanos. As imagens deslumbrantes do filme podem ser contempladas com prazer, mas projetam-se apenas como cartões-postais vazios, pretensamente espirituais, e que no fim de tudo deixam a sensação de carregar uma carga moralista profunda.
Avaliação:
Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera (Bom Yeorum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom)
Direção: Kim Ki-duk
Produção: Coréia do Sul/Alemanha, 2003
Com: Oh Yeong-su, Kim Ki-duk
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Frei Caneca Unibanco Arteplex e Market Place Playarte
Especial
Arquivo: veja o que já foi publicado sobre Kim Ki-duk
Filme de Kim Ki-duk é como um cartão-postal vazio
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crítico da Folha
Concebido como uma parábola religiosa em torno dos preceitos do budismo, "Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera" observa a vida como um ciclo em que cada estação corresponde a um estágio do aprendizado humano. Essa visão está claramente orientada pelo conceito do karma e a filosofia da "causa e efeito", e é apresentada de forma didática, com a relação entre um monge e seu aprendiz.
São muito específicos, portanto, os objetivos do cineasta Kim Ki-duk neste seu novo filme. "Primavera..." só pode ser entendido com plenitude sob a perspectiva religiosa: cada acontecimento encenado é a representação de alguma idéia budista (ou de alguma idéia de uma entre as várias linhas do budismo), e para quem não as conhece de antemão tudo pode parecer estranho e artificial.
Não se trata, no entanto, de um filme de catequese, mas sim da tentativa de transformar em narrativa uma visão de mundo de contornos espirituais. Toda a ação se passa em um cenário único: um pequeno templo isolado, erguido no meio de um lago. Lá habita o monge que vai criar um bebê, seu aprendiz. A educação isolada, em meio à natureza, sob o aprendizado ético rigoroso do monge, não será suficiente para poupar o jovem do horror.
Numa visão no mínimo extrema, o aprendiz é levado à perdição logo pela primeira mulher que conhece. Quando dá sinais de desejo sexual, o jovem é reprimido pelo monge: "A luxúria leva ao sentimento de posse, e o sentimento de posse leva à morte". Surdo aos conselhos do sábio e levado por seus impulsos, o aprendiz cai em desgraça. A frase do mestre é praticamente uma antevisão, e o que ele diz acontece de fato. É difícil fazer um discernimento claro, nesse contexto, entre a idéia de karma e a idéia de destino, e entre a lei de "causa e efeito" e a famosa culpa judaico-cristã.
Toda parábola, e principalmente a parábola religiosa, trabalha com simplificações extremas; no caso de "Primavera...", não são bem resolvidas por Kim Ki-duk --um dos mais prolíficos cineastas coreanos. As imagens deslumbrantes do filme podem ser contempladas com prazer, mas projetam-se apenas como cartões-postais vazios, pretensamente espirituais, e que no fim de tudo deixam a sensação de carregar uma carga moralista profunda.
Avaliação:
Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera (Bom Yeorum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom)
Direção: Kim Ki-duk
Produção: Coréia do Sul/Alemanha, 2003
Com: Oh Yeong-su, Kim Ki-duk
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Frei Caneca Unibanco Arteplex e Market Place Playarte
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